Reitor apontou falhas em investigação 

Um mês antes de ser preso, Luiz Carlos Cancellier indicou irregularidades na conduta do corregedor da UFSC

Wálter Nunes
São Paulo

Um mês antes de ser preso pela Operação Ouvidos Moucos, que apura desvios no programa Educação à Distância (EaD) na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), o então reitor Luiz Carlos Cancellier enviou ofício à Controladoria-Geral da União (CGU) apontando falhas na conduta do corregedor-geral da universidade, Rodolfo Hickel do Prado, em duas investigações.

O depoimento de Prado à Polícia Federal foi o motivo central da prisão de Cancellier, em 14 de setembro, acusado de obstruir uma investigação na UFSC.

O reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier Olivo, de camisa clara, em pé apoiado no espaldar da cadeira.
O reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier Olivo, que se suicidou após prisão na Operação Ouvidos Moucos - Pipo Quint / Agecom

A Ouvidos Moucos é comandada pela delegada Erika  Mialik  Marena, que liderou a Lava Jato, em Curitiba. Ela pediu a prisão do reitor por cinco dias e seu afastamento da UFSC, o que foi aceito pela juíza Janaína  Cassol. Ele foi solto no dia seguinte pela juíza Marjorie  Freiberguer, que disse não haver provas de ameaça à investigação. A restrição de entrar na UFSC foi mantida.

No dia 2 de outubro o reitor se jogou do sétimo piso de um shopping de Florianópolis. Levava um bilhete no bolso: "A minha morte foi decretada quando fui banido da Universidade!!!". Ele não é apontado como suspeito de desvios.

No documento enviado à CGU, que fiscaliza a universidade, Cancellier justifica a retirada de dois processos que tramitavam na corregedoria. O primeiro dizia respeito à expulsão de um aluno. O reitor aponta que a norma interna determina que "punições disciplinares a discentes são processadas e julgadas nos colegiados de curso".

A outra investigação era referente à concessão de bolsas de estudo pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), do Ministério da Educação, para o EaD, caso investigado em sigilo pela PF.

Cancellier diz que "a avocação [ato de trazer para a reitoria] ocorreu em razão de obstáculo à solução da questão investigada, com prejuízo a esta universidade".

Ele relata que Prado requisitou documentos à Capes e se reuniu com seu presidente. A Capes também montou uma comissão para apurar o caso e solicitou ao corregedor informações. Prado recusou-se a repassar dados, argumentando sigilo. Cancellier protestou. "O compartilhamento de informações sigilosas carrega consigo o dever de sua manutenção", disse.

O reitor alegou que "desse modo (Prado) deixou de, sem razão legítima, auxiliar no processo de elucidação de fatos relevantes e prejudica investigações em curso. Essa decisão do corregedor-geral produziu prejuízo moral a esta universidade, visto que há interesse na elucidação da fraude". A Capes, diz ele, "encontrou algumas irregularidades, em processo de solução, mas nenhuma com respeito ao objeto da denúncia".

Sem as informações solicitadas ao corregedor, a Capes suspendeu o repasse de verbas para dez cursos da UFSC. Para o reitor "a condução do procedimento pelo corregedor-geral desta instituição, por outro lado, revelou-se prejudicial ao interesse da verdade".

O ofício de avocação assinado por Cancellier é a única prova documental usada por Erika Marena para justificar o pedido de prisão e afastamento de Cancellier. O reitor também rebateu a acusação de que havia problemas na estrutura da corregedoria.

"Atualmente a estrutura física é compatível com suas finalidades. A estrutura de pessoal encontra-se realmente deficitária, mas isso se dá provavelmente em razão do desentendimento dos servidores com o corregedor-geral", diz.

"Dois dos três corregedores pediram exoneração pouco tempo depois de assumirem a função. Duas servidoras pediram remoção. Outros dois, sem que lhe fossem deferidas as remoções pelo corregedor-geral, exoneração do cargo efetivo", diz o ofício.

Em nota, a CGU disse que os fatos encontram-se em apuração e as informações são mantidas em sigilo. A PF não se manifestou.

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