Descrição de chapéu Eleições 2018

Atrito com mídia deve crescer na eleição, dizem analistas

Episódios de ataques à imprensa, vindos de líderes políticos, vêm se acumulando

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São Paulo
Deputado Jair Bolsonaro,
O deputado federal Jair Bolsonaro, pré-candidato à Presidência - Ricardo Borges 10.ago.2018 /Folhapress

Com a Folha o pré-candidato à Presidência Jair Bolsonaro já disse que não fala. "Se você perguntar [do jornal], vou falar 'fake news, passe pra outra'", disse, ao ser questionado se, como presidente, teria o direito de escolher a que mídia atenderia.

Seletividade e trato hostil com a imprensa devem recrudescer neste ano eleitoral, segundo especialistas consultados pela Folha –e não são monopólio do deputado.

A cinco dias do último Natal, Lula recebeu jornalistas para um café da manhã no instituto que leva seu nome. O jornal "O Globo" não foi convidado (o Instituto Lula diz que chamou o "Valor", também parte do Grupo Globo).

Três dias depois, o MST barrou fotógrafos e repórteres que não fossem "imprensa amiga" na inauguração de um campo de futebol em Guararema (SP), em ato com o ex-presidente e Chico Buarque.

Um mês depois, horas antes de ser condenado a 12 anos de prisão e ver as chances de voltar ao Planalto desidratarem, Lula fustigou a mídia "mentirosa" e "covarde".

O prefeito João Doria (PSDB) já foi às redes sociais para atacar, nominalmente, autores de reportagens que o desagradaram.

"As fustigadas vêm tanto da esquerda quanto da direita", diz Eugenio Bucci, professor do curso de jornalismo da USP. Segundo ele, os ataques fortalecem "discursos autoritários que mesclam um amontoado de causas aparentemente políticas nacionalismos, esquerdismos messiânicos, militarismos etc. –, com recursos de convencimento tipicamente religiosos, como fundamentalismos, idolatrias fanáticas de líderes que estariam acima do bem e do mal e por aí vai", afirma.

Erra quem vê a escalada da hostilidade entre mídia e agentes políticos "tendo em vista apenas o cenário nacional", diz Bucci, que presidiu a Radiobras no governo Lula.

Em miúdos: virou moda, e nesse sentido Donald Trump lançou tendência.

"Nunca na história dos EUA um presidente tinha usado uma retórica tão hostil ao jornalismo e à própria liberdade de imprensa", diz Rosental Alves, professor da Universidade do Texas e diretor do Knight Center para o Jornalismo nas Américas.

"Durante a campanha, Trump apontava para os repórteres nos comícios ao criticá-los, praticamente incitando a multidão a hostilizá-los também. Em algumas ocasiões, os repórteres tiveram que sair escoltados dos comícios."

O caso brasileiro tem uma "má novidade", diz Marcelo Rech, presidente da ANJ (Associação Nacional de Jornais) e vice-presidente do Fórum Mundial de Editores.

O "universo paralelo criado por redes sociais cada vez mais polarizadas" energiza radicalismos de todas as matizes ideológicas e catalisa "linchamentos virtuais que, na prática, têm o mesmo objetivo dos líderes radicais: apagar a pluralidade, humilhar críticos e silenciar vozes discordantes", segundo Rech.

VETO

Em novembro, o MBL (Movimento Brasil Livre) vetou a entrada, em seu 3º Congresso, desta repórter da Folha –que pagou pelo ingresso e foi informada, pelo WhatsApp, que o valor seria estornado de seu cartão, pois "o povo ficou chateado" com reportagem sobre o evento.

Líderes do grupo têm fome eleitoral. Kim  Kataguiri, por exemplo, almeja a Câmara. Mas o evento em questão foi privado. Por que o MBL deveria, então, deixar entrar jornalistas que o desagradam?

"Os atores políticos com ou sem cargos públicos podem dar entrevistas a quem eles quiserem, mas é óbvio que a discriminação descarada contra a mídia independente ou mesmo oposicionista é ética e moralmente errada", diz Rosental Alves.

Linha de raciocínio similar tem Bucci. "São agentes privados e têm, portanto, o direito de escolher com quem falam ou com quem deixam de falar. Contudo, quando agem dessa forma, dão um péssimo sinal sobre o caráter público de suas propostas ou de suas vocações políticas."

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