Lei que criminaliza incitação ao ódio entra em vigor sob críticas na Escócia

Opositores, incluindo a autora da saga Harry Potter, J. K. Rowling, temem ameaça a liberdade de expressão

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Boa Vista

Entrou em vigor nesta segunda-feira (1º) na Escócia uma lei contra crimes de ódio vista por opositores do texto como uma ameaça à liberdade de expressão, particularmente em discussões críticas sobre diferentes concepções de gênero e sexualidade.

Chamada de Lei de Crime de Ódio e Ordem Pública, a legislação consolida outros textos a respeito de crimes de ódio e cria um novo tipo de delito que também expande os grupos de vítimas abarcados pelas novas regras.

O primeiro-ministro da Escócia, Humza Yousaf, durante sessão no Parlamento escocês em Edimburgo, em dezembro
O primeiro-ministro da Escócia, Humza Yousaf, durante sessão no Parlamento escocês em Edimburgo, em dezembro - Andy Buchanan - 19.dez.2023/AFP

A lei criminaliza "comportamento ameaçador ou abusivo com a intenção de incitar ódio" contra um grupo de pessoas baseado em idade, deficiência, religião ou filiação religiosa, orientação sexual, identidade transgênero e variações em características sexuais.

Considerações relativas a raça, cor, nacionalidade e origens étnicas já existiam, mas foram reforçadas com a inclusão de "insulto" nos termos a serem possivelmente enquadrados na lei.

A exclusão de mulheres cisgênero —que se identificam com o gênero atribuído no nascimento— dos grupos de vítimas e a inclusão de características sexuais foram dois dos alvos principais das críticas desde a proposta do texto, quando o atual primeiro-ministro escocês, Humza Yousaf, era secretário de Justiça e trabalhou para fazer o texto avançar no Parlamento local. O governo diz que uma lei paralela sobre misoginia seria proposta, mas isso ainda não ocorreu.

A legislação foi aprovada em 2021, mas discussões acaloradas no Parlamento escocês atrasaram a tramitação final com adições para fortalecer a proteção à liberdade de expressão.

A pena máxima prevista pela nova lei na Escócia é de prisão de sete anos, e a identificação de incitação ao ódio é vista como agravante de eventual ofensa que seja enquadrada como delito.

De acordo com Yousaf, a nova legislação não criminaliza o debate de ideias. "A menos que seu comportamento seja ameaçador ou abusivo e pretenda incitar o ódio, então não há nada com que se preocupar em termos dos novos delitos que estão sendo criados", afirmou.

A escritora J. K. Rowling, autora da saga Harry Potter várias vezes acusada de transfobia por comentários sobre identidade de gênero, manifestou-se de forma provocativa após a lei entrar em vigor.

"É impossível descrever ou enfrentar com precisão a realidade da violência e da violência sexual cometida contra mulheres e meninas, ou abordar o atual ataque aos direitos das mulheres e meninas, a menos que nos seja permitido chamar um homem de homem", disse ela em longa publicação no X. "A liberdade de expressão e crença chegou ao fim na Escócia se a descrição precisa do sexo biológico for considerada crime."

"Estou atualmente fora do país, mas se o que eu escrevi aqui se qualifica como delito sob os termos da nova lei, estou ansiosa para ser presa quando voltar ao berço do iluminismo escocês", escreve Rowling, que tem residência em Edimburgo.

A deputada Joanna Cherry, do Partido Nacionalista da Escócia (SNP, na sigla em inglês), mesma legenda de Yousaf, afirmou não ter dúvidas de que a nova lei "será utilizada como arma por ativistas dos direitos trans para tentar silenciar, e pior ainda, criminalizar mulheres que não compartilham suas crenças".

Há ainda dúvidas sobre o impacto da nova lei, mais abrangente, sobre o trabalho da polícia, responsável por receber denúncias e agir contra comportamentos vistos como abusivos.

A Associação de Superintendentes da Polícia da Escócia levantou preocupações de ordem prática com a nova lei. "[Há] ódio e insultos suficientes na internet para ocupar todos os agentes de polícia da Escócia", disse a associação.

Além disso, a Federação da Polícia da Escócia, espécie de sindicato da categoria, diz que policiais não receberam treinamento suficiente para lidar com situações do tipo.

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