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Sérgio Pena: A dupla hélice do DNA faz 65 anos

A partir daquele 25 de abril de 1953, o gene, antes uma entidade abstrata, ganhou fisicalidade; a biologia e a medicina se unificaram e deram à luz a biologia molecular

Os cientistas Francis Crick (à dir.) e James Watson, codescobridores da estrutura do DNA, expõem seu estudo em uma foto feita por volta de 1953
Os cientistas Francis Crick (à dir.) e James Watson, codescobridores da estrutura do DNA, expõem seu estudo em uma foto feita por volta de 1953 - 1953 - Reuters/Christie's Images

"Cesse tudo o que a Musa antiga canta, que outro valor mais alto se alevanta."

Desde os tempos dos descobrimentos marítimos, nunca esses dizeres foram mais verdadeiros do que naquele feliz dia 25 de abril de 1953 no qual James Watson  e Francis Crick (1916-2004) publicaram no periódico britânico Nature um simples artigo —apenas uma página— com o título: “Uma estrutura para o ácido nucleico de desoxirribose”.

Mas a simplicidade era apenas aparente. Após a apresentação do modelo de dupla hélice do DNA (uma legítima escada de Jacó), é declarada, no penúltimo parágrafo, a revolução: “Não escapou à nossa atenção que o pareamento que nós postulamos imediatamente sugere um possível mecanismo de cópia para o material genético”.

A partir desse dia, hoje chamado “Dia Internacional do DNA”, tudo mudou. O gene, antes uma entidade abstrata, ganhou fisicalidade. A biologia e a medicina se unificaram e deram à luz uma nova vedete, a biologia molecular.

Paulatinamente, mas inexoravelmente, seguiram-se as descobertas dos mecanismos de expressão genética, dos RNAs mensageiros, dos RNAs transportadores, dos RNAs catalíticos, do código genético, dos transposons, do DNA recombinante, e outros, que foram responsáveis por nada menos que 26 Prêmios Nobel em Medicina ou em Química até hoje, inclusive o dos próprios Watson e Crick, em 1962.

E tudo desembocou, exatamente 50 anos após, no Projeto Genoma Humano, que teve seu término oficial em 25 de abril de 2003.

O Projeto Genoma Humano deu aos navegantes da biologia e da medicina um verdadeiro mapa genômico para se orientarem. Com ele, passaram muito, muito além da Taprobana, desembocando no admirável mundo novo da genômica e da medicina molecular de 2018.

Nesse novo mundo entendemos bem o câncer e vamos aos poucos transformando-o em doença crônica. Já conquistamos a aids em grande parte e temos a doença de Alzheimer em nossa mira.

A medicina de precisão, preditiva, preventiva e personalizada, rapidamente se torna realidade. O sequenciamento completo do genoma tornou-se ferramenta da medicina e é usado rotineiramente no diagnóstico de doença genéticas, inclusive aqui no Brasil. 

Que sejam soltos os fogos de artifício! Que sejam lançados confetes e serpentinas! Hoje queremos comemorar o dia em que um artigo científico de uma única página mudou toda a história da humanidade.

Sérgio Pena

Professor de bioquímica da UFMG, é membro titular da Academia Brasileira de Ciências

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