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Ricardo Viveiros

Quando a pandemia passar

Setor produtivo deveria vislumbrar um mundo com mais cooperação e solidariedade

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Em meio à prioritária luta pela preservação da vida, travada na linha de frente da ciência médica, buscam-se soluções para a sobrevivência da economia. Além de vidas é preciso salvar empresas, empregos, investimentos, tributos, retomar o nível de atividade após o domínio da Covid-19. Na pandemia, a única certeza é de que tudo é incerto.

Depois que o furacão passar, o mundo não será o mesmo. Algumas transformações, que estavam em andamento, deverão ser aceleradas, incluindo o uso de meios digitais, a intensificação do e-commerce e de tecnologias voltadas ao aprimoramento da qualidade e produtividade. No setor de serviços, entre outros, comprovou-se a eficácia do home office.

O jornalista e escritor Ricardo Viveiros - Lela Beltrão - 31.mai.16/Folhapress

Na agricultura de precisão, que contribui para racionalizar o uso seguro de fertilizantes e defensivos, tais mudanças levarão em conta a questão da governança, distinta entre as empresas de maior porte e o grande número de produtores familiares. O modelo tradicional deve mudar agregando conhecimento acadêmico e expertise das novas gerações em tecnologias e práticas modernas.

Na área da saúde, há um ponto muito importante que a pandemia provou necessário: o prontuário digital. Esse avanço possibilita ao paciente e a qualquer médico terem acesso aos dados clínicos em qualquer lugar do país ou do planeta. É fundamental o acesso rápido das informações, incluindo eventuais comorbidades que podem agravar a Covid-19.

Por outro lado, como a humanidade está enfrentando um “inimigo” ainda desconhecido, é cedo para análises conclusivas do que vá acontecer após a pandemia. Mas, a digitalização, antes opcional, torna-se indispensável.

Algo muito visível está nas empresas de todos os segmentos que estão conseguindo atender bem neste momento. Elas deverão sair fortalecidas desta crise. A Covid-19 está mostrando também o caráter das organizações. Algumas lutam para manter colaboradores, investir em qualidade, preservar a prestação de serviços de qualidade. Estas veem a pandemia como um momento de empenho coletivo e oportunidade de crescer pela sinergia e liderança agregadora, participar de uma corrente ampla em prol do interesse coletivo.

Outras veem a crise como chance para ajustar o quadro de colaboradores, aumentar preços, menosprezar a entrega de bons produtos e serviços e exigir mais resultados como ação unilateral, descolocada do interesse geral. Por miopia empreendedora, estão se descapitalizando de algo em que investiram por anos: os recursos humanos, seu mais valioso patrimônio. Terão mais dificuldades para se recompor depois da crise.

O momento é de muita sensibilidade, ou seja, de extrema valorização de quem está ao lado da sociedade, do cliente, do fornecedor, dos parceiros e de seus próprios colaboradores.

Outro aspecto que parece caminhar para mudança mais profunda é a horizontalização da produção. Tal conceito, difundido e desenvolvido desde que a era digital intensificou a globalização nos anos 1980, deverá ser revisto. A crise mostrou que a dependência de insumos, matérias-primas e produtos e/ou componentes de outros países coloca várias cadeias de suprimentos em risco.

As indústrias promoverão um reposicionamento, com estrutura produtiva autossuficiente no contexto de cada país e menos dependente de fornecedores externos. Surgem, portanto, numerosas oportunidades para fornecedores de matérias-primas, peças, componentes e serviços para fábricas de bens de consumo e de capital, bem como na agroindústria.

A história demonstra que a civilização aprende pouco e esquece com rapidez os problemas depois das crises. Quando a ciência solucionar o desafio biológico do novo coronavírus, o que ocorrerá? Como as pessoas e as empresas emergirão: será aprendida a dura lição, ou retornarão à "normalidade" como se nada tivesse ocorrido?

Se a maioria do setor produtivo vislumbrar um mundo com mais competição e liberalismo, em um momento em que a maior parte da população parece esperar mais cooperação e solidariedade dos donos do capital, teremos perdido a histórica oportunidade de evoluir para melhor.

Ricardo Viveiros

Jornalista, professor e escritor, é conselheiro da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e da União Brasileira de Escritores (UBE); autor, entre outros, de ‘A Vila que Descobriu o Brasil’ (Geração), ‘Justiça Seja Feita’ (Sesi) e ‘Pelos Caminhos da Educação’ (Azulsol)

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