Um bombardeio de Israel a uma escola da ONU que abrigava civis em Nuseirat, no centro da Faixa de Gaza, matou pelo menos 35 pessoas nesta quarta-feira (5), de acordo com a agência das Nações Unidas para refugiados palestinos.
Philippe Lazzarini, comissário-geral da UNRWA, confirmou o número em uma publicação na rede social X. Disse ainda que já havia passado as coordenadas da escola às autoridades israelenses e que, mesmo assim, o ataque ocorreu sem aviso prévio.
Autoridades do governo de Gaza, administrado pelo Hamas, e um funcionário do Ministério da Saúde do território disseram à agência de notícias Reuters que 40 pessoas foram mortas, incluindo 14 crianças e 9 mulheres. O Hospital dos Mártires de Al-Aqsa, por sua vez, afirmou ter recebido 37 corpos.
Após o bombardeio, o Exército israelense disse que seus caças realizaram um "ataque preciso". "Estamos muito confiantes na inteligência", disse o tenente-coronel Peter Lerner, acusando combatentes do Hamas e do Jihad Islâmico de usarem instalações da ONU como bases operacionais.
Ele disse que 20 a 30 combatentes estavam localizados no complexo e que muitos deles foram mortos, mas não tinha detalhes precisos. "Não estou ciente de quaisquer vítimas civis, e seria muito, muito cauteloso ao aceitar qualquer coisa que o Hamas divulgue", afirmou.
Fotos de agências de notícias, porém, mostram o corpo de pelo menos uma criança no local do ataque, além de dezenas de pessoas mortas envoltas em mortalhas.
Ismail Al-Thawabta, diretor do escritório de mídia do governo de Gaza, negou a afirmação de Tel Aviv de que o prédio era utilizado pelo grupo terrorista. "[Israel] mente e inventa histórias para justificar o crime brutal que cometeu contra dezenas de pessoas deslocadas."
Lazzarini, da UNRWA, afirmou que as acusação de que grupos armados estavam dentro do abrigo eram chocantes, mas que a organização não havia conseguido verificá-las. "Atacar ou usar edifícios da ONU para fins militares é um flagrante desrespeito ao direito internacional humanitário", disse ele.
Enquanto algumas pessoas removiam escombros de salas de aula ensanguentadas, Huda Abu Dhaher descreveu o que viu após o ataque que a acordou durante a noite. "Os restos das pessoas estavam espalhados dentro e fora do pátio. O botijão de gás explodiu", disse ela à agência de notícias Reuters. "Meu sobrinho foi martirizado. Ele perdeu a perna e o braço, tinha 10 anos."
O Hospital dos Mártires de Al-Aqsa, na cidade de Deir Al Balah, é o último centro de saúde operante no centro da Faixa de Gaza, segundo o Ministério da Saúde do território, que enfrenta escassez de suprimentos devido a bloqueios de Tel Aviv.
Antes do último ataque em Nuseirat, o hospital havia recebido desde terça-feira (4) pelo menos 70 mortos e mais de 300 feridos em bombardeios israelenses, afirmou a ONG Médicos Sem Fronteiras. A maioria era formada por mulheres e crianças, segundo a entidade.
"O cheiro de sangue na sala de emergências esta manhã era insuportável. Há pessoas deitadas por todos os lados. Estão trazendo os corpos em sacos plásticos. A situação é insustentável", publicou a coordenadora da organização em Gaza, Karin Huster, na rede social X.
Os Estados Unidos disseram nesta quinta-feira (6) que estão em contato com Israel a respeito do ataque. Washington pediu transparência de Tel Aviv na elucidação do caso. Uma reportagem da emissora CNN, entretanto, mostrou que o bombardeio foi realizado com armamento americano.
Ao jornal Times of Israel, o porta-voz das Forças Armadas israelenses Daniel Hagari disse que "a mídia internacional caiu na estratégia do Hamas mais uma vez" no caso do ataque à escola, dizendo que o grupo terrorista espera que, ao se esconder em escolas, hospitais e mesquitas, "a lei internacional e a boa vontade da opinião pública os proteja de ataques". Hagari afirmou que a estratégia do grupo obriga Israel a tratar esses prédios como alvos de guerra.
O bombardeio ocorre no momento em que a pressão internacional aumenta para Tel Aviv e Hamas chegarem a um acordo de cessar-fogo, depois de novo plano apresentado pelo presidente dos EUA, Joe Biden. O governo do premiê Binyamin Netanyahu tem reiterado que não vai interromper as ações militares em Gaza durante as negociações.
O líder político do Hamas, Ismail Haniyeh, disse na quarta que uma das exigências do grupo terrorista no acordo era o fim da guerra. Embora isso estivesse previsto no plano de Biden, apresentado no último dia 31, Israel insiste que só encerrará suas operações com a destruição completa do Hamas, o que mantém o impasse.
No discurso em que apresentou o acordo, Biden disse que as negociações levariam a um "dia seguinte" para a Faixa de Gaza sem o Hamas no poder, mas não está claro como isso seria possível. Depois de meses de bombardeios e mais de 36 mil palestinos mortos em Gaza, a facção terrorista não dá sinais de que perdeu a coesão e a capacidade de agir como grupo.
A proposta prevê três fases: na primeira, haveria um cessar-fogo completo por seis semanas, Israel retiraria todas as tropas das áreas habitadas da Faixa de Gaza, e reféns sequestrados pelo Hamas nos ataques de 7 de outubro seriam libertados em troca da soltura de centenas de prisioneiros palestinos.
Na segunda etapa, o Hamas e Israel negociariam um fim permanente para a guerra, e o cessar-fogo continuaria em vigor durante essas negociações —ponto já rejeitado por Tel Aviv. A terceira fase consistiria em um plano de reconstrução do território palestino.
Assim, a resposta de Haniyeh, juntamente com as ameaças de parceiros da coalizão de Binyamin Netanyahu de abandonarem o governo caso o acordo seja aceito, torna improvável um avanço.
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