Gabriel García Marquez duvidou de mim. Disse não acreditar que existia uma cabeça gigante de Santo Antônio no chão, longe do corpo degolado no alto de um morro. Depois de ver as imagens, perguntou que lugar absurdo é esse onde eu vivo. É o Ceará, eu disse, e lá tem muito mais. Dezoito anos depois tenho mais provas de que nas veias desse pedaço de mundo corre alguma água de delirar.
Imaginem se eu mostrasse a ele as fotos da cidade medieval que está sendo construída em Umirim, um município com menos de 20 mil habitantes no sertão cearense. São torres, ponte levadiça, calabouço, muralhas com ameias, não falta nada. O plano para essa homenagem ao medievo é sediar uma universidade.
As duas maiores esculturas em aço carbono do Brasil estão sendo construídas na Umirim medieval: um templário e um carcará, aquela ave de rapina que abriu as portas do canto de Maria Bethânia. Tão inusitado quanto simbólico, porque, de alguma maneira, os dois podem explicar muito sobre até onde pode ir a imaginação cearense.
Em Alto Santo da Viúva, outra cidade cearense, há um coliseu romano. O nome atual é só Alto Santo, morada de 17 mil habitantes que convivem com o souvenir de Roma. O que há por dentro é um campo de futebol e destoa tanto que já parece até combinar. Sem falar no Ioiô, um bode empalhado que foi candidato a vereador e bebia com poetas e políticos na praça do Ferreira.
No mesmo Ceará estamos prestes a receber uma sede do Instituto Tecnológico da Aeronáutica, tivemos uma santa beatificada pelo papa Francisco no ano passado (Benigna Cardoso) e um escritor, Stênio Gardel, que é o primeiro brasileiro a receber o prêmio National Book Awards, nos Estados Unidos, com seu livro "A Palavra que Resta" (Companhia das Letras).
Bendito seja o riacho por onde corre a nossa água de delirar.
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