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Norberto Peporine Lopes

A universidade é a galinha dos ovos de ouro

Pesquisa e educação deveriam ser pontos de coesão

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Estudantes protestam em São Paulo contra o corte de verbas nas universidades - Miguel Schincariol - 30.mai.19/AFP
Norberto Peporine Lopes

Quando criança, lembro da minha mãe preparando ovo mole, que deveria ser consumido enquanto quente. Na minha tenra idade, não pensava sobre como a produção de alimentos poderia ser impactada pela produção tecnológica derivada da pesquisa científica, mas fazia considerações sobre o ovo e a galinha. 

Após mais de 30 anos de vida acadêmica, fico feliz em comprovar o impacto do financiamento à pesquisa e ao desenvolvimento na vida das pessoas. Contudo, pelo atual frenesi contra as universidades, creio que boa parte da população não tenha a real noção sobre a relevância da pesquisa na qualidade de vida da sociedade moderna, mesmo se tratando de dados que estão em seu prato.

Nos acostumamos e somos seduzidos por produtos e serviços cada vez mais tecnológicos, mas não podemos esquecer que todo e qualquer produto e processo inovador passa por uma etapa de pesquisa em empresas e universidades. Tradicionalmente, as universidades trabalham em pesquisas na fronteira do conhecimento —que, após sua sedimentação, é material para a transferência tecnológica à sociedade.

A partir de 1996, com a Legislação sobre Patentes, as interações entre as universidades e o setor produtivo foram estimuladas. Estávamos totalmente centrados na produção de cópias, resultando em uma grande dependência de tecnologia externa. Em 2004 foi sancionada a Lei da Inovação e, em 2016, o Marco Regulatório da Inovação desburocratizou procedimentos, permitiu a conexão entre universidades e empresas e alavancou o sistema de parques tecnológicos no país.

Os resultados aparecem diariamente, mas a população ainda não tem essa percepção. Na química, por exemplo, surgiram empresas de suporte analítico que tiraram a dependência de nossas empresas nacionais de serviços no exterior, empresas de novos insumos da biodiversidade, de cosméticos, nas áreas de novos materiais, petroquímica e agroquímica, entre inúmeros outros exemplos. 

Outro produto fundamental é o capital humano formado nas universidades. Com a chegada da indústria 4.0, é necessário mão de obra cada vez mais qualificada. As universidades públicas, ao desenvolverem pesquisas, acomodam em seus quadros tanto estudantes de pós-graduação como de graduação, ampliando a formação de mão de obra qualificada que poderá atuar nos diferentes setores da indústria.

Deve ficar claro que os centros de pesquisa e as universidades são um patrimônio da nação. É importante saber que uma universidade tem por princípio o universo e a diversidade de pensamentos e de conhecimento, acolhendo todo o tipo de discussão —ou, então, será uma instituição menor. 

Não é o momento para discussão acirrada de direita versus esquerda, usando pautas cruciais como pesquisa e educação como campo de batalha, quando estes deveriam ser pontos de coesão. Ou nos unimos para proteger as universidades ou irão matar a galinha antes de colhermos os ovos de ouro.

Norberto Peporine Lopes

Farmacêutico, doutor em química e presidente da Sociedade Brasileira de Química

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