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Cárcere medieval

Investigação no Ceará revela dinâmica de tortura contra presos em cinco estados

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Presos do Amazonas em posição usada no método de tortura chamado "procedimento" - Divulgação

Parece não haver limites para o desrespeito aos direitos humanos no sistema penitenciário brasileiro.

Em setembro de 2022, autoridades cearenses constataram que 72 presos haviam sido espancados por agentes de segurança no presídio de Itaitinga, em Fortaleza. Ainda mais grave, em parte dos casos, a fratura dos dedos das mãos foi utilizada como um método de tortura, revelando uma rotina de violência contra condenados que estão sob custódia do poder público.

A prática, chamada de "procedimento" pelos agentes, é recorrente nas prisões do estado, conforme a Folha noticiou. O preso é colocado no chão, com os dedos cruzados em cima da cabeça enquanto funcionários batem com um cassetete nas mãos. Lesões graves como quebra de ossos podem ocorrer, dependendo do impacto.

O crime não é exclusivo do Ceará. Segundo peritos do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, a técnica já foi documentada em ao menos outros quatro estados —Rio Grande do Norte, Roraima, Amazonas e Pará.

Todos eles têm em comum a presença da Força Tarefa de Intervenção Penitenciária, espécie de Força Nacional para resolução de rebeliões e reestabelecimento de disciplina em presídios.

Importante notar, também, como essa forma de tortura migrou de um estado para outro. De acordo com as investigações, um mesmo secretário de Estado teria estimulado o "procedimento" no Rio Grande do Norte e no Ceará.

Levantamento feito pelo jornal O Globo com dados de 2017 a 2022 mostrou que o Ceará é o estado com o maior número de casos de policiais réus por tortura (37 entre 194 no país) —à frente dos mais populosos Rio de Janeiro e São Paulo.

É urgente fortalecer as visitas em presídios por órgãos independentes como o Mecanismo Nacional, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério Público. Tampouco devem-se considerar como banais acusações de maus tratos contra pessoas sob custódia e, portanto, sob responsabilidade do Estado.

Punir criminosos que cometem tortura e estabelecer mecanismos de prevenção é vital para que atos medievais não sejam considerados procedimentos corriqueiros no sistema penitenciário.

Cumpre, ademais, reduzir a superlotação dos presídios, que hoje fornece mão de obra para facções criminosas. Rever a legislação sobre drogas, que hoje leva ao encarceramento de milhares de pequenos usuários, e dar ênfase a penas alternativas para criminosos menos perigosos são providências a serem tomadas a longo prazo.

editoriais@grupofolha.com.br

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