Descrição de chapéu Escravidão hoje

ONU denuncia formas de escravidão moderna em prisões dos EUA

Relatório de comitê de especialistas aponta racismo estrutural e violações sistemáticas de direitos humanos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Relatório de um grupo de especialistas da ONU publicado nesta quinta-feira (28) denuncia a existência de condições análogas à escravidão e de abusos sistemáticos de direitos humanos contra pessoas negras em prisões dos Estados Unidos.

O documento de 33 páginas compila, entre outros, casos de mulheres negras encarceradas que relatam terem permanecido algemadas mesmo quando estavam em trabalho de parto e de homens negros submetidos a trabalhos considerados análogos à escravidão.

Pessoas visitam mural na praça George Floyd, em Minneapolis, no estado americano de Minnesota
Pessoas visitam mural na praça George Floyd, em Minneapolis, no estado americano de Minnesota - Nicole Neri - 3.jun.21/Reuters

O material é resultado de uma visita feita ao país no início deste ano por representantes do mecanismo das Nações Unidas para avançar na justiça racial nas prisões. Ao todo, mais de 133 pessoas foram ouvidas e cinco centros de detenção americanos foram visitados pelo grupo.

Os especialistas fizeram uma série de recomendações para Washington e instaram o governo americano a colocá-las em prática para combater o que descrevem como racismo sistêmico nas prisões e uma "afronta à dignidade humana" nesses espaços.

O documento menciona relatos de mulheres que afirmam terem perdido seus bebês e atribuem a morte dos recém-nascidos às condições às quais foram submetidas ao darem à luz acorrentadas.

Outros trechos, esses sobre uma prisão em Louisiana, descrevem que milhares de detentos, em sua maioria negros, eram forçados a trabalhar em campos de plantação, alguns de colheita de algodão, "sob a vigilância de homens brancos montados a cavalo". "Em condições muito semelhantes às de 150 anos atrás", diz o relatório da ONU, em referência à época anterior à abolição da escravidão nos EUA.

Entre os termos usados para descrever o cenário encontrado, os especialistas falam em "formas contemporâneas de escravidão".

Em outro dos relatos ali compilados, um homem negro afirma que foi mantido em uma solitária durante 11 anos ininterruptos. Os especialistas afirmam que o uso de confinamento solitário parece ser aplicado de maneira desproporcional aos detentos negros.

"Nossas conclusões apontam para a necessidade de uma reforma abrangente", disse um dos especialistas, Juan Mendez, professor na American University Washington College of Law e ex-relator sobre tortura da ONU. O grupo pede, entre outras coisas, que os EUA criem uma nova comissão voltada para reparar abusos cometidos contra detentos afrodescendentes.

O material também reúne dados sobre encarceramento no país. Entre outras coisas, afirma que pessoas negras têm três vezes mais probabilidade de serem mortas pela polícia nos EUA do que pessoas brancas e mais de quatro vezes mais chance de serem presas.

Ainda de acordo com o material, a cada mil casos de assassinatos cometidos por policiais no país a cada ano, apenas 1% resulta na acusação formal dos agentes envolvidos. "Se a regulamentação do uso da força não for reformada de acordo com padrões internacionais, esses assassinatos seguirão ocorrendo nos EUA", diz o texto.

Os especialistas também criticam o que chamam de "teoria da maçã podre" —segundo a qual o comportamento dos agentes responsáveis por esses atos seria uma exceção. "Há fortes evidências que sugerem que o comportamento abusivo de alguns agentes faz parte de um padrão mais amplo", disse o argentino Juan Mendez.

"Instituições de aplicação da lei e de justiça criminal nos EUA compartilham e reproduzem valores, atitudes e estereótipos da sociedade e das instituições americanas."

A investigação que deu origem ao relatório divulgado nesta quinta-feira foi autorizada pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU —do qual os EUA fazem parte com direito de voto— em 2021, após o assassinato de George Floyd, ex-segurança negro morto em 2020 após um policial prensar o pescoço dele com seu joelho por mais de nove minutos.

À agência de notícias Reuters o Federal Bureau of Prisons, a agência federal americana subordinada ao Departamento de Justiça e responsável pelo cuidado dos detentos no país, disse apenas estar "comprometido em garantir a segurança dos indivíduos encarcerados".

Com Reuters

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.