Descrição de chapéu União Europeia drogas

Alemanha aprova legalização parcial de uso, posse e cultivo de maconha

Lei que teve maioria de votos no Parlamento permite cultivar até três plantas para consumo privado e porte de 25 gramas

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Boa Vista e São Paulo

O Bundestag, Parlamento da Alemanha, aprovou nesta sexta-feira (23) uma lei proposta pela coalizão governista, do premiê Olaf Scholz, que legaliza parcialmente o cultivo e o consumo de uma quantidade limitada de maconha para os maiores de 18 anos. As novas regras passam a valer em 1º de abril.

A permissão para cultivar até três plantas e portar até 25 gramas em espaços públicos tem como argumento principal regularizar um comportamento que, segundo números oficiais estimados, é seguido por 4,5 milhões de alemães, e tirar força do mercado ilegal.

Imitação gigante de um baseado defende a legalização da maconha no Museu da Cannabis de Berlim em dia de votação no Bundestag
Imitação gigante de um baseado defende a legalização da maconha no Museu da Cannabis de Berlim em dia de votação no Bundestag - John Marcdougall/AFP

A produção de cânabis em maior escala, mas ainda não comercial, será permitida para membros dos chamados "clubes de maconha", que poderiam ter no máximo 500 pessoas, todos adultos. E apenas os membros do clube teriam permissão para consumir sua produção.

Antes, nos planos originais, chegou a ser cogitado permitir que lojas e farmácias licenciadas vendessem a substância, mas a ideia foi descartada devido às preocupações da União Europeia de que isso poderia levar a um aumento nas exportações de drogas.

"O objetivo é combater o mercado ilegal e o crime relacionado às drogas, além de reduzir a quantidade de tráfico e diminuir o número de usuários", disse o ministro da Saúde alemão, o social-democrata Karl Lauterbach, antes da aprovação no Parlamento.

Foram 407 votos favoráveis, 226 contrários e 4 abstenções. O debate a respeito da legalização no Bundestag também teve momentos curiosos. Um deputado do partido conservador CSU que discursava contra a liberação, Stephan Pilsinger, foi interrompido por um parlamentar do partido liberal FDP, que faz parte da coalizão de Scholz. O liberal, Max Mordhorst, leu no microfone uma notícia de 2017 na qual Pilsinger dizia cultivar cogumelos mágicos, e alfinetou, entre risos dos demais deputados: "Fico feliz com a sua posição liberal a respeito dessa droga. Talvez possamos nos entender sobre outras drogas".

Embora o plano tenha em parte inicialmente frustrado ativistas a favor da legalização total da maconha na Alemanha, a aprovação foi comemorada por grupos militantes e de cultivo. Oliver Waack-Jürgensen, presidente do Cannabis Social Club (CSC) High Ground, de Berlim, celebrou a aprovação em publicações nas redes sociais. "Não esperava um resultado tão claro", escreveu.

Em maio do ano passado, ele se mostrava com receio dos planos do governo para a legalização da maconha, uma promessa de campanha da coalizão entre o Partido Social-Democrata, os Verdes e o Partido Liberal.

"O que o governo diz é que vai dar a responsabilidade da distribuição aos CSCs, mas vai restringir o direito de associação", disse ele à Folha, após o anúncio da coalizão de que apresentaria a legislação ao Parlamento. "Nós precisamos da participação de lojas e empresas além dos clubes, porque não podemos nem queremos cobrir a demanda de toda a população. Nós estamos aqui para quem não quiser comprar de empresas e para conscientizar sobre cultivo e um consumo saudável."

A lei inclui ainda um dispositivo para anistiar pessoas condenadas por acusações de posse de drogas de menor grau anteriormente. Um grupo de juízes havia alertado que revisar os casos que se enquadram poderia sobrecarregar o sistema de Justiça.

"O judiciário espera que mais de 100 mil casos em todo o país sejam revisados no caso da planejada remissão retroativa das sentenças por crimes relacionados à cânabis", afirmou à imprensa local Sven Rebehn, diretor da Associação Federal Alemã de Juízes. Rebehn estima que um comitê de juízes levaria um ano inteiro para revisar casos antigos para determinar se cabe anistia em cada um deles.

A nova legislação coloca a Alemanha em situação parecida com a de países como Uruguai e Canadá, nos quais o uso recreativo da droga também é legal, além de algumas partes dos Estados Unidos e da Austrália. Muitos outros permitem seu uso medicinal, uma prática que a Alemanha planeja regulamentar em breve, mas em uma lei separada.

O uso de maconha continua sendo ilegal para menores de idade. Consumir perto de escolas e parques infantis também não será permitido. "Essa restrição é necessária porque a cânabis é particularmente prejudicial para o cérebro ainda em desenvolvimento", disse Lauterbach. "Ninguém deve entender mal essa lei: o consumo de maconha está sendo legalizado, mas isso não significa que não seja perigoso."

Políticos conservadores da oposição se opõem às novas regras, que consideram muito complicadas para as autoridades aplicarem e que poderiam levar a um maior consumo. "Em vez de proteger crianças e jovens, a coalizão age como um traficante estatal de drogas", disse o democrata-cristão Tino Sorge.

Estados alertaram que a legalização pode sobrecarregar também a polícia, que espera ver um aumento no número de pessoas dirigindo sob a influência da droga e outros crimes relacionados a entorpecentes.

A oposição em nível estadual é relevante porque a proposta ainda será aprovada pelo Conselho Federal, o Bundesrat, composto por representantes dos estados. O órgão poderia enviar a legislação de volta a um comitê de arbitragem, o que poderia atrasar a implementação da lei —não pode, no entanto, bloquear indefinidamente o texto após o apoio majoritário no Bundestag.

Alguns especialistas dizem duvidar que as novas regulamentações tenham muito impacto no tráfico, já que aqueles que não estão dispostos a cultivar sua própria maconha ou se juntar a um clube de cânabis ainda podem preferir comprar a droga.

Com Reuters e The New York Times

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