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Moacir Assunção

A Revolução de 1924: mais 100 anos de esquecimento?

Apesar das mortes e do sofrimento que causou, ela é chamada de 'Revolução Esquecida'

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A Revolução de 1924, a segunda rebelião tenentista da história do Brasil, que sucedeu ao episódio dos 18 do Forte, no Rio de Janeiro, é considerada a maior batalha urbana das Américas. Não é à toa.

Em 28 dias de combate, mobilizou 18 mil homens do governo legal de Arthur Bernardes e cerca de 6.000 rebeldes do Exército e da Força Pública (atual Polícia Militar), matando, de acordo com dados oficiais, 513 pessoas, ferindo 4.800 e causando um êxodo de quase 300 mil paulistanos —a população era de 700 mil— para outras cidades para fugir do bombardeio. O armamento utilizado —canhões, tanques de guerra e aviões—, de origem francesa, era o mais moderno da época.

Apesar de sua magnitude e do sofrimento da população, em especial dos operários pobres, moradores de bairros como Mooca, Belenzinho, Cambuci e Brás, boa parte imigrantes italianos e espanhóis, a revolta ainda mantém o apelido de "Revolução Esquecida".

militares uniformizados transportam pessoa envolvida por lençol branco
Civil ferido é transportado para o hospital militar em 7 de julho de 1924 - Reprodução

E, de fato, se compararmos o episódio com outros semelhantes, como as revoluções de 1930 e 1932, chegaremos à conclusão de que ela é, de fato, colocada debaixo do tapete da história.

Ao completarem-se 100 anos de sua eclosão, em um distante 5 de julho, a Revolução de 1924 permanece perdida nas brumas da história. Nem o governo do estado —cujos soldados se rebelaram sob o comando do major de Cavalaria Miguel Costa— nem a prefeitura, em que o então prefeito, Firmiano Pinto, cunhou a frase "serei o último habitante a deixar São Paulo, aconteça o que acontecer", se movimentam para promover algum evento para lembrar a efeméride. Somente a Assembleia Legislativa, por meio do deputado Maurici (PT), promoveram uma sessão solene para lembrar o episódio.

A sociedade civil tem feito algo. Na Mooca, um dos bairros mais atingidos pelo criminoso bombardeio terrificante —aquele cujo objetivo é aterrorizar a população, que viveu dias de Gaza naquela época—, a Universidade São Judas promoveu a série de palestras Centenário da Revolução de 1924. A Associação Comercial de São Paulo, que teve o então presidente, José Carlos de Macedo Soares, em luta para evitar o bombardeio indiscriminado à capital, o Instituto Histórico e Geográfico, a Associação dos Arquivistas Municipais e a Paróquia Santa Ifigênia, que ainda tem em seu prédio marcas de tiros, também promoveram eventos para lembrar a revolta.

A depender do poder público, ao que parece veremos cumprir a profecia do deputado João Simplício, aliado de Bernardes, que, em 1924, disse que a revolução seria esquecida por 100 anos.

Talvez ainda esteja em tempo de resgatar esta história para honrar a memória das vítimas, dois terços das quais civis, e responsabilizar os líderes políticos de então, em especial o presidente Arthur Bernardes e o governador do estado, Carlos de Campos, pelos crimes de guerra cometidos durante o conflito. As leis da época já previam a responsabilização de governantes por crimes contra a humanidade.

Como lembra o pensador irlandês Edmund Burke (1729-1797), um povo que não conhece sua história está condenado a repeti-la. E, acrescentemos, repetindo-a, errar mais uma vez.

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