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Candidato assassinado no Equador disse à Folha que população estava cansada da corrupção

Fernando Villavicencio foi um dos jornalistas que mais sofreram com pressão do ex-presidente Rafael Correa

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São Paulo

Fernando Villavicencio, candidato à Presidência do Equador assassinado a poucos dias da eleição, disse à Folha em 2017 que a população equatoriana estava cansada do autoritarismo e da corrupção.

À época, ele, um dos repórteres que mais sofreram com a pressão do então presidente Rafael Correa contra veículos opositores ao governo, era considerado foragido da Justiça e estava escondido.

Fernando Villavicencio, candidato à Presidência do Equador, durante evento de campanha em Quito, nesta quarta (9)
Fernando Villavicencio, candidato à Presidência do Equador, durante evento de campanha em Quito, nesta quarta (9) - Karen Toro/Reuters

Especializado em investigações sobre corrupção vinculada à exploração de petróleo e mineração, Villavicencio viu sua casa ser invadida, em 2013, por policiais e funcionários da Presidência. O motivo era o fato de ele ter trazido à tona evidências do envolvimento ilícito de empresários aliados ao governo na intermediação da venda de petróleo equatoriano à China.

Depois de levarem seu computador, Villavicencio teve prisão preventiva decretada sob a acusação de hackear informações confidenciais do Estado e foi condenado a pagar multa de cerca de US$ 50 mil. Declarado insolvente, ele teve embargado os seus bens e decidiu se exilar dentro do próprio país.

O jornalista, porém, continuou trabalhando e à época fazia parte da campanha de apoio ao então oposicionista Guillermo Lasso, hoje presidente do Equador. Villavicencio foi morto a tiros nesta quarta (9), após um evento de campanha em Quito. A autoria do assassinato foi reivindicada pela facção Los Lobos, uma das maiores organizações criminosas do Equador e envolvida com tráfico internacional de drogas.

A entrevista de Villavicencio à Folha, durante a disputa à Presidência do Equador de 2017, foi publicada antes do segundo turno entre Lasso e o candidato governista Lenín Moreno. Relembre a íntegra a seguir.

Eleição presidencial

O governo tinha assegurado que ganharia num primeiro turno. Para Correa, era impensável que houvesse um segundo turno. Foi uma de suas maiores derrotas e o começo do fim desse regime. O "correísmo" deve tentar recuperar algo desse 60% da população que decidiu dizer "não" a ele. E isso vai ser muito difícil.

Candidatura de Lasso

O chamado de atenção do dia 19 de fevereiro [data do primeiro turno] não foi só para Correa, mas também para Lasso. O que os equatorianos disseram por meio do voto é que estão cansados de autoritarismo, de um Poder Executivo centralizador e da corrupção. Mas isso vale também para a oposição.

Creio que Lasso agora terá de se abrir mais em termos programáticos, para incluir em sua base de eleitores aqueles que estão insatisfeitos com o "correísmo" pelo lado da esquerda e do centro. Precisa, também, amenizar o estigma do candidato banqueiro.

O melhor seria que propusesse, logo de cara, um governo de coalizão e que se mostrasse aberto a incluir em seu projeto as exigências dos outros atores políticos. Lasso se comprometeu a uma ideia que apresentei de montar uma espécie de comissão da verdade, para apurar o que houve de corrupção nesses dez anos, isso inclui a questão da Odebrecht e muitas outras denúncias.

Há um setor que precisa ser incluído em sua proposta, porque foi abandonado pelo "correísmo", que são os indígenas. Que lhes seja permitido opinar sobre as decisões já tomadas de concessões de suas terras à exploração mineradora. Eles precisam ser consultados, porque perderam voz política nos últimos anos.

Conservadorismo

Lasso é um homem religioso e conservador e pessoalmente é contra o aborto. Mas ele vem mudando seu modo de ver essas questões do ponto de vista político.

Pelas suas últimas declarações, vejo que vem tentando deixar claro que suas crenças pessoais não vão interferir nas tomadas de decisão nesse sentido, se elas forem um desejo da sociedade.

Possível governo Lasso

Creio que a Assembleia será um dos problemas em que Lasso [se eleito] terá de colocar foco. Num primeiro momento, é necessário restabelecer a independência dos Poderes e das instituições, algo que se perdeu com Correa, em que tudo se concentrou no Executivo. Quanto ao Parlamento, se ele vencer, contará com a legitimidade popular para fazer alianças e negociar, e isso faz parte do jogo democrático.

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