Após ensaiar guinada conservadora, CNBB elege presidente moderado

Cargo ficará com dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo de BH; posto mais importante, o de secretário-geral, não foi definido

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São Paulo

Principal entidade da Igreja Católica no país, a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) elegeu nesta segunda-feira (6) como presidente dom Walmor Oliveira de Azevedo, arcebispo de Belo Horizonte. A escolha aponta para uma continuidade na organização, em meio à expectativa de uma guinada conservadora em sua cúpula, hoje nas mãos de uma ala considerada progressista. 

Tido como moderado politicamente e aberto a discussões, dom Walmor exercerá a função até 2023. Ele substitui o cardeal dom Sergio da Rocha, arcebispo de Brasília.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo, eleito presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
Dom Walmor Oliveira de Azevedo, eleito presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) - Arquivo Arquidiocese de BH

Reunidos em Aparecida (SP) desde quarta-feira (1º), os bispos que participam da votação precisam ainda definir o cargo mais importante para o dia a dia da instituição, que é o de secretário-geral. A escolha está prevista para esta terça (7).

Para o posto de vice-presidente, foi eleito nesta segunda dom Jaime Spengler, arcebispo de Porto Alegre, também visto como moderado.

Na estrutura da entidade, o presidente exerce uma função mais institucional, de representação, dando voz a posicionamentos da CNBB. O secretário é quem dita o ritmo do trabalho de comissões e gerencia a rotina em contato com líderes da igreja espalhados pelo país.

A eleição é feita secretamente, a partir de escrutínios feitos com os participantes. Neste ano, 301 bispos votaram.

Os três mais cotados para presidente, inicialmente, eram dom Walmor, dom Jaime e dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo.

Nas etapas seguintes de votação, Walmor e Odilo ganharam a dianteira nas preferências. O arcebispo de São Paulo, que há meses vinha sendo lembrado para compor a nova direção, é tido como próximo da ala conservadora.

Dom Walmor, 65, reconheceu o clima de fissuras dentro da igreja ao falar com jornalistas em Aparecida logo após o anúncio de seu nome para a presidência, no fim da tarde.

"Temos um longo caminho a percorrer de diálogos no interno da igreja e da igreja com os segmentos da sociedade", afirmou, prometendo uma gestão de "fidelidade aos valores do Evangelho".

Ele disse ainda encarar a missão "com temor", por saber da necessidade "de fazer uma grande recomposição de tecidos esgarçados nos relacionamentos e nos funcionamentos da sociedade, em razão da avalanche de mudanças e das polarizações".

Em entrevista à Folha antes de ser escolhido vice, dom Jaime demonstrou preocupação com o desemprego, a desigualdade social e a violência no Brasil. Ele disse que a igreja deve trabalhar para ajudar na solução dos problemas.

“Nós não podemos jamais nos esquecer das situações que desafiam a vida nos diversos setores da sociedade. Portanto, onde a vida é diminuída, é ameaçada, não é dignificada e promovida, a igreja deve, sim, tomar uma posição”, afirmou.

A posse da nova diretoria está marcada para sexta (10).

Desde o início do encontro, os bispos têm feito um esforço conjunto nas declarações públicas para afastar os rumores de divisão no clero e minimizar as críticas à partidarização da CNBB, chamada por detratores de esquerdista e comunista.

A atual gestão rechaça os rótulos, argumentando que apenas prega a obediência aos valores bíblicos e às orientações do papa Francisco.

Ao tomar atitudes como criticar a reforma da Previdência proposta pelo governo Jair Bolsonaro (PSL), no entanto, a entidade é logo chamada de esquerdista.

Em nota divulgada na semana passada, a organização atacou o projeto do governo e defendeu a “preservação da dignidade dos trabalhadores e de sua justa e digna aposentadoria”.

Para observadores da sucessão, a escolha de dom Walmor levará a uma troca sem sobressaltos na presidência.

Os bispos podem, no entanto, optar por um secretário mais ligado à ala conservadora, o que indicaria uma correção de rota, num movimento para satisfazer correntes mais tradicionais da igreja.

"Dom Walmor é um nome da moderação para uma época de polarizações", diz Rodrigo Coppe Caldeira, professor de ciências da religião na PUC Minas.

Para o historiador, o presidente eleito "tem visão pastoral conciliadora e competência para administrar e dialogar". Dom Walmor é grão-chanceler da PUC Minas, universidade ligada à arquidiocese de Belo Horizonte.

Na avaliação do professor Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenador no Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP, o futuro presidente é alguém “com bom trânsito em todas as frentes”.

“Ele está mais próximo a uma gestão de continuidade, inclusive pelos vínculos com outros bispos da CNBB”, afirmou.

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