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Casos de abuso em escolas religiosas na Bolívia geram ondas de denúncia

Cerca de 200 pessoas disseram às autoridades que foram vítimas de crimes sexuais após escândalo vir à tona

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La Paz | Reuters

Autoridades da Bolívia anunciaram nesta segunda-feira (22) a abertura de uma investigação para determinar se funcionários da Igreja Católica devem ser responsabilizados por envolvimento em casos de abuso sexual infantil.

A força-tarefa foi organizada após vir à tona o caso do padre espanhol Alfonso Pedrajas, conhecido como padre Pica. Ele coordenou escolas jesuítas em comunidades bolivianas marginalizadas e admitiu em um diário ter abusado sexualmente dezenas de menores de idade na década de 1970. O líder religioso morreu de câncer aos 62 anos em 2009, e o escândalo foi revelado pelo jornal El País no mês passado.

Escola Juan XXIII, em Cochabamba, na Bolívia, onde o padre Alfonso Pedrajas teria cometido crimes sexuais
Escola Juan XXIII, em Cochabamba, na Bolívia, onde o padre Alfonso Pedrajas teria cometido crimes sexuais - Fernando Cartagena - 19.mai.23/AFP

O documento de aproximadamente 300 páginas foi encontrado por um dos sobrinhos de Pedrajas. No texto, o padre manifesta arrependimento e diz que conversou com os superiores na Bolívia e na Espanha sobre os crimes, mas que eles nada fizeram a respeito.

Desde que trechos do diário foram publicados, cerca de 200 pessoas se apresentaram às autoridades para relatar abusos sexuais que teriam sido cometidos por Pedrajas e outros padres.

Os crimes teriam ocorrido em várias de escolas religiosas na Bolívia, incluindo instituições dominicanas e franciscanas, além de jesuítas. Segundo a Procuradoria-Geral boliviana, foram recebidas denúncias nas cidades de La Paz, Cochabamba, Tarija e Santa Cruz.

Protestos a favor das vítimas reuniram dezenas de pessoas em frente a escritórios jesuítas na Bolívia. Em nota, a Procuradoria-Geral disse que investiga o caso para verificar se algum funcionário ligado à Igreja Católica deve ser responsabilizado. Policiais realizaram operações de busca e apreensão em escolas e edifícios da ordem religiosa, e dois padres foram detidos —as acusações contra eles não foram reveladas.

"Peço apenas justiça, para que nunca se repitam atos agressivos e abomináveis contra os indefesos", disse Carlos, 52. Ele afirmou à agência Reuters ter sido abusado por Pedrajas quando era aluno da escola Juan XXIII, na cidade de Cochabamba, região central da Bolívia.

"Estou disposto a arriscar tudo. Algumas pessoas perguntam: 'por que agora?' Eu digo que as perguntas machucam, que não tem sentido porque elas não sabem o calvário que vivemos", acrescentou Carlos.

Em resposta ao caso, o presidente boliviano, o esquerdista Luis Arce, condenou o que chamou de "casos repugnantes de pedofilia" e indicou na semana passada que o país passará a exigir mais documentos e informações para enviados religiosos do Vaticano.

Ricardo Centellas, vice-presidente da Conferência Episcopal boliviana, disse que a igreja está disposta a cooperar. "Vamos aguardar os resultados para saber quais são os crimes e trabalhar para que os responsáveis recebam sentenças correspondentes".

O escândalo representa mais um golpe contra a Igreja Católica, que lida com denúncias relacionadas a crimes sexuais em vários países. Desde que foi eleito, em 2013, o papa Francisco vem tomando medidas para tentar erradicar os crimes cometidos por clérigos.

Em 2019, o pontífice emitiu um decreto que tornou obrigatório que bispos e padres informem suspeitas de abusos sexuais e permitiu a qualquer pessoa submeter denúncias ao Vaticano. Caso os bispos não informem os casos de abuso, podem ser considerados corresponsáveis pelos crimes que ocultarem.

No ano passado, o papa Francisco disse que o escândalo dos abusos sexuais na igreja era uma catástrofe mundial. À época, o Vaticano divulgou a revisão mais abrangente das leis da instituição nos últimos 40 anos, endurecendo as regras contra violência sexual.

Segundo o novo regramento, o abuso de menores deve ser punido com a suspensão ou a destituição do cargo clerical, já que representa uma ofensa ao mandamento que prega castidade nas palavras e nas obras. A mesma punição se aplica ao clérigo que aliciar menores para induzi-los "a se exporem pornograficamente" e ao religioso que "adquirir, reter, exibir ou distribuir" imagens pornográficas.

Críticos, porém, afirmam que Francisco ainda não fez o suficiente, acusando-o de responder lentamente a escândalos, não ter empatia com as vítimas e acreditar cegamente na palavra de seus colegas.

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