Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Sem apontar evidências, Bolsonaro diz que Witzel manipulou apuração de Marielle

Presidente diz que governador do Rio de Janeiro tinha intenção de prejudicá-lo

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) acusou o governador fluminense, Wilson Witzel (PSC), de ter manipulado o processo que apura o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) para incriminá-lo. A declaração foi feita neste sábado (2), na saída de uma concessionária em Brasília, onde comprou uma moto.

Apesar de ter dito ter "convicções" de que o governador interferiu nas investigações, Bolsonaro não forneceu evidências de que isso tenha ocorrido.

O presidente Jair Bolsonaro busca moto comprada em concessionária de Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

"Quem está por trás disso? Eu não tenho dúvida: governador Witzel, que só se elegeu graças ao meu filho, Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que colou nele o tempo todo. Chegando, um mês depois virou nosso inimigo. Começou a usar a máquina do estado para perseguir o Flávio, o Carlos [vereador e filho do presidente] agora também, o Hélio Negão [deputado federal], tudo quanto é amigo meu tão sendo investigados agora lá no Rio de Janeiro", disse.

Ele ainda insinuou que a atuação tenha se dado por meio do delegado da Polícia Civil que cuida do caso, chamado pelo presidente de "amiguinho de Witzel". 

"A minha convicção é de que ele agiu no processo para botar meu nome lá dentro. Espero agora que não queiram jogar para cima do colo do porteiro. Pode até ser que ele seja responsável, mas não podemos deixar de analisar a participação do governador. Como é que pode um delegado da Polícia Civil ter acesso às gravações da secretária eletrônica? Dado o depoimento do porteiro? Será que não teve a capacidade: ‘onde estaria o deputado numa quarta-feira?’ ", questionou.

Na quinta (31), a Polícia Civil do Rio de Janeiro divulgou nota negando que Witzel tenha interferido no caso.

O presidente falou espontaneamente sobre a reportagem do Jornal Nacional de terça-feira (29) enquanto apontava riscos que teria de enfrentar se quiser andar de moto pelas ruas de Brasília.

"Eu vim comprar isso daí [uma motocicleta], não sei se no futuro eu vou poder usar a moto fora porque o risco de ... é muito grande. Não como o de um piloto normal, mas de gente que não gosta da gente, gente que como grande parte… por exemplo, sistema Globo. Acabou a mamata", disse. 

Reportagem da TV Globo, veiculada na terça-feira (29), apontou que um porteiro (cujo nome não foi revelado) deu depoimento dizendo que, no dia do assassinato de Marielle, em 14 de março de 2018, Élcio Queiroz  —ex-policial militar suspeito no crime— afirmou na portaria do condomínio que iria à casa de Bolsonaro, na época deputado federal.

O presidente insinua ainda que o governador e o delegado tenham atuado conjuntamente para vazar as informações sigilosas para a TV Globo.

"Qual era a ideia? Botar no processo, divulgar com exclusividade da Globo de sempre, essa Globo de sempre que tem acesso a qualquer processo ai com segredo de justiça para exatamente tentar moer reputações. Se deram mal." 

Pelo depoimento do porteiro apresentado pela emissora, ao interfonar para a casa de Bolsonaro, um homem com a mesma voz do presidente teria atendido e autorizado a entrada. O suspeito, no entanto, teria ido a outra casa dentro do condomínio.

Na quarta, a promotora Simone Sibilio afirmou que a investigação teve acesso à planilha da portaria do condomínio e às gravações do interfone e que ficou comprovado que a informação dada pelo porteiro não procede.

No dia seguinte à reportagem da TV Globo, um dos filhos do presidente, o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), divulgou um vídeo em suas redes sociais para mostrar que havia acessado os áudios do condomínio para provar que a portaria havia interfonado para a casa de outro suspeito, e não para a do presidente. As gravações também haviam sido obtidas pelo Ministério Público do Rio.

"Nós pegamos antes que fosse adulterado, pegamos lá toda a memória da secretária eletrônica, que é guardada há mais de anos, a voz não é minha. Não é o seu Jair. Agora, que eu desconfio, que o porteiro leu sem assinar [sic] ou induziram ele a assinar aquilo? Induziram entre aspas, né? Induziram a assinar aquilo", disse Jair Bolsonaro neste sábado.

O áudio mencionado pelo presidente foi acessado na manhã de quarta-feira (30) por Carlos Bolsonaro, na administração do condomínio na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. O vereador mora em outro imóvel no condomínio. 

