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Nova década

Alicerces políticos e econômicos da democracia amparam esperança de melhora

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Lua cheia atrás do Cristo Redentor, no Rio, no último dia de 2020 - Ricardo Moraes/Rio

No ano e na década que se iniciam, o país terá o desafio não apenas de corrigir erros e omissões que resultaram no fiasco dos anos 2011-2020, mas também de preservar os avanços institucionais que o período democrático viabilizou na política e na economia.

Não se podem esquecer as consequências, no decênio encerrado, da indisposição para levar adiante reformas que permitissem maior dinamismo produtivo, equilibrassem as contas do Estado e permitissem um amplo redesenho do pacto social em favor dos mais pobres.

Tampouco se devem minimizar, entretanto, os progressos palpáveis que foram acumulados em período ainda mais longo —e que mantêm viva a esperança de dias melhores.

Apesar de momentos de retrocesso e imprudência que fomentaram crises graves, foram se consolidando alicerces fundamentais, como a gestão mais autônoma da política monetária e um debate aberto, embora incompleto, sobre o imperativo de unir responsabilidade fiscal e justiça distributiva.

A taxa de juros nunca foi tão baixa —verdade que em boa parte devido à fraqueza da atividade econômica, mas não menos importante em sequência do movimento paulatino que se verifica desde a instituição do Plano Real, em 1994.

Mais recentemente, o teto para os gastos federais inscrito na Constituição facilitou o processo de convergência do custo do dinheiro para padrões mais civilizados.

O controle da inflação se revela persistente e bem-sucedido. A experiência democrática tem demonstrado ampla rejeição da sociedade a velhas políticas que toleram a frouxidão orçamentária —e a aceleração dos preços— em nome de supostos estímulos ao crescimento do Produto Interno Bruto.

São mais transparentes, hoje, as relações e as fronteiras entre o Banco Central e o Tesouro Nacional, que outrora se confundiam na execução de despesas e na emissão de dívida e moeda. Avizinham-se, inclusive, aperfeiçoamentos importantes nessa legislação.

Nas relações com o restante do mundo, recorrente fonte de instabilidade na história brasileira, a situação se mostra sólida, com amplas reservas em moeda forte e um regime de câmbio flutuante.

É notável que o agudo período de crise da década passada não tenha resultado em problemas nessa frente, com a economia mais integrada ao comércio e aos fluxos de investimento globais.

Sem estabilidade da moeda e solidez fiscal são efêmeros os resultados dos programas de combate à pobreza e à desigualdade —e constitui mérito nacional o desenvolvimento de um aparato de seguridade dos mais amplos entre os países emergentes.

É também admirável que o amadurecimento do regime macroeconômico tenha ocorrido em paralelo à consolidação dos instrumentos democráticos e republicanos.

Mecanismos de freios e contrapesos entre os Poderes evoluíram a ponto de deixarem pouco a dever aos observados em países desenvolvidos —assim o constata, regularmente desde sua posse, o presidente Jair Bolsonaro.

O Supremo Tribunal pode ser criticado por corporativismo e até falta de autocontenção, mas não subserviência. O Congresso, apesar de antigos vícios, já demonstrou altivez ante a volúpia do Executivo.

Do fortalecimento do Ministério Público à maior qualidade técnica e autonomia da Polícia Federal, há também ganhos notáveis na defesa de interesses difusos e no combate à corrupção —também com a ressalva de abusos. Poderosos, de fato, não podem mais assumir que estão acima da lei.

Não se pretende aqui ser panglossiano, muito menos ufanista. O país —sociedade e forças políticas— precisa mostrar mais ambição e senso de urgência no enfrentamento de mazelas crônicas.

No âmbito das ações de governo, urge sobretudo tratar da má qualidade da educação pública, obstáculo à ascensão social. A melhoria de serviços essenciais como saúde e segurança pública dependerá de mais eficiência na alocação de recursos orçamentários escassos.

Estão à vista de todos os males do patrimonialismo e da captura de Estado por grupos de interesse. Nas estruturas de tributação e despesa há mecanismos que concentram renda, mantêm a assimetria de acesso e perpetuam a pobreza.

Não se verá real progresso, contudo, com ofensivas voluntaristas ou, pior ainda, com o desprezo populista pelas instituições. Por falhas que por vezes pareçam, são elas que amparam as esperanças de recuperar o tempo perdido pelo país. Que 2021 e a nova década sejam melhores para todos.

editoriais@grupofolha.com.br

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