Jovens na China recorrem a templos para aliviar tensão com falta de empregos

Em mercado de trabalho sob pressão, recém-formados engrossam turismo a locais sagrados no país asiático

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Li Hang Sun Muzi
Caixin

No templo Yonghe, em Pequim, local sagrado para fazer preces a Buda, jovens são vistos com frequência queimando incensos e fazendo fila para prestar suas homenagens. Eles se ajoelham e rezam, confiando ao líder religioso seus desejos mais profundos, e então colocam um bastão aceso dentro do incensário.

Uma universitária recém-formada da região da Mongólia Interior, no noroeste da China, repetiu o ritual no templo diversas vezes no último 25 de abril, pedindo uma boa oportunidade de trabalho e uma carreira profissional bem-sucedida. Xiaozhang, que preferiu usar um nome fictício para falar com a Caixin, veio à capital, a centenas de quilômetros de distância de sua cidade, na esperança de encontrar emprego.

Mas não conseguiu, apesar de todos os esforços, razão pela qual procurou Buda em busca de respostas.

Pessoas oram no templo Yonghe, em Pequim - Noel Celis - 19.ju.22/AFP

"Hoje em dia, os jovens enfrentam pressões grandes nos estudos, no trabalho e na vida, e os três anos da epidemia exacerbaram essa tensão", disse à China Travel News o professor Zhang Zuqun, da Escola de Design e Arte do Instituto de Tecnologia de Pequim. "Eles precisam de uma válvula de escape. Os templos se tornaram uma opção importante para buscar apoio espiritual e alívio do estresse."

De acordo com dados da agência de viagens online Trip.com, nos primeiros 54 dias deste ano as reservas mais que quadruplicaram em relação ao mesmo período de 2022. Mais da metade das reservas para fevereiro foi feita por pessoas nascidas nas décadas de 1990 e 2000.

Na plataforma de lifestyle Xiaohongshu, na qual os millennials são mais de 70% dos usuários, havia, até terça (9), mais de 1,2 milhão de posts relacionados a "templo". Muitos compartilhavam suas experiências nesses espaços e faziam recomendações sobre como fazer preces a Buda e comprar artigos culturais. A tendência crescente do turismo nos templos está levando a uma procura cada vez maior pelos artigos vendidos nos locais de culto. No Yonghe, alguns dos produtos mais vendidos são pulseiras de contas.

O acessório, que custa a partir de 240 yuans (R$ 172) cada um, representa saúde, segurança, riqueza e sucesso profissional. Consta que são feitas de cinza do incenso do templo e acredita-se que atraem bênçãos de Buda e fortuna para quem as usa. Sua popularidade tem atraído comerciantes que compram pulseiras para clientes de fora da cidade.

Xiaoliu, que também usou um nome fictício para falar com a Caixin, e seus pais viajaram da Mongólia Interior para Pequim e acrescentaram o templo Yonghe à sua lista de destinos obrigatórios. A jovem se formou na faculdade no ano passado, mas ainda não encontrou o trabalho de seus sonhos. Ela disse à Caixin que pretendia comprar uma pulseira abençoada, mas não conseguiu devido à fila.

Para Guo, um jovem de 32 anos que frequenta regularmente o templo, participar de atividades budistas como trabalho voluntário e aulas de meditação o ajudam a controlar melhor os problemas emocionais. "Essas atividades chegam a afetar o modo como encaro o mundo", disse ele.

Xiaozhang é uma entre milhões de universitários recém-formados que devem enfrentar uma das temporadas de busca de emprego mais difíceis até hoje. A expectativa é que 11,58 milhões de estudantes na China se formem em instituições de ensino superior neste verão –um número recorde, 7,6% maior que a estimativa de 2022, o que cria grande pressão sobre o mercado de trabalho. "Tenho uma entrevista de emprego amanhã e muitas coisas a fazer", disse Xiaozhang. "Espero que minha vida melhore."

Em seu blog na Caixin, o estudioso financeiro Tang Ya publicou no dia 21 de março um texto intitulado "Até Buda precisa fazer hora extra?!", no qual afirma que, quando o destino das pessoas está fora de suas mãos, elas tendem a depositar suas esperanças em uma força superior. "No momento em que a geração jovem mais precisa avançar, ela se vê diante de um caminho estreito ao sucesso e de mais incerteza. Quando não há mais nada em que acreditar, a única opção é acreditar no poder da fé", disse o autor.

Tradução de Clara Allain

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