Ultradireita chega a novo Parlamento Europeu em alta, mas sob disputa interna

Segunda maior força da Casa, grupo político se dividiu em três blocos, e húngaro Orbán busca ser protagonista

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Lisboa

A primeira sessão do novo Parlamento Europeu será nesta terça-feira (16), e o foco está na crescente ultradireita. Agora a segunda maior força na Casa, o campo político se transformou numa criatura de três cabeças, como o cão Cérbero da mitologia grega.

Na eleição do início de junho, o bloco Conservadores e Reformistas (ECR), liderado pela primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, emergiu como a principal força desse grupo. Ao longo da semana passada organizaram-se à direita de Meloni uma "ultra-ultradireita", criada pelo premiê húngaro, Viktor Orbán, e uma "ultra-ultra-ultradireita", sob comando da legenda extremista Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em alemão).

A imagem mostra um grupo de pessoas em um ambiente formal, possivelmente uma conferência ou reunião. No centro, uma mulher de cabelo loiro e blazer cinza está em pé, cercada por homens de terno. Algumas pessoas estão conversando entre si, enquanto outras parecem estar observando algo fora do quadro. O ambiente é profissional e sério.
A primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, durante uma sessão de trabalho da Cúpula da Otan; ela emergiu como a principal força do bloco conservador na Europa - Brendan Smialowski - 11.jul.24/AFP

O Legislativo da União Europeia é integrado por famílias de partidos de países diferentes com ideias em comum. Os dois novos blocos foram organizados por siglas que se elegeram de forma independente, sem pertencer a nenhuma dessas famílias –o Fidesz, de Orbán, e a alemã AfD.

Eles agora integram, respectivamente, os blocos "Patriotas pela Europa" e "Europa das Nações Soberanas". Esse último defende uma agenda anti-imigração, antipacto verde, antifeminista, anti-LGBTQIA+ e contra o envio de ajuda militar para a Ucrânia.

Os três grupos têm divergências ideológicas e refletem uma briga de poder entre seus líderes. Na disputa por hegemonia, o líder húngaro saiu na frente. Ele criou o "Patriotas pela Europa" logo depois de Budapeste assumir, com estardalhaço, a presidência rotativa de seis meses da União Europeia, no início do mês.

Com a filiação da Reunião Nacional, partido da francesa Marine Le Pen, o bloco de Orbán ultrapassou o grupo de Meloni e se transformou no maior bloco da ultradireita no Parlamento, com 84 deputados.

A chefia temporária da UE é exercida por países, não por pessoas. A nação que assume a tarefa passa a ter influência na agenda, mas não muito mais do que isso. O cargo simbólico não se compara, em prestígio e poder, aos três "top jobs" –presidente da Comissão Europeia (braço executivo), presidente do Conselho Europeu (define a agenda política) e chefe da diplomacia da União Europeia. Orbán, no entanto, tem feito tudo para que a presidência húngara não passe despercebida.

Os publicitários do Fidesz criaram um slogan inspirado em Donald Trump –"Make Europe Great Again", ("Faça a Europa grande de novo", em português)— e um logotipo que reproduz o cubo mágico, brinquedo inventado pelo arquiteto húngaro Erno Rubik nos anos 1970. "Juntos somos mais fortes do que separados", disse Janos Bóka, ministro responsável pela campanha, numa tentativa de explicar o simbolismo do cubo.

Nas duas primeiras semanas, Orbán efetivamente conseguiu unir grande parte da Europa –contra ele. O premiê decidiu empreender uma viagem batizada de Missão de Paz com escalas na Ucrânia, Rússia e China. A visita ao presidente russo, Vladimir Putin, adversário da União Europeia desde que invadiu o território ucraniano, em fevereiro de 2022, foi o estopim para uma série de críticas.

A estoniana Kaja Kallas, que apresentou sua renúncia ao cargo de primeira-ministra para provavelmente ser empossada nesta quinta-feira (18) como chefe da diplomacia europeia, foi direta: "Orbán está usando a presidência rotativa da Hungria para causar confusão".

Para o húngaro Marius Dragomir, professor da Universidade da Europa Central (Viena) e da Universidade de Santiago de Compostela (Espanha), o premiê conta com uma vitória da ultradireita austríaca nas eleições em setembro, o que poderia ampliar sua influência regional, além de um triunfo de Donald Trump nos EUA em novembro. Orbán promove anualmente a versão europeia da Conferência de Ação Política Conservadora (CPAC), um dos principais braços ideológicos do trumpismo.

O líder aproveitou a cúpula da Otan (aliança militar liderada pelos EUA), em Washington, para se reunir com Trump na última quinta (11), dois dias antes do atentado contra o ex-presidente. Na foto que publicou na rede social X, voltou a chamar sua viagem de Missão de Paz.

Segundo Dragomir, a tal missão tem interesses econômicos. "O governo de Orbán é sustentado por um grupo de oligarcas que são em parte financiados por fundos europeus. Crítico da União Europeia, ele quer diminuir essa dependência."

Com suas 84 cadeiras, o Patriotas pela Europa tem cerca de 11% dos eurodeputados. Somados os blocos de Meloni e da AfD, a ultradireita chega a 25% do Parlamento. Ainda é pouco para fazer frente à aliança de centro, que domina a Casa com mais de 60% dos assentos, contando-se aí o apoio dos Verdes.

É, no entanto, um número expressivo e suficiente para conseguir cargos na burocracia de Bruxelas e defender agendas caras aos ultradireitistas, como o endurecimento das regras de imigração e o fim do pacto ambiental. Há igualmente preocupação em relação ao apoio à Ucrânia, tema pautado para esta quarta-feira (17). Orbán pretende discursar sobre sua ativa presidência, mas os líderes do bloco centrista tentam impedi-lo.

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