Militares do Equador fazem midiática demonstração de força à população

Moradores aplaudem soldados, que examinam tatuagens e celulares de suspeitos em meio a onda de violência no país

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Guayaquil (Equador)

Cerca de 20 militares fardados descem de um ônibus, conversam entre si e se dirigem ao pequeno grupo de repórteres que se reúne numa esquina, alguns vestidos com coletes à prova de bala: "Vamos dar a volta neste quarteirão buscando atitudes suspeitas", anuncia um oficial.

A essa altura, os vizinhos no entorno já se debruçam sobre suas janelas para ver o rebuliço na rua que dez minutos antes estava tranquila na manhã desta sexta-feira (12), num bairro de classe baixa em Guayaquil, maior cidade do Equador cuja área metropolitana concentra um terço das mortes violentas do país.

Militar no Equador durante operações do Exército em meio a crise de segurança, em Guayaquil
Militares recebem doações de moradores diante da imprensa durante operação em Guayaquil, no Equador - Júlia Barbon - 12.jan.2014/Folhapress

"Vou pedir um favor. Nesta área, provavelmente encontremos pessoas que têm problemas com drogas, e talvez alguns sejam um pouco malcriados. Se isso acontecer, teremos que usar a força mais progressivamente, e aí vamos pedir que não gravem. Porque vocês sabem que os direitos humanos vão dizer que nós somos os maus", adverte o porta-voz das Forças Armadas, o tenente Marcelo Gutierrez.

Não é possível ver seu rosto —ele e os demais militares têm apenas os olhos de fora, por segurança.

O Equador está em situação de "conflito armado interno" desde terça (9), quando uma onda de ataques a bombas e sequestros de policiais e agentes penitenciários coordenados por organizações criminosas espalhou pânico pelo país. O caos levou o presidente Daniel Noboa a dar mais poder aos militares para combatê-las.

Os fardados e blindados não têm sido vistos pelas ruas da cidade como no dia dos atentados, mas têm feito operações pontuais nas estradas e em "zonas quentes", consideradas mais perigosas. Ao menos 859 pessoas foram presas, 94 delas sob acusação de terrorismo, e sete foram mortas, incluindo dois policiais, em quase 7.814 operações pelo país.

Nesta sexta (12), diante de pedidos de diversos meios de comunicação, as forças de segurança coordenaram uma ação em dois locais desse bairro de Guayaquil para revistar pessoas, carros, motos e ônibus e para demonstrar força à população e à imprensa.

Diante das câmeras, a equipe parou algumas pessoas para inspecionar bolsos e mochilas, todos homens. Um deles, aparentemente usuário de drogas, retirou os sapatos e desbloqueou a tela do celular para que um oficial olhasse suas mensagens, sendo liberado segundos depois.

A busca por tatuagens de facções e inspeções em telefones têm feito parte das revistas, segundo Gutierrez —o presidente Noboa classificou 22 desses grupos criminosos locais como terroristas, convertendo-os em "alvos militares".

Militares checam tatuagens de suspeito de integrar gangue, em Quito
Militares checam tatuagens de suspeito de integrar gangue, em Quito - Karen Toro - 12.jan.2024/Reuters

Logo na esquina do local onde ocorreu a operação havia uma viela conhecida pela venda de drogas, mas a equipe não entrou ali porque não tem mandados de prisão, afirmou o tenente ao ser questionado.

"São operações de impacto", disse o porta-voz, admitindo que esse tipo de ação não serve para encontrar armas pesadas ou grandes quantidades de drogas, e sim para que a população "sinta a segurança de que pode trabalhar com tranquilidade". "Desde que estamos nas ruas, os criminosos se esconderam."

"Como vocês podem notar, temos muita aceitação pelos moradores", acrescentou ele, pouco depois de um grupo aplaudir a passagem dos militares. Os recados de apoio não foram poucos, com diversos moradores levando água e marmitas aos soldados. "Nos juntamos na rua para entregar [os mantimentos]", contou uma comerciante que leva um fardo de refrigerantes e preferiu não se identificar.

Um dos únicos que reclamou foi Manuel, que também não quis dizer o sobrenome. Ele criticou a baixa frequência das operações: "Quando dá vontade é que eles fazem isso. Mas é todos os dias que nós, cidadãos, queremos que façam o que estão fazendo agora. O bandido passa em frente aos olhos deles e eles não se dão conta", afirmou após ter sido revistado.

Os militares também pararam três ônibus, deixando que a imprensa entrasse antes de perguntar aos passageiros se eles tinham algo a denunciar. Sem respostas, agradeceram e foram novamente aplaudidos.

Em outro ponto, acharam o carro de um órgão público de outra província, abandonado com um pneu furado, e avisaram às autoridades. Revistaram ainda dois agentes penitenciários fardados, constatando que eram reais, e alguns motoqueiros. "A gente se atrasa um pouco, mas não incomoda", dizia um deles.

Duas horas depois de circular pelas ruas da região, os militares subiram de volta no ônibus e foram embora.

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