Glenn Greenwald diz no Senado que Moro cria clima de ameaça à imprensa

Jornalista participa de audiência pública para explicar reportagens sobre diálogos de ex-juiz

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Brasília

O jornalista Glenn Greenwald, responsável pelo site The Intercpet Brasil, disse nesta quinta-feira (11) no Senado que o ministro Sergio Moro (Justiça) cria no país um clima de ameaça a imprensa ao não esclarecer as notícias de que ele está sendo alvo de investigação pela Polícia Federal.

O Intercept tem divulgado em seu site e em parcerias com outros veículos, inclusive a Folha, diálogos de Moro, quando juiz federal, e procuradores da Lava Jato, como Deltan Dallagnol.

"Sergio Moro foi perguntado várias vezes no Senado, na Câmara e por muitos jornais se ele está nos investigando ou tem planos de fazer algo contra nós, e ele nunca negou, do dia em que a notícia saiu até hoje, a investigação. Ele quer que pelo menos fiquemos com medo de estarmos sendo investigados", disse o jornalista em sua fala inicial na audiência pública na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça).

O jornalista Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil - Pedro Ladeira - 6.jun.2019/Folhapress

Na terça-feira (10), o procurador do Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União), Lucas Furtado, pediu ao órgão que determine a imediata suspensão de toda e qualquer investigação sobre Glenn Greenwald até que fiquem claras as motivações para que ela ocorra. Ele pede também que o TCU realize uma inspeção imediata no Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), já que o órgão, vinculado ao Ministério da Economia, não esclareceu se está fiscalizando o profissional.

Glenn disse não ter medo, que seu site continuaria publicando reportagens sobre as trocas de mensagens  e que não pretende deixar o país. Ele também afirmou que ele e seu marido, o deputado federal David Miranda (PSOL-RJ), têm recebido ameaças.

"O clima que o ministro da Justiça está tentando criar, acho que isso é uma ameaça a uma imprensa livre. Está tentando fazer isso de propósito para assustar a gente. Não vai funcionar, mas é uma ameaça muito grave", disse o jornalista.

Moro também estaria no Senado nesta manhã, em uma audiência pública da Comissão de Relações Exteriores sobre violência que acomete as mulheres nas regiões fronteiriças. Seu nome constava na lista de participantes até a noite de quarta-feira (10).

A assessoria de imprensa do ministro havia informado que Moro não participaria da reunião. A agenda oficial do Ministério da Justiça informa que Moro tinha quatro compromissos nesta manhã, todos na sede da pasta.

Na audiência no Senado, Glenn Greenwald disse que, em 2014, quando divulgou o vazamento dos documentos do ex-agente da Agência Nacional de Segurança Edward Snowden, não foi acusado de nada nem foi alvo de investigação pelo governo dos Estados Unidos.

Ele e sua equipe conquistaram à época prêmio Pulitzer, na categoria serviço público. As reportagens foram publicadas nos jornais The Guardian e The Washington Post. 

Glenn Greenwald reclamou que nenhum senador do PSL, partido do governo, estava presente no início da sessão para discutir com ele. O líder do partido, Major Olímpio (SP), e o senador Flávio Bolsonaro (RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (PSL), são suplentes na CCJ.

Ele negou ter financiamento de qualquer partido."Não estamos defendendo um político. Nossa causa não é 'Lula livre', nossa causa não é destruir o governo Bolsonaro, não é defender um partido e prejudicar outro. Nosso jornalismo é sobre defender princípios que não têm nada a ver com ideologia nenhuma", afirmou o jornalista.

"Estamos defendendo os princípios fundamentais para a democracia, [que são] a imprensa livre, o fato de que pessoas com poder político precisam [ter] transparência, e não podemos ter um processo legal sem um juiz imparcial. Esses princípios são os princípios que estão governando o jornalismo que estamos fazendo e que vamos continuar a fazer", afirmou.

O único alinhado ao governo a fazer perguntas foi o senador Marcos do Val (Cidadania-ES), que questionou os motivos do jornalista para não submeter o material que recebeu a perícia.

O senador sugeriu que o material fosse entregue à CIA ou ao FBI para que atestem a veracidade do material.

"Jornalistas, na democracia, não entregam material jornalístico para a polícia, para o governo, para a Justiça para ter autorização para publicar. Tenho uma reputação mundial como jornalista. Obviamente não publicaria um material que não fosse autêntico", afirmou.

"Não entregamos e nem nunca vamos entregar nosso material jornalístico para a polícia ou para os tribunais porque isso é algo que acontece em países autoritários, tiranias, e não democracias."

Glenn disse que Moro e os integrantes da Lava Jato nunca negaram nenhum ponto específico do que foi divulgado até agora e considerou grave o fato de o ministro não ter mais as mensagens, afirmando que isso representaria destruição de "evidências relevantes para seu trabalho público".

Além disso, ironizou as declarações do ex-juiz de que não tem como se lembrar das conversas.

"Sergio Moro está fingindo que tem quase amnésia ou memória tão incapacitada que não pode lembrar nada. Isso não tem credibilidade nenhuma", afirmou.

Folha já publicou três reportagens de uma série que o jornal planeja produzir com base nas mensagens trocadas pelos procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato nos últimos anos e obtidas pelo site The Intercept Brasil.

O site permitiu que a Folha tivesse acesso ao acervo, que diz ter recebido de uma fonte anônima há semanas. A Polícia Federal abriu inquéritos para investigar suspeitas de ataques de hackers a telefones de procuradores e do ministro Sergio Moro (Justiça).

Nos últimos dias, repórteres do jornal e do site trabalharam lado a lado, pesquisando as mensagens e analisando seu conteúdo.

Como o material é muito vasto, os jornalistas têm dedicado bastante tempo para analisar os diálogos, examinar o contexto das discussões nos vários grupos de mensagens e checar as informações encontradas para verificar a consistência do material obtido pelo Intercept. 

O pacote reúne mensagens privadas trocadas pelos procuradores em vários grupos no aplicativo Telegram desde 2014, incluindo diálogos com Moro, que foi o juiz responsável pelos processos da Lava Jato em Curitiba até 2018.

Além das mensagens, o acervo inclui áudios, vídeos, fotos e documentos compartilhados no aplicativo.
Ao examinar o material, a reportagem da Folha não detectou nenhum indício de que ele possa ter sido adulterado.

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