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Grupo que inspirou #Somos70PorCento é heterogêneo, mas crítico a Bolsonaro, indica Datafolha

Desalento predominante e peso quantitativo tornam contingente objeto de cobiça para a oposição

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São Paulo

​No último final de semana uma hashtag se espalhou pelas redes sociais do país com base na mais recente pesquisa nacional do Datafolha sobre a avaliação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). O movimento #Somos70PorCento leva em conta o percentual aproximado de brasileiros que não aprova o governo em contraposição aos 33% que o consideram ótimo ou bom.

A iniciativa se diz suprapartidária e se coloca em defesa da democracia. Seu cálculo, que soma taxas de avaliação regular com as de reprovação, no entanto, merece nota técnica.

A pergunta que mede a popularidade do presidente é uma variação de escalas aplicadas internacionalmente há décadas em pesquisas de mercado e opinião para se medir satisfação quanto a um determinado tema.

O objetivo é dar conta do gradiente de sentimentos da população, com simetria entre respostas positivas e negativas, contemplando-se um ponto intermediário neutro.

Nas pesquisas de avaliação de governantes, o Datafolha historicamente utiliza uma escala de cinco pontos, dois positivos (ótimo e bom), dois negativos (ruim e péssimo) e um neutro (regular). Além disso, há o percentual residual dos que espontaneamente dizem não saber se posicionar.

Nada garante que, diante de uma pergunta dicotômica (que apresenta duas alternativas para a resposta –aprova ou desaprova, por exemplo), a maioria da população se posicionaria da forma como defende o movimento #Somos70PorCento.

De qualquer forma, ao separar apenas o grupo que avalia o governo como regular, nota-se tendência preponderante de concordância com temas negativos ao atual governante.

Feita a ressalva, para verificar se de fato há uma tendência contrária ao governo nesse contingente e revelar o perfil do conjunto que ele representa, o Datafolha elaborou um exercício de recodificação de sua última pesquisa, somando os 43% que avaliam o governo como ruim ou péssimo aos 22% que o consideram regular e aos 2% que não se posicionaram.

Reuniu o grupo sob o rótulo de “não aprovam o governo Bolsonaro”. E os resultados trazem contrastes marcantes em comparação com o estrato que apoia o governo –há realmente uma postura bastante crítica ao presidente entre os que não o consideram ótimo ou bom.

É um conjunto mais feminino do que o dos que avaliam Bolsonaro positivamente (57% são mulheres, taxa que corresponde a 46% entre os que consideram o presidente ótimo ou bom).

O grupo é mais jovem, tem menor renda e a participação de empresários no estrato é inferior em seis pontos percentuais em relação ao estrato que aprova Bolsonaro.

Nos demais aspectos, o estrato se mostra diverso e heterogêneo como a população –quanto à escolaridade, cor e ocupação, por exemplo, não há variações significativas.

Cerca de um em cada quatro integrantes desse grupo votou em Bolsonaro na última eleição, mas a maioria não (74%). Quase metade do segmento (47%) é composto por antibolsonaristas heavy (intensos), isto é, além de não terem votado no presidente, reprovam o desempenho de seu governo e nunca confiam em suas declarações.

Na escala de avaliação de Bolsonaro, 52% citam o extremo negativo –péssimo— como resposta para qualificá-lo. Para 54%, Bolsonaro nunca se comporta como um presidente da República, índice que corresponde a 37% entre os brasileiros de um modo geral e apenas a 3% entre os que o consideram ótimo ou bom.

A grande maioria do estrato afirma que Bolsonaro não tem capacidade para liderar o país e as taxas de apoio ao impeachment e à renúncia do presidente superam a média em 20 pontos percentuais.

Ao contrário dos que aprovam Bolsonaro, o grupo acredita muito mais no ex-ministro Sergio Moro do que no presidente no episódio sobre a interferência na Polícia Federal, assim como, na grande maioria dos casos, critica a presença de militares no governo e enfatiza o descumprimento de promessas da campanha na negociação de cargos e verbas com o centrão em troca de apoio político.

Sobre a epidemia do novo coronavírus, a taxa dos que reprovam Bolsonaro no combate à doença é superior em 21 pontos percentuais à verificada na média da população e chega a 71%. Por outro lado, no grupo que o considera um presidente ótimo ou bom, o resultado é o inverso –69% aprovam seu desempenho na crise sanitária.

A tendência não se repete em relação ao Ministério da Saúde (as opiniões do grupo se dividem): 38% aprovam a atuação da pasta, 35% a consideram regular e 25% ruim ou péssima. Entre os que avaliam positivamente Bolsonaro como presidente, a maioria aprova seu ministério.

O resultado muda quanto aos governadores –a maioria dos que não aprovam Bolsonaro avaliam positivamente o desempenho dos gestores estaduais enquanto as opiniões se dividem no grupo dos que classificam o presidente como ótimo ou bom.

É fácil entender o motivo dos contrastes –o conjunto dos que não aprovam o presidente se coloca muito mais favorável ao isolamento social do que seus antagonistas, mesmo enxergando (mais do que eles) reflexos nocivos à economia do país por um longo período.

E estão mais pessimistas do que os apoiadores do presidente –ao contrário desse estrato, a maioria dos que não o apoiam se diz desanimada, com medo do futuro, triste e insegura, todas as percepções em patamares próximos ou muito superiores a 70%.

Como se vê, o desalento que predomina nesse contingente, somado a seu peso quantitativo, o torna objeto de cobiça para a oposição. Sua heterogeneidade social não anula a coesão que demonstram na crítica ao governo. Agora a comunicação que os reuniu sob um mesmo rótulo terá o desafio de definir a mensagem direta que determinará ou não o engajamento almejado.​​

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