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Fernando Xavier

Advogado, petroleiro, gay e pai de menino

Divisão de tarefas parentais expõe estrutura machista que sobrecarrega mulheres

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Fernando Xavier

Sócio da área de Petróleo e Gás do Machado Meyer Advogados

Recentemente, recebi com surpresa o convite para palestrar em um evento promovido pelo escritório onde trabalho sobre o tema da parentalidade LGBTQIA+.

Falar em público não é algo novo para mim. Sou advogado, sócio da área de petróleo de um grande escritório de advocacia, então grande parte do meu trabalho envolve encontrar pessoas, tocar negociações e sustentar opiniões a quem for preciso.

O reconhecimento acumulado já resultou em não poucos convites para palestrar em grandes eventos, o que sempre fiz com muita tranquilidade. Falar sobre petróleo é parte do playground em que eu me acostumei a brincar.

Mas falar sobre mim é um terreno novo. Nunca falei em público sobre a experiência de ser gay e muito menos sobre ser pai adotivo de um garoto de 7 anos. Falar sobre os dois, ao mesmo tempo, dentro do escritório, para uma audiência de clientes e colegas, é algo que me dá calafrios. Ora, vão procurar o que fazer, minha vida não tem nada de interessante! Mas a paternidade recente talvez tenha já alterado algo em mim, pois topei o convite.

Bandeira do arco-íris, símbolo da causa LGBT, estendida por participantes de passeata na avenida Paulista
Bandeira do arco-íris, símbolo da causa LGBT, em passeata na avenida Paulista - Patrícia Santos - 25.jun.2000/Folhapress

Então eu fiz o que faço de melhor: estudei o tema. Tentei identificar, a partir de um olhar externo, que vivências poderiam carimbar minha paternidade com o selo LGBTQIA+. A primeira conclusão talvez frustre algumas pessoas, mas eu percebi que nossa família não é muito diferente.

Minha parentalidade continua sendo moldada por todos os outros aspectos mais chatos da minha personalidade, inclusive a advocacia e o petróleo. Muito antes de eu me assumir como um homem gay, aprendi a me assumir com orgulho como um homem chato.

Então a minha parentalidade é marcada por disciplina. Pobre do Pedro Nuno, que antes de aprender a andar de bicicleta já sabe o que é uma planilha. E é marcada também pelo perfeito look filhinho de papai. Camisa para dentro, cabelo na régua, meia alta esticadinha. O pacote completo.

Outras duas coisas são exatamente iguais a qualquer outra parentalidade. A primeira é que cansa muito! Ser pai ou mãe é, em qualquer configuração familiar, uma enorme responsabilidade. A segunda é que é uma experiência incrível! Tem sido uma aventura de vida, dando sentido a muitas coisas e nos reconectando à nossa infância.

Ao final, percebi que as principais diferenças dizem menos sobre a minha família e muito mais sobre a sociedade. Diferenças que sequer moram em nossa casa, mas que posso encontrar em qualquer esquina, como a homofobia —um elemento intruso que somos forçados a reconhecer e nos preparar.

Outra diferença é a inexistência de uma divisão predefinida de funções parentais, como dar banho ou levar para a natação. Tudo é distribuído com o meu marido na medida de nossas capacidades. Mas será que essa diferença diz mais sobre nós ou a estrutura machista que sobrecarrega as mulheres?

A verdade é que a parentalidade LGBTQIA+ pode ser tão diversa quanto qualquer outra. Existem elementos que diferenciam minha experiência como pai gay, mas todos eles são coadjuvantes perto do amor, do respeito e do compromisso mútuo.

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