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Oded Grajew

O país que queremos

Educação de qualidade vale qualquer sacrifício

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Oded Grajew, presidente do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil - Reinaldo Canato - 04.set.19/Folhapress

Diante da redução dos recursos para as universidades, deveríamos nos fazer a seguinte pergunta: que país queremos construir, qual é o projeto do Brasil como nação?
 
Se quisermos um país debilitado e dependente economicamente, cidadãos empobrecidos e desinformados, uma massa fragilizada à espera de um salvador e facilmente manipulável por populistas e demagogos, basta asfixiar recursos da educação e empobrecer os currículos, retirando disciplinas que estimulam a reflexão e o pensamento crítico, como são, por exemplo, a sociologia e a filosofia.

Apesar dos discursos, e ressalvando honrosas exceções, manter a educação nos atuais patamares é um projeto político de poder que se alimenta da dependência e do precário acesso à informação e ao conhecimento da maioria dos cidadãos.

Mas se quisermos um país prospero economicamente e competitivo internacionalmente, educação de qualidade é fundamental. Se quisermos reduzir a pobreza e as desigualdades e aumentar a renda das pessoas, educação de qualidade é fundamental. Se quisermos ter cidadãos conscientes, críticos, exigentes, atuantes, que acompanhem e cobrem dos governantes ética e eficiência, uma democracia participativa e consolidada, educação de qualidade é fundamental. Se educação de qualidade é fundamental para a construção de um país que certamente corresponde à expectativa das pessoas que querem bem ao Brasil, ela deveria ser tratada de forma diferenciada, com absoluta prioridade.

A discussão não deveria ser se devemos ter uma determinada porcentagem do orçamento para a educação ou cortar uma determinada porcentagem dos recursos para se adequar à redução das receitas. 
Deveríamos, isto sim, elaborar um programa que garanta educação de qualidade para todos (propostas e conhecimentos não faltam), dimensionar e alocar todos os recursos necessários para este projeto. Repito: dimensionar e alocar todos os recursos necessários para garantir educação de qualidade para todos os brasileiros. 

Faríamos sacrifícios em todas as outras áreas, procurando poupar e preservar a população mais vulnerável. Poderíamos, inclusive, aumentar as receitas taxando os mais favorecidos. Educação seria a grande e absoluta prioridade, e o sacrifício de alguns anos em outras áreas seria recompensado pela construção de um país próspero e com qualidade de vida para todos. Foi esta decisão que tomaram no passado todos os países que se tornaram desenvolvidos. A Coreia do Sul é o exemplo mais recente —o PIB per capita era a metade do Brasil nos anos 1980; atualmente, é o dobro.

O Brasil, vergonhosamente, é um dos países mais desiguais do mundo. Aqui, 5% da população auferem 95% da renda. Não há país que dê certo com este quadro. Recursos não faltam, mas são mal distribuídos. Precisar pagar para ter acesso à educação de qualidade alimenta e reforça as desigualdades. Educação pública de qualidade, oferecendo oportunidades iguais para pobres e ricos, é o caminho mais eficaz para reduzir as desigualdades.

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) sempre cita Israel como exemplo. Foi exatamente essa escolha que o país fez desde sua fundação. Tinha enormes carências; havia, inclusive, racionamento de comida para os adultos. Mas os recursos da educação eram e continuam sendo sagrados. Governo e a população se viraram, fazendo sacrifícios para garantir tais recursos. Ninguém nunca ousou falar em cortes, mesmo em épocas de dificuldades. Nasci lá e sou o resultado desta escolha. Alunos e professores eram e são reverenciados até hoje. Ninguém os chama de idiotas e imbecis. Atualmente, o PIB per capita de Israel é cinco vezes maior que o do Brasil.

Muitos pais fizeram e fazem sacrifícios, cortam na carne despesas, se desdobram para auferir mais renda, tudo para garantir que seus filhos possam estudar em boas escolas para ter um futuro melhor. Certamente foi o que fizeram pais de vários leitores deste artigo. É desta escolha a nível coletivo, de governos e sociedade, que depende o futuro do nosso país.

Oded Grajew

Idealizador do Fórum Social Mundial, é presidente emérito do Instituto Ethos e conselheiro do programa Cidades Sustentáveis e da Rede Nossa São Paulo

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