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Leonardo Rolim

Já precisamos fazer uma nova reforma da Previdência?

De imediato, urge melhorar o gasto previdenciário, caso do auxílio-doença

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Leonardo Rolim

Ex-presidente do INSS e ex-secretário Nacional de Previdência Social (governo Bolsonaro), é consultor de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados

O gasto com o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) aumentou de R$ 797 bilhões, em 2022, para cerca de R$ 899 bilhões em 2023 —o que representou uma alta de 8,3%, descontada a inflação medida pelo INPC. Todavia, parte significativa desse aumento de despesa se deveu ao pagamento de precatórios extraordinário no final de 2023.

Se compararmos apenas as despesas com pagamento administrativo de benefícios (sem considerar as despesas judiciais e compensações a estados e municípios) de janeiro a julho de 2024 com o mesmo período de 2023, verifica-se um incremento de gastos de R$ 45,7 bilhões, com aumento real de 4,7%. Esse aumento é muito acima do limite de gasto do arcabouço (2,5% ao ano) e trata-se da maior despesa primária da União. Isso pode comprometer a nova regra fiscal ou representar a necessidade de forte compressão das demais despesas da União. Por isso, o tema tem chamado a atenção da equipe econômica do governo e dos principais economistas do mercado.

Segurados do INSS fazem formam fila em frente à agência da rua Xavier de Toledo, na região central de São Paulo - Rivaldo Gomes -26.out.16/Folhapress

Parte substancial desse incremento de despesas se justifica pelo aumento real do salário mínimo, que afeta cerca de 42% da despesa do RGPS, e outra pelo crescimento natural das despesas previdenciárias em função do envelhecimento da população. Porém, grande parte do aumento dos gastos se deve a dois fatores: a alta desproporcional da concessão de benefícios por incapacidade temporária, o auxílio-doença, e a baixa efetividade das medidas de controle de fraudes.

O programa de enfrentamento à fila do INSS teve o mérito de reduzir o tempo de espera do segurado. Contudo, isso provavelmente aconteceu às custas de aumento gigantesco da concessão indevida de benefícios: a quantidade de benefícios de incapacidade temporária emitidos cresceu de cerca 970 mil, em setembro de 2023, para 1,7 milhão em junho de 2024. O aumento foi de 74,8%, algo nunca visto na Previdência.

Isso se explica pelo enorme aumento no número de requerimentos desse benefício. A título de exemplo, em maio de 2024 houve cerca de 588 mil requerimentos de auxílio-doença, enquanto em junho de 2023 foram cerca de 345 mil —alta de 70%. O que ocorreu na saúde do trabalhador brasileiro nesse período para justificar tamanho incremento de requerimentos para esse benefício?

A concessão por atestado médico é salutar para trazer comodidade ao cidadão e para ampliar a capacidade e rapidez de atendimento da perícia, mas não é o instrumento mais adequado para a redução da fila. Em 2019 ocorreu esforço similar de redução da fila, quando caiu para cerca de 200 mil; ou seja, menor que está atualmente. Naquela época, a fila foi reduzida pagando bônus aos peritos, uma espécie de hora extra. Em vez de ampliar o número de benefícios emitidos, foi reduzido. Estimo que o modelo atual de concessão levará a um gasto adicional de R$ 13 bilhões por ano em vez de uma economia de R$ 11 bilhões, conforme anunciado pelo governo quando implantou esse modelo.

Para evitar as fraudes, sugiro que os atestados sejam enviados pelos médicos e hospitais diretamente no sistema do INSS; que o perito médico realize uma análise de mérito e não apenas de conformidade do atestado e, quando não se sentir seguro para conceder o benefício, seja agendada uma perícia remota ou mesmo presencial; e que as prorrogações de benefícios sempre sejam por meio de perícias.

Há um rol de outras medidas que podem ser tomadas para reduzir despesas indevidas na Previdência e em outros gastos sociais que poderiam, após serem totalmente implementadas, gerar economia de cerca de R$ 35 bilhões por ano, conforme estudo que publiquei na página da Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. Estou otimista com a dedicação do governo em atacar esse problema.

Entendo que apenas na próxima década precisaremos fazer uma nova reforma previdenciária, em função da aceleração da transição demográfica. Em outro artigo pretendo profundar-me mais no que considero que será necessário. Agora, o que precisamos é avançar na melhoria da qualidade do gasto previdenciário.

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