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Extrema direita alimenta ódio aos cristãos com ataques recorrentes em Jerusalém

Israel promete 'tolerância zero' após vídeo mostrar judeus cuspindo em peregrinos

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RFI

Cuspes, insultos, profanação de igrejas e cemitérios. O Ministério das Relações Exteriores de Israel emitiu uma declaração na terça (3) denunciando esses atos como "abomináveis". Desde que a extrema direita chegou ao poder no país, no final do ano passado, os ataques contra cristãos têm sido recorrentes em Jerusalém.

Israel condena cada novo ataque contra cristãos, mas as autoridades raramente reprimem os agressores, segundo o correspondente da agência RFI em Jerusalém, Sami Boukhelifa.

Fiéis, durante o feriado judaico de Sukkot, participam da bênção sacerdotal no Muro das Lamentações, o local de oração mais sagrado do judaísmo, na Cidade Velha de Jerusalém
Fiéis, durante o feriado judaico de Sukkot, participam da bênção sacerdotal no Muro das Lamentações, o local de oração mais sagrado do judaísmo, na Cidade Velha de Jerusalém - Ilan Rosenberg - 2.out.23/Reuters

No entanto, a violência vem sendo pontualmente documentada. Vídeos mostram regularmente judeus ultrarreligiosos atacando membros da comunidade cristã. Entrevistado no início deste ano, Miran Grégorian, um comerciante cristão na Cidade Velha de Jerusalém, filmou um grupo de jovens colonos israelenses vandalizando seu restaurante. "A polícia nunca deu seguimento ao caso", disse ele.

Nesta semana, Israel celebra o festival judaico de Sukkot. A cidade, com vários milhares de anos e lar dos locais sagrados das três grandes religiões monoteístas das Escrituras Sagradas (judeus, cristãos e muçulmanos), está atraindo multidões.

Nas ruas estreitas da cidadela sagrada, peregrinos de todas as três religiões se encontram. A situação é extremamente tensa. A forte presença policial não impede que judeus extremistas cuspam nos cristãos, que eles consideram idólatras.

Netanyahu promete 'tolerância zero'

Em 21 de setembro, o Patriarca Latino de Jerusalém, Pierbattista Pizzaballa, observou que o fenômeno dos ataques contra cristãos na Cidade Velha "não é novo", mas que houve um aumento significativo em seu número em um período recente.

Após a transmissão nas redes sociais de um novo vídeo que mostrava fiéis judeus cuspindo em peregrinos cristãos em Jerusalém, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, divulgou uma declaração na terça-feira (3) prometendo "tolerância zero" com "ataques a fiéis". "Condeno firmemente qualquer ataque a crentes e tomaremos medidas urgentes contra esse tipo de ação."

O texto não se refere a nenhum evento específico, mas o vídeo do dia anterior —cuja autenticidade não foi comprovada— mostra um grupo de judeus ultraortodoxos, incluindo meninos, comemorando o festival de Sukkot e cuspindo no chão enquanto peregrinos carregando cruzes passam pela Via Dolorosa, a rota tradicional da Via Sacra que relembra a Paixão de Cristo na Cidade Velha de Jerusalém.

Extrema direita alimenta essa violência

Desde o início do ano, os cristãos de Jerusalém têm enfrentado inúmeros ataques de colonos israelenses e judeus religiosos. De acordo com a comunidade cristã, o discurso abertamente odioso e racista da extrema direita israelense atualmente no poder está alimentando essa violência.

"Chame a polícia!", grita o zelador da igreja do Flagelo de Cristo de Jerusalém, sem fôlego. O vídeo viralizou nas redes sociais de Israel, em março desse ano. Nele, pode-se ver Majed El Resheq derrubando um homem no chão e lutando para dominá-lo. O homem, um judeu fanático, destruiu uma estátua de Jesus e repetiu várias vezes: "Êxodo, capítulo 20". A passagem da Bíblia diz que não se deve cultivar nenhum ídolo.

Alguns dias após o ataque, Majed ainda está em choque. "Foi em 2 de fevereiro. Esse judeu extremista entrou na igreja com um grupo de turistas. Ele se sentou aqui, neste banco. Quando o grupo saiu, ele ficou. Abriu sua bolsa e pegou um porrete. Ele subiu nesta plataforma e começou a bater na estátua de Jesus. Tentei impedi-lo, mas ele tentou me bater. Antes que eu pudesse impedi-lo, ele conseguiu derrubar a estátua."

'Saia daqui, este não é o seu país'

Quebrada em duas partes, a estátua ainda está em exibição na Igreja do Flagelo, ponto de partida da Via Sacra, que os peregrinos seguem até hoje. A Via Dolorosa atravessa a Cidade Velha de Jerusalém de leste a oeste até o Santo Sepulcro, localizado no bairro cristão. É também onde fica o restaurante de Miran Grégorian, um palestino cristão, cujo restaurante foi atacado por cerca de 30 jovens judeus no final de janeiro.

"Foi em uma noite no final do serviço, por volta das 23h, pouco antes do horário de fechamento", diz Grégorian. "Eles se postaram na entrada do restaurante. Primeiro nos insultaram, depois cuspiram em nós. Gritaram 'morte aos árabes, morte aos cristãos, saiam daqui, este não é o país de vocês, voltem para o Vaticano', como se os cristãos viessem do Vaticano. Veja como eles são estúpidos. Na realidade, eles são apenas um bando de extremistas ignorantes, galvanizados pela retórica [odiosa] de seus líderes. E eles agem sem nem sequer pensar."

Ataques que se tornaram 'sistemáticos'

Grégorian concorda que há uma ligação entre a extrema direita no poder e o aumento desses atos anticristãos.

"Sinceramente, não quero politizar essa questão. Mas nosso sentimento é que, desde a chegada desse governo de extrema direita, esses ataques estão se tornando sistemáticos. Eu sempre vivi aqui e sempre houve ataques a cristãos. Mas eles eram espaçados ao longo do tempo. Agora houve quatro ou cinco ataques desde o início do ano. Há uma correlação. Não estou dizendo que os líderes deles ordenam diretamente que nos ataquem. Mas quando você tem um ministro que fala agressivamente sobre qualquer coisa que não seja judia, obviamente você acaba tendo grupos extremistas que transformam suas palavras em ação", afirma.

Cadeiras e mesas foram quebradas. A polícia israelense interveio, mas Grégorian não sabe se seus agressores serão condenados. "Nove em cada dez vezes, nem sequer informamos a polícia, porque esses casos geralmente são arquivados", afirma o proprietário do restaurante.

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