Exposição em São Paulo relembra trajetória de dom Paulo Evaristo Arns

A atuação contra a ditadura militar é destaque na mostra no Centro Cultural dos Correios

Géssica Brandino
São Paulo

As lutas e causas defendidas por dom Paulo Evaristo Arns em seus 95 anos de vida poderão ser conhecidas na exposição aberta no último sábado (21) no Centro Cultural dos Correios de São Paulo, no vale do Anhangabaú, centro da capital .

Respeitado por pessoas de diferentes origens, dom Paulo faleceu em dezembro de 2016 com o desejo de ser lembrado como “amigo do povo”. Ao longo da vida, foi chamado de cardeal da liberdade, bispo dos oprimidos, cardeal dos trabalhadores, bispo dos presos, bom pastor, cardeal da cidadania e guardião dos direitos humanos.

A atuação contra a ditadura militar é destaque na mostra. Uma instalação reproduz a cela em que presos políticos foram torturados durante o período. Outra, a vala clandestina encontrada no cemitério de Perus, em São Paulo.

“Dom Paulo foi talvez a figura mais importante da igreja católica nesse período. Tinha o cargo de cardeal e se utilizava do poder que tinha para estar na vanguarda de várias ações”, destaca a jornalista Evanize Sydow, uma das curadoras da mostra e biógrafas do cardeal emérito.

Ela conta que em 1971, quando membros da igreja começaram a ser presos, dom Paulo mandou fixar a notícia na porta de todas as paróquias e repassou a informação para veículos da imprensa, de dentro e fora do Brasil. Na sequência, ele reuniu os bispos de São Paulo e juntos redigiram o “Testemunho da Paz”, primeiro documento público da igreja brasileira a denunciar as violações da ditadura no país.

“Dom Paulo tinha atitudes que estavam além do que a igreja estava fazendo. Ele telefonava diretamente para governadores e políticos, na condição de cardeal, e não tinha o que o segurasse”.

Com a Comissão Justiça e Paz, fez da igreja em São Paulo ponto de acolhida para perseguidos políticos na América Latina e seus familiares. 

Margarida Genevois foi seu braço direito nesse trabalho. Numa época em que a igreja dava pouco espaço para as mulheres, dom Paulo se cercou do trabalho delas. Como assessora, contava com a biblista Ana Flora Anderson. 

Outro destaque da mostra é a réplica de 15 metros da Catedral da Sé, palco dos cultos políticos promovidos por ele. Foi lá que o cardeal presidiu o culto ecumênico em 1975, quando do assassinato do jornalista Vladimir Herzog, um dos atos públicos mais significativos da luta contra o regime.

Era um apoiador de causas e movimentos sociais. Após receber o Prêmio Niwano da Paz no Japão, dom Paulo conversou com pessoas que vivem na rua e soube do desejo delas de ter um lugar para rezar sem sofrer discriminação. Com o dinheiro dado pelo prêmio, criou a “Casa de oração do povo da rua”. O local se tornou referência e recebeu um solidéu do papa Francisco, peça que estará na exposição.

O frade franciscano incentivou muitos jovens a entrar na política. Evanize conta que Leonel Brizola o consultava muito e que dom Paulo sugeriu a ele o nome do PDT, Partido Democrático Trabalhista. Quando se aposentou como cardeal, em 1998, em sua missa lá estavam o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula (PT) e os hoje presidenciáveis Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT).

“O próprio Paulo Maluf também. Apesar de estarem em lados opostos, ele sempre fazia questão de ir lá, nem que fosse só para aparecer no dia seguinte no jornal numa fotinha ao lado de dom Paulo”, afirma Evanize.

O engajamento de dom Paulo estava também dentro dos campos de futebol. “Corintiano graças a Deus” foi o livro que escreveu para registrar seu amor ao time. “Foi um grande apoiador da democracia corintiana”, conta ela. 

DOM PAULO EVARISTO ARNS: 95 ANOS
Quando
terça a domingo, das 11h às 17h. Até 23/9
Onde Centro Cultural dos Correios de São Paulo (av. São João, s/nº, centro, tel. (11) 2102-3690)
Quanto grátis

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