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Thomas Leoncini

Agora ou nunca: jovens e velhos juntos para fazer a revolução

Lições de meus encontros com o papa Francisco

Papa Francisco acena para o público na praça de São Pedro, no Vaticano
Papa Francisco acena para o público na praça de São Pedro, no Vaticano - Alessandra Tarantino - 2.set.18/Associated Press

Quando o papa Francisco, olhando em meus olhos, me explicou por que “Deus é jovem”, entendi que naquele exato momento, com essa frase, ele estava fazendo história.

Estávamos sentados, um de frente para o outro, em uma sala na Casa Santa Marta, no Vaticano, e ele tinha acabado de servir água fresca no meu copo, recomendando que eu bebesse muito. O papa Francisco entendeu a importância dos jovens e disse que os jovens são feitos da mesma “massa” de Deus.

É como se ele os tivesse adotado e legitimasse que eles exijam um lugar diferente nesta sociedade. Os jovens são “descarte” para a sociedade líquida. Os jovens perderam a chance de decidir seu próprio destino e são sugados por inícios intermináveis que quase nunca encontram conclusões lógicas.

Como é possível que tenhamos chegado a isso? Os jovens de hoje são muito mais qualificados profissionalmente do que no passado. Eles têm uma educação muito mais vasta e sabem como administrar, melhor que os adultos, o triunfo do tempo sobre o espaço. É bem este o ponto: os jovens alargaram (juntamente às suas competências) as suas expectativas, e é exatamente isso que, por meio da inevitável frustração, alimenta a agressividade e a necessidade de compensação.

Toda a psicologia social gira em torno do vínculo inerradicável entre frustração e agressividade, a partir dos estudos pioneiros sobre o tema de John Dollard (permanece histórico seu livro “Frustration and aggression”, Yale University Press, 1939).

Zygmunt Bauman me fez notar que precisamos ser muito cautelosos quando falarmos sobre agressividade hoje, porque nossa sociedade banalizou o mal. E a função da banalidade é divertir e entreter, não chocar. Consequentemente, a agressividade é um "post" para difundir com a intenção de entreter, em vez de um sinal alarmante que choca.

A agressividade está perdendo seu drama, transformando-se em algo impessoal, para ser observado ou interrompido à vontade.

E isso está muito ligado aos jovens, porque se a frustração é a gênese da agressividade, devemos ter muito cuidado, como o papa Francisco nos ensina, antes de liquidar os jovens, dando-lhes o papel de subordinados ou de “descarte”. Os jovens crescem e, inevitavelmente, em breve estarão no poder, no lugar dos adultos atuais.

Outro aspecto igualmente dramático é a situação dos velhos. Os velhos são cada vez mais uma categoria totalmente à mercê dos caprichos dos adultos: em muitos países, estão perdendo até mesmo o direito à aposentadoria.

Os velhos são cada vez mais vistos como uma categoria supérflua, um grupo que precisa de assistência; em vez disso, eles são essenciais para entender o passado e encarar o futuro.

Os jovens e os idosos precisam, cada vez mais, de um método novo. Um método que, como diria Antonio Gramsci, ainda não foi inventado, embora seja certo que deve ser algo novo, pois os métodos usados até agora falharam.

Os jovens merecem se orientar de acordo com uma lógica que aceite a mutabilidade da existência (a vida é líquida), mas que ao mesmo tempo consiga traçar um caminho que, embora tormentoso, leve a um percurso preciso, de crescimento.

Este método pode ser eficaz graças à aliança entre jovens e velhos, na qual os velhos sábios e os jovens corajosos se unem em uma associação que, se repetida com constância, pode nos ajudar a salvar nossa sociedade desenraizada. E, assim, nos reapropriaremos de um senso mais profundo e duradouro, que capta a esperança humana de eternidade e a encerra no instante sem tempo do encontro autêntico.

Minhas experiências com o papa Francisco e com Zygmunt Bauman devem ser lidas neste contexto: são sobretudo encontros e diálogos constantes, fora de qualquer lógica condescendente com o poder. São encontros francos e sem intermediários, entre estas duas gerações.

Esta aliança cria laços tão fortes como os parentais e biológicos, cria pais e filhos psicológicos, cria uma missão a se realizar juntos, que não é uma revanche, mas um ato de generosidade para as gerações futuras. E a missão mais urgente hoje é também a mais difícil: salvar um planeta à deriva.

Thomas Leoncini

Jornalista e escritor italiano; autor, com o papa Francisco, do livro "Deus é jovem" (Ed. Planeta) e, com Zygmunt Bauman, de "Nati liquidi" (Zahar, agosto 2018; discípulo de Zygmunt Bauman, graduado em psicologia com formação em educação psicossocial

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