Descrição de chapéu Eleições 2018

Em 2016, PT lamentou não ter ampliado seu controle da sociedade

Em autocrítica durante o impeachment, partido fala em criar força política, social e cultural para dirigir o país

Fernando Canzian
São Paulo

​O PT e seu candidato a presidente, Fernando Haddad, têm se recusado a fazer uma autocrítica mais direta dos erros do governo Dilma Rousseff e sobre posicionamentos que não ajudam o partido a conquistar os eleitores de que precisa no centro.

​Mas um movimento interno de revisão foi feito durante o processo de impeachment da ex-presidente em 2016.

Ele foi, no entanto, na direção oposta, do que o partido deixou de fazer e onde errou ao não ter aprofundado teses mais à esquerda e mecanismos que pudessem ampliar o controle da sociedade.

Isso passava pelo aumento da influência do Estado sobre algumas instituições, como Polícia Federal, Ministério Público e Forças Armadas, além de uma maior “democratização” dos meios 
de comunicação.

Aprovada pelo Diretório Nacional do PT em 17 de maio de 2016 (um mês após a votação da abertura do processo na Câmara dos Deputados), a chamada Resolução sobre Conjuntura afirma que o partido errou em várias frentes:

1) ao priorizar “o pacto pluriclassista que permitiu a vitória de Lula em 2002”;

2) ao não “impedir a sabotagem conservadora nas estruturas de mando da Polícia Federal e do Ministério Público”;

3) ao ter deixado de “modificar os currículos das academias militares e de promover oficiais com compromisso democrático e nacionalista”;

4) ao não “redimensionar sensivelmente a distribuição de verbas publicitárias para os monopólios da informação”.

Deixando de tomar essas e outras ações no mesmo sentido, o PT teria aberto o flanco, segundo o documento, para o desfecho de “uma ofensiva planificada” ao redor de uma “conspiração golpista” marcada “pela fraude e a manipulação”.

Nesta campanha eleitoral, em que segmentos do mercado cobram do PT uma postura mais atualizada, a resolução de 2016 criticava também a “subordinação aos centros imperialistas” que via no projeto “Ponte para o futuro” do vice-presidente Michel Temer.

Nessa visão, os “golpistas” buscavam atrair “fluxos privados de investimento, locais e internacionais, conforme reza a antiga cartilha neoliberal”.

Um bom resumo do documento talvez esteja no trecho em que o PT afirma que “a hegemonia dos trabalhadores no Estado e na sociedade” não depende apenas de administrações bem-sucedidas.

“Mas da concentração de todos os fatores na construção de uma força política, social e cultural capaz de dirigir e transformar o país.”

Para o cientista político Marcus Melo, da Universidade Federal de Pernambuco, o documento do PT seria uma “peça canônica do iliberalismo”. Nela, diz, o partido mostraria sua “dificuldade histórica em abraçar a democracia representativa como único caminho possível”.

Já o cientista politico Marco Antonio Teixeira, da FGV-SP, considera a resolução de 2016 uma “pérola” que remete aos anos 1980 no que se refere a “uma conspiração norte-americana” contra os governos latino-americanos.

Na época da produção do documento, o PT era presidido por Rui Falcão, agora deputado federal eleito mais votado do partido em São Paulo.

Procurado, ele não retornou os contatos da reportagem.

 

Documento do PT sobre processo de impeachment faz autocrítica partidária
Documento do PT sobre processo de impeachment faz autocrítica partidária - Reprodução

1) Apesar de acusar um “golpe parlamentar” que “rasgou a Constituição” com a ajuda de “velhas oligarquias, mídia monopolizada e do grande capital”, o impeachment seguiu a Constituição e teve supervisão do STF. Na Câmara, o pedido foi aprovado por 367 votos a 137. No Senado, por 55 a 22. 

2) Uma “política externa imperialista” orientava as reformas do governo Temer e o PT era contra elevar os investimentos com capital nacional e estrangeiro em detrimento do consumo. Uma das críticas ao modelo petista foi a dependência do crescimento no consumo, que aumentou o dobro do PIB, e acabou pressionando a inflação.

3) Em 2016, a Lava Jato já investigava havia dois anos contratos da Petrobras firmados nos governos do PT. Ex-diretores da estatal, doleiros, ex-deputados de vários partidos e empreiteiros acabaram presos. Aécio Neves (PSDB), adversário de Dilma em 2014, hoje é réu. O fortalecimento das estruturas de combate à corrupção se acentuou com o PT.

4) As “classes dominantes” reagiram à melhora no “equilíbrio distributivo”; e o aumento do bem-estar por meio de “administrações bem-sucedidas” não foi suficiente para garantir a “hegemonia” dos trabalhadores sobre o Estado. O ideário pregava a “concentração de todos os fatores” em uma “força política, social e cultural capaz de dirigir e transformar o país”.

5) Foi um “equívoco político” abandonar reformas e não ter havido a “democratização dos meios de comunicação”, já que eles teriam contribuído, com a Lava Jato, na “guerra de desgaste contra dirigentes petistas”. Haddad diz agora que é preciso limitar a chamada propriedade cruzada de diferentes mídias em uma única empresa de comunicação.

6) Havia uma “sabotagem conservadora” da Polícia Federal e do Ministério Público contra o partido, que se “descuidou” da necessidade de modificar os currículos das academias militares. O PT já havia criticado alas mais antigas das Forças Armadas que se posicionaram contra a Comissão Nacional da Verdade, que investigou crimes da ditadura.

7) O documento também fala em “redimensionar sensivelmente a distribuição de verbas publicitárias para meios de comunicação”. Durante os governos petistas, vários sites e blogs simpáticos ao Partido dos Trabalhadores receberam verbas —houve repasses de R$ 5,1 milhões em 2015, por exemplo, a 13 meios desse tipo listados pela Folha.

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