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General assume Gabão após golpe e fala em 'eleições livres' sem fixar data

Brice Nguema adota tom conciliatório em cerimônia de posse; líder destituído continua em prisão domiciliar

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São Paulo

Um general que comandou o golpe de Estado no Gabão tomou posse nesta segunda (4) como líder do país. Em recado à comunidade internacional, o novo dirigente, Brice Oligui Nguema, que se autodenomina presidente interino, prometeu devolver o poder aos civis em "eleições livres e transparentes", mas não estabeleceu uma data.

Nguema esteve à frente do movimento que derrubou na semana passada Ali Bongo, então líder do Gabão. O golpe ocorreu horas após a divulgação dos resultados das eleições gerais que declararam Bongo vencedor —ele deveria assumir um terceiro mandato, mas foi destituído e colocado em prisão domiciliar.

O general Brice Oligui Nguema toma posse como líder interino do Gabão
O general Brice Oligui Nguema toma posse como líder interino do Gabão - Gerauds Wilfried Obangome/Reuters

Os militares que tomaram o poder alegam, sem apresentar provas, que o pleito foi fraudado. Em discurso na TV, Nguema disse nesta segunda-feira que o golpe foi um movimento de "libertação nacional" e uma "manifestação da vontade de Deus". "Quando o povo é esmagado pelos seus líderes, o Exército lhes devolve a dignidade", disse o líder golpista, interrompido várias vezes por apoiadores que o aplaudiam.

O general propôs então realizar um referendo sobre uma reforma constitucional. Sem entrar em detalhes, defendeu novos códigos eleitorais e penais. Também prometeu que os presos políticos seriam libertados, e os exilados, repatriados.

Apesar do tom conciliatório do novo líder, Bongo continua preso. Ele foi eleito pela primeira vez em 2009 e deu continuidade à administração de seu pai, que se manteve no poder por 42 anos no país. Após o golpe, Bongo rejeitou as acusações de irregularidades na eleição e pediu que a população "faça barulho".

Numa tentativa de tranquilizar credores e investidores, Nguema disse que sua administração vai adotar medidas para garantir o "respeito pelos compromissos" nacionais. Ele voltou a pedir tranquilidade à população, além da continuidade do funcionamento dos serviços públicos.

O general disse ainda que sua administração organizaria eleições livres e justas, embora sem estabelecer uma data para a votação. "Após a transição, pretendemos devolver o poder aos civis, organizando novas eleições livres, transparentes, credíveis e pacíficas", disse Nguema.

Críticos dos militares, porém, manifestam ceticismo. O golpe no Gabão foi o oitavo na África Ocidental e na Central em apenas três anos, em ações que evidenciam a derrocada democrática na região.

Em represália, a União Africana suspendeu o país, cortando-o das atividades e instituições do bloco até que a ordem constitucional seja restabelecida. Líderes da Comunidade Econômica dos Estados da África Central (Ceeac) também se reuniram nesta segunda-feira e decidiram pela suspensão gabonesa.

"Todas as ameaças à paz, à segurança e à estabilidade de qualquer membro da Ceeac têm repercussões para todos os Estados-membros do grupo", escreveu Teodoro Obiang Nguema, o líder da Guiné Equatorial, país que sediou o encontro, em comunicado.

Obiang agora tece os comentários críticos à escalada autoritária no Gabão, mas é ele próprio líder de um regime autoritário e caminha para completar 50 anos no poder.

O Gabão é um país de peso para a Ceeac, e sua saída —ainda que, possivelmente, temporária— mexe na estrutura da organização. A sede do grupo estava estabelecida em Libreville, capital gabonesa, desde 1983, ano em que o grupo foi fundado. Agora, a sede está sendo transferida para Malabo, capital da Guiné Equatorial, cujo regime parece se aproveitar da instabilidade política no Gabão para ganhar envergadura política entre os parceiros da África Central.

O principal grupo opositor na política gabonesa, o Alternance 2023 (alternância 2023), que reivindica vitória nas eleições de 26 de agosto, pediu à comunidade internacional que pressione a junta militar a devolver o controle do país aos civis. Membros da aliança tiveram um encontro com Obiang também nesta segunda-feira, de acordo com relatos da agência de notícias Reuters.

O general Nguema disse ter ficado surpreso com as críticas feitas pela comunidade internacional. Segundo ele, os militares agiram para evitar o "derramamento de sangue" no Gabão, afundado numa "grave crise institucional, política, econômica e social".

O relatório mais recente do instituto sueco V-Dem, referência na análise de regimes políticos, descreve o país como uma autocracia eleitoral, com eleições multipartidárias, mas sem outros pilares democráticos.

A tomada de poder encerrou quase seis décadas de controle da família de Bongo, que liderou o país desde 1967. Opositores acusam o clã de corrupção e de cercear a riqueza vinda do setor do petróleo e gás.

Além do cancelamento do pleito, os militares anunciaram o fechamento das fronteiras do Gabão e a dissolução de instituições estatais, incluindo o Senado e a Assembleia Nacional. O grupo diz representar todas as forças de segurança e de Defesa do país africano.

Ainda nesta segunda-feira, os militares anunciaram o restabelecimento do acesso à internet e das transmissões de três grandes meios de comunicação que haviam sido suspensas. O toque de recolher noturno e o fechamento das fronteiras, porém, permanecem.

Com AFP e Reuters

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