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Questões de Ordem: Falar e receber
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MARCELO COELHO
COLUNISTA DA FOLHA
A discussão de ontem no Supremo foi viva e interessante, incidindo sobre réus nem tão interessantes assim. Tratava-se de julgar, apenas pelo crime de lavagem de dinheiro, os deputados petistas Paulo Rocha, João Magno e Professor Luizinho, além do ex-ministro dos Transportes Anderson Adauto (do PL, na época).
Luizinho foi absolvido até mesmo por Joaquim Barbosa, uma vez que não há prova de que nem sequer tenha visto a cor do dinheiro. Quanto a Paulo Rocha, João Magno e Anderson Adauto, comprovou-se que receberam pelo esquema já conhecido --os cheques de Marcos Valério, descontados no Banco Rural por meio de interposta pessoa.
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Marco Aurélio Mello voltou a perguntar se esse procedimento pode ser considerado lavagem de dinheiro ou se é parte integrante do próprio ato de corrupção.
Todo ato de corrupção envolve algum tipo de ocultamento. É coisa que se faz às escondidas. Algo além disso teria de ser feito para configurar a lavagem de dinheiro.
Mas a lei de lavagem de dinheiro inclui, na descrição do crime, o verbo "ocultar", quando se refere ao uso que se faz de recursos originados de delito anterior.
Para Luiz Fux, a lei de lavagem é propositalmente vaga, falando de "ocultar", entre outras coisas, para cercar o criminoso de todos os modos possíveis. A distinção entre simples corrupção e lavagem dependeria da análise de cada caso concreto.
Quem se exaltou no meio do voto de Fux foi Dias Toffoli. Ele já tinha condenado o deputado pepista José Borba por corrupção e em seguida por lavagem. Mas como imaginar que um réu absolvido do crime de corrupção, como Anderson Adauto, possa ser condenado por lavagem? Como se lava o dinheiro se o crime antecedente não foi praticado?
Havia, é claro, os desvios do Banco do Brasil que engordaram o caixa de Marcos Valério. Os réus poderiam saber disso?
Sim, deviam saber. Não, poderiam não saber. Não sabiam, mas poderiam imaginar. Seria o caso do "dolo eventual". Admitir "dolo eventual" no crime de lavagem seria alarmante, advertiu Marco Aurélio.
Ele citou uma hipótese extrema. Imagine-se o advogado de um criminoso. Poderia ser acusado de lavagem de dinheiro ao receber seus honorários? Seria perfeitamente possível supor que esse advogado imaginasse que o dinheiro veio de algum crime.
Pior ainda: nesse caso, com o advogado recebendo seu pagamento por vias oficiais, numa conta em banco, haveria uma lavagem até mais bem-feita do que os saques em dinheiro vivo. Cadeia para ele?
O debate ainda teve uma rápida troca de argumentos entre Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa.
Os deputados petistas, disse Cármen Lúcia, pediram dinheiro a Delúbio Soares. Falaram, afinal, com quem deveriam falar. Onde estaria a lavagem?
Falaram com quem deveriam falar, respondeu Barbosa. Mas receberam de quem não deveriam receber. E só procuraram dinheiro com Delúbio, acrescentou em outro momento, porque sabiam do esquema criminoso.
Não. Não há certeza de que soubessem. Não se condena por suposição, insistiu Toffoli, ao lado de Lewandowski, Marco Aurélio, Rosa Weber e Cármen Lúcia. Para empatar, ou não, faltam três votos na segunda-feira.
P.S.: A frase do ministro Ayres Britto sobre o caixa dois é de a tese "toca os debruns da teratologia administrativa", e não "orça os debruns", como foi escrito na coluna de ontem.
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