Presidente do STJ decide transferir Queiroz para prisão domiciliar

Ex-assessor de Flávio Bolsonaro investigado no caso das 'rachadinhas' teve pedido atendido por magistrado elogiado pelo presidente e cotado ao STF

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Brasília

O presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), João Otávio de Noronha, decidiu nesta quinta-feira (9) transferir o policial aposentado Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), para prisão domiciliar.

Queiroz foi preso no dia 18 em Atibaia, no interior de São Paulo, no âmbito da investigação sobre o esquema de "rachadinhas" na Assembleia Legislativa do Rio. Ele estava detido em uma cela no presídio de Bangu, no Rio.

Noronha também concedeu prisão domiciliar a Márcia Aguiar, mulher de Queiroz, que está foragida.

Na decisão, tomada a pedido da defesa, o presidente do STJ afirmou que, consideradas as condições de saúde de Queiroz, o caso se enquadra em recomendação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que sugere o não recolhimento a presídio em face da pandemia do coronavírus.

Noronha, cuja relação com Bolsonaro já foi descrita pelo presidente como "amor à primeira vista", já deu outras decisões recentes favoráveis ao chefe do Executivo e tem sido apontado como um dos candidatos a uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal).

Nesta quinta, a filha de Queiroz, Nathalia, usou seu perfil no Instagram para comemorar a saída de seu pai da prisão.

"Estou indo te buscar, meu pai! E você vai ter o abraço de todos os seus filhos que estão cheios de saudades e tanto te amam e sabe o homem incrível que você é!", escreveu, compartilhando também uma notícia sobre a decisão.

Queiroz é investigado por participação em suposto esquema de "rachadinha" na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, no gabinete do então deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro. Sua filha Nathalia também é investigada no mesmo caso.

A prática da "rachadinha" ocorre quando funcionários são coagidos a devolver parte de seus salários. O filho de Bolsonaro foi deputado estadual de fevereiro de 2003 a janeiro de 2019.

No último dia 25, a 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio aceitou pedido de habeas corpus de Flávio e concedeu a ele foro especial. Assim, o processo que investiga a "rachadinha" no gabinete saiu das mãos do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, e foi para o Orgão Especial do TJ, colegiado formado por 25 desembargadores.

Após prisão de Queiroz, Bolsonaro mudou o tom beligerante em relação aos demais Poderes e modulou o discurso bélico, em acenos interpretados por opositores como movimento para proteger os filhos e evitar que o caso das "rachadinhas" agravasse a crise política de seu governo.

O presidente chegou a chamar a prisão de Queiroz, a quem conhece desde 1984, de "espetaculosa". Queiroz foi preso em um imóvel do advogado Frederick Wassef, responsável pelas defesas de Flávio e do presidente.

O presidente do STJ estabeleceu algumas condições para a conversão da prisão em domiciliar, entre elas o monitoramento eletrônico por meio de tornozeleira eletrônica.

Segundo a decisão de Noronha, o PM aposentado deverá indicar o endereço onde será cumprida a prisão domiciliar, "franqueando acesso antecipado à autoridade policial para aferir suas condições e retirada de toda e qualquer forma de contato exterior".

Será permitido o acesso, sempre que necessário, da autoridade policial, que deverá exercer vigilância permanente do local para impedir acesso de pessoas não expressamente autorizadas.

Haverá ainda proibição de contato com terceiros, à exceção de familiares próximos, profissionais da saúde e advogados devida e previamente constituídos.

Queiroz será obrigado a desligar linhas telefônicas fixas, entregar à autoridade policial todos telefones móveis, bem como computadores, laptops e/ou tablets. Estará impedido de saída sem prévia autorização e não poderá manter contatos telefônicos.

Todas essas restrições valem também para a esposa de Queiroz, Márcia Aguiar, "por se presumir que sua presença ao lado dele seja recomendável para lhe dispensar as atenções necessárias", afirmou em sua decisão o presidente do STJ.

A decisão de domiciliar para Queiroz e esposa coube ao presidente do STJ porque o pedido chegou durante o recesso do Judiciário, e o tribunal funciona em regime de plantão.

Anteriormente, Noronha derrubou a decisão do TRF-3 (Tribunal Federal Regional da 3ª Região) que determinava que o presidente Jair Bolsonaro apresentasse os exames para detecção de Covid-19.

O caso Queiroz é de responsabilidade do ministro Felix Fischer, que já negou recursos do senador Flávio Bolsonaro para barrar as investigações do Ministério Público do Rio de Janeiro no caso conhecido como "rachadinha".

Jair Bolsonaro já disse que as conversas com Noronha ajudam a formar opinião sobre o Judiciário, o que reforça a possibilidade de indicação do atual presidente do STJ a uma vaga no STF ainda no atual governo.

Em 29 de abril, durante a cerimônia de posse de André Mendonça como ministro da Justiça e de José Levi como advogado-geral da União, o presidente da República falou em "amor à primeira vista" na sua relação com Noronha.

"Prezado Noronha, permita-me fazer assim, presidente do STJ. Eu confesso que a primeira vez que o vi foi um amor à primeira vista. Me simpatizei com Vossa Excelência. Temos conversado com não muita persistência, mas as poucas conversas que temos o senhor ajuda a me moldar um pouco mais para as questões do Judiciário. Muito obrigado a Vossa Excelência", disse Bolsonaro.

Os ministros do STF Celso de Mello e Marco Aurélio terão aposentadoria compulsória na corte no atual mandato de Bolsonaro (2019-2022) e devem ser substituídos por nomes indicados pelo atual presidente —em novembro deste ano e em 2021, respectivamente.

A apuração sobre "rachadinha" relacionada ao hoje senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente, começou após relatório do antigo Coaf (órgão federal) indicar movimentação financeira atípica de Queiroz.

Além do volume movimentado, de R$ 1,2 milhão em um ano, chamou a atenção a forma com que as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de servidores da Assembleia.

Queiroz afirmou que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem conhecimento do então deputado estadual. A sua defesa, contudo, nunca apontou os beneficiários finais dos valores.

Bolsonaro não comentou a decisão em sua live semanal.

Colaborou UOL

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