Bolsonaro acusa eleitora de falar 'abobrinha' e pede que ela se retire do Alvorada

Assessora de vereador disse que presidente traiu população na condução da crise do coronavírus

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro pediu nesta quarta-feira (10) que uma eleitora se retirasse do Palácio do Alvorada e a acusou de falar "abobrinha".

O presidente se irritou com um comentário dela em tom crítico sobre a condução da crise do novo coronavírus, em meio a conversa que promove diariamente com um grupo de simpatizantes. Para evitar contato com a imprensa, Bolsonaro instalou um espaço para eleitores nos jardins da residência oficial, afastado da portaria principal.

"Nós temos hoje aqui 38 mil mortos por causa do Covid. E realmente, não são 38 mil estatísticas, são 38 mil famílias que estão morrendo nesse momento. O senhor, como chefe da nação, eu votei no senhor, fiz campanha para o senhor, acho até que o senhor me conhece. E eu sinto que o senhor traiu a nossa população", afirmou.

A cena foi registrada por um eleitor do presidente e publicada nas redes sociais. A eleitora é a atriz Cristiane Bernart, 33. Ela é servidora da Câmara Municipal de São Paulo, lotada no gabinete do vereador Fernando Holiday (Patriota-SP). Holiday é um dos líderes do MBL (Movimento Brasil Livre), que apoiou Bolsonaro no segundo turno de 2018 e depois rompeu com ele no início do mandato.

O presidente Jair Bolsonaro atende a apoiadores na frente do Palácio da Alvorada
O presidente Jair Bolsonaro atende a apoiadores na frente do Palácio da Alvorada - Jair Messias Bolsonaro no Facebo

Contrariado com Cristiane, Bolsonaro se afastou. Ela, no entanto, continuou a criticar o presidente, que pediu para que ela se retirasse do local e cobrasse o governador de seu estado. "Se você quiser falar, sai daqui, que você já foi ouvida. Cobre do seu governador. Sai daqui", disse o presidente.

Ela, no entanto, permaneceu no local e manteve as cobranças a Bolsonaro. Os outros eleitores presentes no cercadinho pediram que ela ficasse calada, mas ela prosseguiu os questionamentos.

"Está aí aquela figura falando abobrinha lá", disse o presidente. "Vem com essa demagogia de usar uma coisa séria, os mortos. Nós respeitamos e temos compaixão do pessoal que perdeu os familiares, não interessa em qual circunstância", acrescentou Bolsonaro.​

No final da conversa, quando a mulher já não estava mais no local, Bolsonaro disse que o bate-boca com ela "vai ser matéria na imprensa o dia todo". "Essa figura que estava aqui vai ser matéria agora da imprensa o dia todo", afirmou. "Vai ser matéria o dia todo."

Em entrevista à Folha, Cristiane disse que decidiu viajar a Brasília para cobrar o presidente. Na avaliação dela, Bolsonaro não tem demonstrado postura condizente com o cargo de presidente e precisa sofrer impeachment.

“O presidente não tem postura adequada para o cargo. Eu defendo o impeachment. O vice-presidente Hamilton Mourão é mais preparado que ele”, disse.

Apesar de ser lotada no gabinete do vereador, ela disse que tomou a decisão de se deslocar a Brasília por conta própria e que todos os gastos com a viagem foram pagos de seu próprio bolso. “O vereador não tem nada a ver com isso. Eu que quis ir. Eu vim cobrá-lo como cidadã. Eu me decepcionei com ele”, disse.

A atriz conta que fez campanha para Bolsonaro em 2018 e que acreditava que, no exercício do mandato, ele cumpriria o que prometeu. “Ele tem traído a população. Ele tem feito conchavo com os partidos do centrão e entregado cargos a eles.”

Ela relatou que decidiu deixar o Palácio da Alvorada após ter sido hostilizada por outros eleitores. “O clima estava hostil. Então eu pedi para sair de lá”, afirmou.

Após a crítica da atriz, o GSI (Gabinete de Segurança Institucional) passou a avaliar mudanças no acesso de populares ao Alvorada. O receio é o de que o episódio possa estimular outros grupos a infiltrar manifestantes no cercadinho de eleitores.

Uma das ideias em estudo é formar dois espaços. Um deles, dentro do Alvorada, de nomes já registrados no sistema da Presidência e que, portanto, já frequentaram o espaço e não fizeram cíticas ao presidente. E um outro, próximo à área dos jornalistas, do lado de fora da residência oficial, para novos simpatizantes.

Segundo assessores presidenciais, o nome e a foto da atriz já foram incluídos em uma lista da segurança presidencial de nomes proibidos de acessar o local.

Na relação, está também o haitiano Jean Makeson, que em março disse a Bolsonaro que ele não era mais o presidente do Brasil e que seu governo havia acabado, o que constrangeu o chefe do Poder Executivo.

O Brasil registrou na terça-feira (9) 719.449 casos confirmados do coronavírus e 37.840 óbitos pela doença.​ Os dados são fruto de uma colaboração inédita entre O Estado de S. Paulo, Extra, Folha, O Globo, G1 e UOL para reunir e informar números sobre o novo coronavírus.

As informações são coletadas com as Secretarias de Saúde, e o balanço é fechado às 20h de cada dia. A doença mata mais de um brasileiro por minuto e faz mais vítimas que doenças cardíacas, câncer, acidentes de trânsito e homicídios.

Diferentemente dos demais países com grande número de casos, o Brasil ainda não começou a achatar a curva de disseminação da doença.

Na entrada do Palácio da Alvorada, o presidente criticou a OMS (Organização Mundial de Saúde) e disse que ela costuma voltar atrás em anúncios.Ele se referiu a um mal-entendido sobre a declaração de uma integrante do órgão mundial sobre a transmissão do coronavírus por assintomáticos.

"Ela disse que o pessoal assintomático não transmite. Aí voltou atrás de novo. Parece que tem algo mais grave por trás disso tudo. É quebrar os países", afirmou.

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