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Murilo Cleto

Lei Paulo Gustavo é rara oportunidade a municípios

É possível verificar demandas, capacitar artistas e investir no cenário local

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Murilo Cleto

Historiador, músico e ex-gestor público cultural

É chover no molhado insistir nos benefícios do investimento estatal em cultura para a economia, as habilidades, as identidades e a saúde de uma sociedade. Estudos podem até divergir sobre a dimensão do seu impacto, mas é improvável que ele seja posto em xeque.

Nesse sentido, a Lei Paulo Gustavo (LPG), a exemplo do que foi a Aldir Blanc, representa uma oportunidade rara para o setor cultural em todo o país. Historicamente, o governo federal investe em cultura através de ferramentas de incentivo fiscal, como a Rouanet e a Lei do Audiovisual, que, apesar de importantes, acabam ficando distantes demais da maioria dos profissionais fora dos grandes centros urbanos e do radar das grandes produtoras.

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Brian Palacios, o Palhaço Bambine, do circo Moscou, em Itaquera (zona leste de SP) - Zanone Fraissat/Folhapress - Folhapress

Outras possibilidades também existem, é verdade, mas a realidade continua sendo basicamente a mesma para quem é do interior, sempre sub-representado entre os selecionados dos maiores editais de fomento.

Daí o grande mérito da LPG: descentralizar um recurso que é federal, distribuindo-o para estados e municípios, que podem verificar as demandas, capacitar artistas para concorrer e executar o investimento a partir de certames voltados para o cenário local.

Para muitos desses trabalhadores, pode ser a porta de entrada na formalização. A lei é positiva não apenas para os artistas, que recebem um incentivo sem precedentes para sua produção e ganham cancha para disputar também editais maiores, mas para o próprio Estado, que arrecada com impostos. Para a comunidade, também é uma chance de consumir arte produzida por gente próxima e com qualidade cada vez mais profissional.

As prefeituras, especialmente as do interior, também têm muito a ganhar. Para muitas delas, o montante injetado pela União agora é superior ao que sobra dos seus orçamentos anuais destinados ao setor, amplamente consumidos por gastos com pessoal, para investir efetivamente em novas ações. A notícia boa, antes da conclusão do seu processo, é que a adesão de municípios à Paulo Gustavo foi maior do que à Aldir Blanc: 98% hoje ante os 85% de 2020.

Entre o mundo ideal e o real, no entanto, há expressivas diferenças. Escassas são as divisões de cultura que dispõem de um departamento jurídico próprio para a elaboração dos editais, que, diante da falta de experiência ou da sobrecarga dos advogados e procuradores municipais, acabam sendo copiados de outras prefeituras ou elaborados por empresas contratadas para esse fim. No meio desse caminho, boa parte do diálogo eventualmente aberto com o setor cultural arrisca se perder.

Além disso, a predominância dos interesses políticos também pode induzir as gestões à irresistível tentação de oferecer valores menores de fomento para contemplar mais proponentes e assim dirimir inevitáveis insatisfações de uma demanda reprimida. O problema desse recurso é que das duas, uma: ou os artistas acabam tirando do bolso para produzir a contento ou a qualidade dessa produção estará condenada de antemão.

Que, a despeito de sua dura realidade e justamente em função dela, nossos gestores públicos atentem para a grandeza da Lei Paulo Gustavo e não a desperdicem.

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