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Com 13º do Bolsa Família, Bolsonaro alcança áreas com forte rejeição no país

Novo benefício atingirá sobretudo o Nordeste, onde mandato do presidente tem pior avaliação

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Brasília e São Paulo

​A concessão do 13º pagamento para beneficiários do Bolsa Família, a ser anunciada oficialmente nesta quinta-feira (11) por Jair Bolsonaro (PSL), representa um agrado direto ao público mais crítico ao presidente.

Promessa de campanha, a medida atingirá principalmente áreas que menos votaram em Bolsonaro na última eleição e onde a popularidade de seu governo também está mais baixa nos primeiros cem dias de mandato —especialmente na região Nordeste.

A concessão do 13º no Bolsa Família terá um custo anual de R$ 2,6 bilhões, mas, por outro lado, não haverá reajuste no valor do benefício neste ano.

 

Ela beneficia diferentes áreas do país que têm em comum a população de baixa renda e será oficializada após Bolsonaro registrar a largada com pior avaliação entre presidentes em primeiro mandato —segundo pesquisa Datafolha, 30% consideram a gestão ruim/péssima, 32%, ótima/boa, e 33%, regular.

No Nordeste, Bolsonaro teve na eleição 30% dos votos no segundo turno, contra 70% de Fernando Haddad (PT).

É justamente nessa região em que a presença do Bolsa Família é mais marcante —ao menos 12% da população recebe esse benefício. No Sudeste, que deu grande vantagem ao presidente na eleição, são 4% de beneficiários.

O Nordeste também dá a pior avaliação a Bolsonaro após três meses de mandato. Pelo Datafolha, a desaprovação ao governo nessa região ficou em 39% —no Sul, apenas 22%.

O investimento no Bolsa Família tem potencial de melhorar a imagem do presidente também nas capitais —onde ele conseguiu boa base na campanha, mas com periferias que deram menor votação ao então candidato do PSL.

Em São Paulo, por exemplo, Bolsonaro obteve seus melhores desempenhos eleitorais nos bairros mais ricos, como Indianópolis, Jardins e Santana. E chegou a perder nos mais carentes, como Capão Redondo, Grajaú e Cidade Tiradentes —locais com mais potenciais beneficiários do programa Bolsa Família.

Outro efeito positivo para Bolsonaro pode ser a tentativa de capturar, mesmo em parte, uma bandeira que deu ajuda ao PT a obter seguidas vitórias em eleições presidenciais.

Pesquisas já mostraram forte relação entre ser beneficiário do programa e a maior probabilidade de votar no PT. Por exemplo, uma feita por Elaine Licio, Lucio Rennó e Henrique Castro, da UnB (Universidade de Brasília), que analisaram a vitória de Lula em 2006.

Outro trabalho, de Sergio Simoni Junior, da USP, mostrou efeito parecido do Bolsa Família até em pessoas que não recebiam pelo programa, mas conheciam algum beneficiário. O pesquisador verificou essa relação nas vitórias do PT em 2006 e 2010.

Na última terça (9), em evento público, Bolsonaro se apresentou como defensor do Bolsa Família, embora tenha complementado que “o que tira o homem e a mulher das questões difíceis que se encontram é o conhecimento”. Antes de ser candidato à Presidência, ele havia classificado o programa como “caridade”.

Pelo Bolsa Família, 14,1 milhões de famílias em situação de pobreza ou extrema-pobreza recebem recursos do governo. O valor médio do benefício distribuído é de R$ 186,94 mensais, segundo dados de março, e a previsão orçamentária para o programa em 2019 é de R$ 30 bilhões.

 

Desde que foi eleito, Bolsonaro promete pente-fino no programa, alegando que há desvios na iniciativa.

 

O dinheiro para pagamento do 13º, por exemplo, viria de irregularidades que ele afirma ter identificado durante esse maior escrutínio. Só com a revisão de pagamentos do auxílio-doença, a economia chegaria a R$ 15 bilhões, diz Osmar Terra, ministro da Cidadania.

Nos dois últimos anos, a quantidade de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família caiu de 17 milhões para os atuais 14,1 milhões.

Também para sustentar a concessão do 13º, Osmar Terra afirma que a correção anual do valor do benefício foi suspensa neste ano e, em 2020, vai depender do desempenho da economia.

A troca, mesmo assim, indica um aumento no montante a ser recebido pelos beneficiários do Bolsa Família em 2019.

Numa projeção do 13º diluído entre os 12 pagamentos mensais, há um acréscimo de R$ 16 no valor médio pago por mês. Se fosse aplicada a inflação (INPC) acumulada nos últimos 12 meses, ele seria de menos de metade (R$ 7,5).

O pagamento adicional no programa parece encontrar apoio até na oposição.

O deputado federal Patrus Ananias (PT-MG), que ajudou a implantar a iniciativa na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, qualifica a criação do recurso como positiva. Ele critica, porém, que isso aconteça enquanto a gestão Bolsonaro “desmonta” outras políticas que ajudariam a tirar as famílias da pobreza.

“O governo dá com uma mão e tira direitos com outra. Eles removeram do programa um grande número de famílias, sem nenhum critério. Também não deram o reajuste previsto. Sem outras políticas públicas, o Bolsa Família não cumpre seu objetivo.”

O deputado federal Ivan Valente (PSOL-SP) também avalia que a medida é boa, mas insuficiente para se contrapor a outras iniciativas capitaneadas pela administração de Bolsonaro. “Resta saber qual a intenção do governo ao criar esse tipo de proposta e fazer, concomitantemente, uma reforma da Previdência que acaba com o BPC [Benefício de Prestação Continuada] e eleva para 70 anos o pagamento do salário mínimo.”

O deputado federal Elmar Nascimento, líder do DEM na Câmara, diz que a medida cumpre uma promessa de campanha para atender a população mais carente e diz que as críticas da oposição são por “dor de cotovelo”. “Eles nunca tiveram coragem de fazer uma medida como essa. Tiveram o tempo todo para fazer, mas não fizeram”, afirma.

Fora do espectro político, Marcelo Neri, diretor do FGV Social, afirmou que qualquer gasto com o Bolsa Família tem impacto econômico e social positivo. “Tem um efeito multiplicador que não pode ser desprezado”, diz.

A única ressalva que faz é sobre o pagamento no formato de 13º salário. O ex-presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) afirmou que dar a flexibilidade de a família escolher quando quer receber o recurso seria mais interessante do que concentrar no último mês do ano.

 
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