Neste sábado, Carlos escreveu em rede social que, se não tivesse acessado as gravações, "certamente já estariam discutindo" o impeachment do presidente.

Após as declarações de Bolsonaro, o PSOL disse que apresentará notícia-crime contra ele no Supremo Tribunal Federal alegando prevaricação e obstrução de Justiça.

Para Ivan Valente (PSOL-SP), líder do partido na Câmara, elas indicam que Bolsonaro acessou o material, podendo ter feito adulterações.

Em entrevista ao site O Antagonista, Bolsonaro disse que é “forçação de barra” a interpretação.

“Não fizemos cópia de nada, não levamos a secretária eletrônica a lugar nenhum. Meu filho foi lá, botaram na tela 14 de março do ano passado [data do crime contra Marielle] e onde tinha ligação para as duas casas, para a minha e a dele, ele clicou em cima e gravou o áudio. Nada mais além disso. Qualquer outra interpretação é forçação de barra”, afirmou.

Perícia

A perícia feita pelo Ministério Público do Rio nas gravações da portaria do condomínio não avaliou a possibilidade de algum arquivo ter sido apagado ou renomeado antes de ser entregue às autoridades, aponta documento apresentado à Justiça.

O sindicato dos peritos oficiais do Rio também disse que a perícia se limitou ao exame de técnicos do Ministério Público, usando um CD apresentado pelo síndico do condomínio, sem a apreensão dos equipamentos do sistema de portaria. 

Uma promotora do caso, Carmen Carvalho, que apoiou Bolsonaro na campanha eleitoral, deixou a investigação no fim da semana. O presidente não quis comentar seu afastamento. 

"Olha só, deve ter no meio de vocês gente que votou em mim, deve ter, com toda a certeza. Agora a promotora resolveu sair, tá certo? Agora, eu estava em Brasília, está comprovado. Várias passagens minhas pelo painel eletrônico da Câmara, com registro de presença, na quarta-feira geralmente parlamentar está aqui", disse para reafirmar que ele não poderia ter autorizado a entrada do ex-policial em seu condomínio.

Bolsonaro repetiu que Witzel "está com sonho e obsessão de ser presidente" e que em 9 de outubro o governador contou a ele sobre a menção de seu nome nas investigações do caso Marielle. Segundo o presidente, isso ocorreu em Brasília, durante um jantar em comemoração ao aniversário do ministro Augusto Nardes, do TCU. 

O presidente disse que, à época, não fez nenhuma denúncia contra Witzel, por ele ter tido acesso a investigações sigilosas, por não ter acreditado nas palavras do governador —que ter vazamento no caso. 

Ele acusou ainda o delegado da Polícia Civil que apura o caso de ser "amiguinho" de Witzel.

"Temos uma.. está requisitado, está tudo deferido, é a Polícia Federal com o assessoramento do MP Federal lá da seção do Rio de Janeiro. Vamos ouvir o porteiro, vamos ouvir ai o delegado também, o delegado que é muito amiguinho do governador, e logicamente que gostaria que o governador também participasse, né?", disse.

Questionado sobre o que o governador teria feito para incriminá-lo, Bolsonaro limitou-se a dizer que ele "manipula o processo". Indagado sobre como isso seria feito, disse que "o próprio processo em si, do porteiro".

O presidente negou que tenha tratado da menção de seu nome no inquérito com o procurador-geral da República, Augusto Aras, com quem se encontrou no dia 19 de outubro, na véspera de uma viagem de 11 dias pela Ásia e Oriente Médio. Ele disse que o caso foi levado ao PGR pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro. 

"Sem interrogatório aqui. Não, eu não trato isso com o Aras. Não tem cabimento, o tratamento com Aras foi via ministro da Justiça."

O presidente deixou o Palácio da Alvorada na manhã deste sábado para comprar uma motocicleta em uma concessionária a 14 quilômetros da residência oficial da Presidência.

Ele disse ter pagado o veículo com seus recursos próprios e voltou a pedir que a imprensa divulgue seus gastos com cartão corporativo. 

Bolsonaro não quis falar quanto pagou pela moto, que no site da concessionária é anunciada a um valor de R$ 33.980. O dono da loja, que abriu o estabelecimento apenas para atender o presidente, disse que houve uma negociação dura para a venda e que foi concedido um desconto de cerca de 10% ao presidente. 

"Eu estou com uma boa poupança. Eu estou com uns R$ 400 mil na poupança. Pô, eu tô rico. Eu tô rico, tá certo?", disse Bolsonaro.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.