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Bolha de privilégios

Judiciário e Ministério Público não acordaram para a realidade orçamentária

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Imagem de anteprojeto de arquitetura do prédio a ser construído pelo Tribunal de Justiça de SP - Reprodução

Enquanto os poderes Executivo e Legislativo precisam lidar mais de perto com cortes de verbas e reformas destinadas a mitigar o colapso das finanças públicas, outros setores da máquina pública não parecem ainda ter acordado para a realidade orçamentária brasileira.

Tornou-se nacionalmente conhecido nos últimos dias, por exemplo, o episódio em que um procurador do Ministério Público de Minas Gerais qualificou de “miserê” a média salarial de R$ 24 mil mensais verificada naquela instituição.

A enorme maioria da população não precisaria de estatísticas para apontar que tal cifra situa seu beneficiário no topo da pirâmide social. Os dados o confirmam: segundo o IBGE, em 2016 a renda média do trabalho do 1% mais rico do país era de R$ 27,3 mil.

O procurador mineiro não corre o risco de ficar fora desse estrato privilegiado. Constatou-se, afinal, que sua remuneração regular chega aos R$ 35,5 mil. Em julho, recebeu ainda outros R$ 41 mil em indenizações e outros penduricalhos.

Artifícios do gênero, destinados a driblar os tetos salariais do serviço público são costumeiros no Ministério Público e no Judiciário brasileiros —cujos custos, como proporção da renda nacional, têm poucos paralelos no mundo.

Essas estruturas consomem algo em torno de 1,6% do Produto Interno Bruto, patamar não encontrado em nenhum outro país relevante, conforme estudo publicado em 2015 por Luciano da Ros.

As aberrações não se limitam a vencimentos incompatíveis com os recursos do país, como mostram outros casos recentes.

Em São Paulo, os planos do Tribunal de Justiça para a construção de um prédio orçado em R$ 1,2 bilhão provocaram constrangimento entre membros da própria corte, segundo noticiou esta Folha.

A justificativa oficial para essa obra faraônica soa risível: economizar alegados R$ 58 milhões anuais hoje gastos com aluguéis e transporte de magistrados.

Tampouco se pode ver sem inquietude a ofensiva para a criação de um sexto Tribunal Regional Federal, com sede em Belo Horizonte. Tal proposta acaba de ser aprovada pelo Superior Tribunal de Justiça, mas felizmente precisa passar também pelo crivo do Congresso e pela sanção presidencial.

Espera-se que os parlamentares possam tirar a limpo o argumento de que o novo órgão não implicará mais despesas, graças a remanejamentos de verbas e pessoal.

Não há mais como expandir uma máquina já inchada e perdulária, que ainda proporciona mordomias quase caricaturais —como o gasto de R$ 100 mil com três ministros do Superior Tribunal Militar que participaram de um seminário de dois dias na Grécia durante o período de férias coletivas.

Judiciário e Ministério Público devem passar por anos de contenção para ao menos mitigar discrepâncias no setor público. A necessária autonomia de que devem gozar não equivale ao direito de viver numa bolha orçamentária.

editoriais@grupofolha.com.br

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