Bolsonaro tenta se docilizar para diminuir alta taxa de rejeição

Presidenciável quer se descolar de seu histórico de tensão com negros, mulheres e comunidade LGBTI

Guilherme Seto Talita Fernandes
São Paulo e Brasília
BARRETOS, SP BRASIL. 25-08-2018. o candidato a presidencia Jair Bolsonaro visita a cidade de Barretos e a festa do peão de Barretos.  ( Foto Joel Silva / Folhapress)   - Folhapress

Em sua trajetória parlamentar, o deputado Jair Bolsonaro (PSL) encontrou na radicalização a fórmula para atrair os holofotes políticos. Em performances na Câmara e em programas de televisão, ele cunhou ao longo dos anos as frases controversas que transformaram-no em antagonista de movimentos ligados a negros, mulheres e LGBTI (lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais e intersexos).

Alçado ao centro do palco nas eleições de 2018, Bolsonaro, no momento mais decisivo de sua carreira, deverá abandonar as tintas carregadas que o trouxeram até aqui e, em um possível segundo turno, investirá na autodesconstrução, rumo ao centro.

Trata-se de estratégia para tentar estancar sua alta taxa de rejeição. Levantamento do Datafolha divulgado no sábado (6) mostrava que 44% dos eleitores diziam que não votariam em Bolsonaro de jeito nenhum. No caso de Fernando Haddad (PT), a taxa estava em 41%.

Em um segundo turno, Bolsonaro multiplicará seu tempo de televisão --de oito segundos, no primeiro turno, para cinco minutos. No horário eleitoral, os espectadores verão um candidato mais parecido com Haddad, que também se movimenta em direção ao centro e tentará cada vez mais se vender como uma figura moderada.

Na televisão, Bolsonaro dirá cada vez mais que nunca teve nada contra negros, homossexuais ou mulheres e que suas frases foram tiradas de contexto ou foram fabricações de parte da imprensa.

Laura, 7, terá papel importante na campanha do pai, que destacará o fato de ela ser mulher, com "sangue negro" e também nordestino. O sogro do capitão reformado, chamado por ele de Paulo "Negão", é cearense e mora em Crateús, no interior do estado.

Dessa forma, a filha --mote da fala de Bolsonaro sobre a "fraquejada" no clube Hebraica, no Rio-- também fará parte da estratégia do candidato de acenar ao Nordeste.

Obedecendo atitude forjada pelo senador Magno Malta (PR-ES), um dos aliados mais próximos de Bolsonaro, a campanha continuará a concentrar esforços nessa região, tentando tirar votos tradicionalmente petistas. "A surpresa virá do Nordeste", tem repetido a claque bolsonarista.

A docilização de Bolsonaro e a tentativa de seduzir nordestinos decepcionados com o PT tem produzido resultados imprevistos de saída.

Na quinta-feira (4), o candidato, que recentemente falou em "metralhar a petralhada", lamentou a prisão do ex-presidente Lula (PT).

"Tinha tudo para ser um grande presidente, um homem que ia deixar marcado na história, que foi o Lula, mas resolveu enveredar por outro caminho. Eu lamento o Lula estar nessa situação preso, mas ele está colhendo o que plantou", disse.

No mesmo dia, em entrevista à TV Record, parabenizou o ex-petista Antonio Palocci por contribuir com as investigações da Polícia Federal por meio de delação.

"Palocci já vinha colaborando. Ele foi um homem muito próximo do governo, ele conta as entranhas do poder. Não tem como ele fugir da verdade. Parabéns ao Palocci. Quem não erra como ser humano? Ele tenta corrigir erros com essas ações", afirmou o militar.

Às mulheres, ele dedicará o discurso da segurança. O argumento está traçado: buscará a empatia falando dos filhos delas, que elas aguardam apreensivas que cheguem de "eventos festivos".

O histórico de frases preconceituosas do candidato e de seus filhos direcionadas a homossexuais não permite uma aproximação imediata e convincente.

Bolsonaro já declarou que bateria em gays se os visse se beijando na rua e que preferia que seu filho morresse do que se aparecesse "com um bigodudo aí", entre dezenas de invectivas no mesmo tom.

Na quinta (4), em entrevista à Rádio Jornal do Commercio, de Pernambuco, o candidato afirmou que "os homossexuais serão felizes se eu for presidente".

Retomando a cruzada contra o "kit gay", material anti-homofobia que teve distribuição nas escolas cancelada após críticas, ele agora diz que os pais homossexuais também são contra a "sexualização" das crianças nas escolas.

Aliados de Bolsonaro ponderam, no entanto, que o discurso do candidato pode voltar às origens caso seu eleitorado mais fiel se incomode com a pacacidade do "Jairzinho paz e amor".

Nas redes sociais, foram negativas as reações aos elogios a Lula e Palocci, o que preocupou o núcleo da campanha.

Eles também entendem que no segundo turno começa nova eleição a partir do zero. Diante disso, creem que os eleitores vão exigir mais propostas e que parte do conteúdo que será aplicado em eventual governo precisará ser apresentado com mais detalhes.

Nesse cenário, brilha a estrela do economista Paulo Guedes, o "posto Ipiranga", que deverá instruir Bolsonaro sobre o que falar para agradar os interlocutores do mercado.

No mesmo movimento deverá continuar apagada a figura do general Hamilton Mourão (PRTB), vice da chapa, cujas críticas ao 13° salário e às famílias só de mães e avós ("fábricas de desajustados") renderam crises de imagem que aborreceram o titular da coligação. Bolsonaro pediu para que o general "ficasse quieto" até segunda ordem. 

Neste sábado (6), no entanto, Mourão disse uma nova frase polêmica, ao chegar ao aeroporto de Brasília. "Meu neto é um cara bonito, viu ali? Branqueamento de raça", declarou, a jornalistas que o aguardavam. 

Para o segundo turno, o PSL contratou uma empresa se marketing para fazer os vídeos da campanha na televisão, e já existe uma estrutura de estúdio para gravações montada na casa de Paulo Marinho, suplente de Flávio Bolsonaro, candidato ao Senado, na zona sul do Rio de Janeiro.  

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