Lula ataca a Lava Jato e diz não ser pombo-correio para usar tornozeleira eletrônica

Em discurso no Recife, o petista voltou a atacar Sergio Moro, Deltan Dallagnol e Jair Bolsonaro

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Recife

Em discurso diante de milhares de pessoas no início da noite deste domingo (17) no Recife, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disse que jamais aceitaria usar tornozeleira eletrônica para progredir do regime fechado para o semiaberto, o que foi sugerido pelo Ministério Público Federal.

"Primeiro eu disse para eles que a minha casa não é uma prisão. A minha casa é meu lugar de liberdade. Segundo que a minha canela não é canela de pombo e eu não sou pombo-correio para colocar tornozeleira", disse o petista.

Lula segura o microfone e sorri.Ele veste um blazer preto e uma camisa cinza. Atrás, o telão mostra a plateia, majoritariamente vestida de vermelho
Lula discursa durante o Festival Lula Livre, em Recife - Leo Caldas/Folhapress

Em setembro, a Procuradoria em Curitiba havia solicitado à Justiça que o ex-presidente passasse a cumprir o restante da pena no semiaberto, uma vez que ele atendia aos requisitos necessários para isso (ter cumprido 1/6 da pena e ter bom comportamento).

Em outros casos da Lava Jato, ao progredir de regime, os presos passaram a cumprir pena em casa e a usar tornozeleira eletrônica, o que o ex-presidente rejeitou. À época, Lula afirmou que não ia barganhar sua liberdade e pediu à Justiça o direito de recusar a progressão. Sua soltura, contudo, veio antes de uma decisão final do Judiciário sobre a questão.

"Não aceito negociação. Eu quero a minha inocência, eu não quero privilégio. Eu quero que julguem o meu processo arrumem prova para dizer quem é quadrilha nesse país", disse o ex-presidente neste domingo, em uma referência à possível suspeição do ex-juiz Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, que pode analisada neste ano pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Se o Supremo votar pela suspeição de Moro, a condenação do ex-presidente no caso do tríplex de Guarujá (SP), que o levou à cadeia, pode ser anulada.

"Agora a campanha Lula Livre tem que se transformar em uma coisa muito maior, porque o que nós queremos é a anulação da safadeza dos processos contra nós. Apresentem provas contra mim e me condenem, e eu não virei mais fazer discurso para vocês", disse. “Quero a anulação da safadeza e dos processos contra nós. Apresentem as provas. Adoraria estar com Moro e Dallagnol para discutir quem é safado nesse país.”

Após 580 dias preso na Polícia Federal em Curitiba, Lula foi solto no início de novembro, beneficiado por um novo entendimento do STF segundo o qual a prisão de condenados somente deve ocorrer após o fim de todos os recursos.

 

O petista, porém, segue enquadrado na Lei da Ficha Limpa, impedido de disputar eleições, justamente pela condenação no caso tríplex.

No Recife, seu primeiro ato de rua no Nordeste desde sua soltura, Lula voltou a atacar Moro, o procurador Deltan Dallagnol e o presidente Jair Bolsonaro. O petista declarou que vai dedicar cada minuto de sua liberdade para libertar o Brasil “dessa quadrilha de miliciano que toma conta desse país”.

 "Eles estão destruindo o país em nome do quê?", afirmou. "Eles estão fomentando a milícia em nome do que neste país?"

Ao apresentar a namorada, Rosângela Silva, a multidão começou a gritar “beija, beija”. Ele disse que tinha vergonha, mas beijou a socióloga.

“A conheci em um jogo em que eu e Chico Buarque jogamos do mesmo lado. Nada é capaz de derrotar o amor. Pretendo casar e viver com ela.”

Lula voltou a dizer que é uma ideia, metáfora que usou em discurso no sindicato dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo (SP) no dia em que se entregou à Polícia, em abril do ano passado.

“A luta não acabou. Não há como acabar uma luta porque queremos mais. Quando resolvi me entregar, falei que eu não sou o Lula, eu sou um ideia assumida pelo povo. Na democracia, o show não para.”

O evento teve início às 12h. Mais de 50 artistas se apresentaram no palco montado na praça Nossa Senhora do Carmo, no centro do Recife, local histórico de encontros da esquerda recifense.

Entre um show e outro, os apoiadores do ex-presidente entoavam em coro músicas que embalaram campanhas eleitorais do petista. Gritos contra o presidente Bolsonaro se repetiam nos intervalos.

A Polícia Militar não informou a estimativa oficial de público. No microfone, o apresentador do evento falava em 200 mil pessoas. 

“Cheguei às 11h para pegar o melhor lugar. Não me importo com o sol. Esperei Lula sair da prisão como se espera um filho”, disse a agricultora Luisa Santos Bonifácio, 55.

Quando o locutor anunciou que o ex-presidente já havia chegado, a multidão deu um “boa noite, Lula” —esse era um hábito dos apoiadores que se reuniam em vigília na porta da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, onde ele ficou preso.

Antes de seguir para o centro da cidade, Lula se encontrou em um hotel com o prefeito Geraldo Julio (PSB), o deputado federal João Campos (PSB) e Renata Campos (PSB), filho e viúva do ex-governador Eduardo Campos. 

Os três apoiaram Aécio Neves nas eleições de 2014 e o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Nas eleições de 2018, apoiaram o candidato Fernando Haddad (PT).

Após o discurso, Lula segue para um jantar na casa da deputada federal Marília Arraes (PT), que teve a candidatura ao governo de Pernambuco retirada nas eleições passadas após o petista conseguir neutralidade do PSB no primeiro turno da disputa presidencial.

 

Lula permaneceu preso de 7 abril de 2018 a 08 de novembro de 2019 em uma cela especial da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. O local tinha 15 metros quadrados, com banheiro, e ficava isolado no último andar do prédio. Ele não teve contato com outros presos, que ficavam na carceragem, no primeiro andar.

Lula foi condenado em primeira, segunda e terceira instâncias sob a acusação de aceitar reformas e a propriedade de um tríplex, em Guarujá, como propina paga pela empreiteira OAS em troca de contrato com a Petrobras, o que ele sempre negou. 

A pena do ex-presidente foi definida pelo Superior Tribunal de Justiça em 8 anos, 10 meses e 20 dias, mas o caso ainda tem recursos pendentes no tribunal e, depois, pode ser remetido para o STF. 

Lula já havia atingido em setembro a marca de um sexto de cumprimento da pena imposta pelo STJ. Por isso, mesmo antes da recente decisão do Supremo, ele já reunia condições para deixar o regime fechado de prisão.

Nas próxima semanas, porém, o Supremo pode anular todo esse processo do tríplex, sob o argumento de que o juiz responsável pela condenação, o hoje ministro Sergio Moro, não tinha a imparcialidade necessária para julgar o petista. Não há data marcada para que esse pedido da defesa do ex-presidente seja analisado.

Além do caso tríplex, Lula foi condenado em primeira instância a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem no caso do sítio de Atibaia (SP). O ex-presidente ainda é réu em outros processos na Justiça Federal em São Paulo, Curitiba e Brasília. Com exceção de um dos casos, relativo à Odebrecht no Paraná, as demais ações não têm perspectiva de serem sentenciadas em breve.

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