Descrição de chapéu
Governo Bolsonaro

Fim do auxílio e caos na saúde rompem inércia da opinião pública com Bolsonaro, diz Datafolha

Antes, tensão entre a injeção de recursos na economia e curva da Covid-19 se anulava em espécie de cabo de guerra

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Alessandro Janoni

Diretor de Pesquisas do Datafolha

O fim do auxílio emergencial pago pelo governo ao longo de 2020, combinado ao descontrole da pandemia do novo coronavírus no início deste ano, despertou a opinião pública brasileira do estado de inércia em que se apresentava até o último dezembro.

Há pouco mais de um mês, a estabilidade nas taxas de aprovação do governo Jair Bolsonaro em suas melhores marcas era provocada pela tensão entre duas forças que se anulavam —uma espécie de cabo de guerra entre a injeção de recursos na economia, especialmente pelo pagamento do benefício federal, e a curva de contaminação e mortes da Covid-19, que na ocasião já indicava tendência crescente.

Agora, com a interrupção do benefício e o recrudescimento da pandemia, a reprovação ao presidente aumenta oito pontos percentuais, enquanto a avaliação positiva cai seis. Dos presidentes eleitos pelo voto direto e em primeiro mandato, Bolsonaro continua com desempenho superior apenas ao de Fernando Collor, meses antes de seu impeachment.

O peso da variável econômica na piora da popularidade presidencial fica evidente quando se observa o cruzamento dos dados. Em pouco mais de 40 dias, com o fim do auxílio, a reprovação a Bolsonaro cresceu 10 pontos percentuais entre os que recebiam o benefício.

No grupo dos que não solicitaram o dinheiro, também houve piora nos índices de avaliação do governo, mas em menor proporção. A diferença entre os dois estratos na avaliação negativa de Bolsonaro cai pela metade e praticamente deixa de existir na aprovação.

O fenômeno fica ainda mais claro ao se verificar resultados por renda e sexo. Entre os que recebem até dois salários mínimos, a popularidade de Bolsonaro, que chegou a ascender 15 pontos percentuais durante o pagamento do auxílio, cai agora oito pontos em pouco mais de um mês.

A reprovação ao presidente, que nesse estrato chegou a cair 17 pontos percentuais no segundo semestre de 2020, subiu agora 13 pontos.

Entre as mulheres, segmento que mais pediu e recebeu o benefício, Bolsonaro tinha conseguido diminuir sua histórica rejeição em 12 pontos percentuais de junho a dezembro. Agora, ela volta a crescer 10 pontos.

Combinando-se as duas variáveis, o estrato feminino de menor renda é onde se nota a maior queda de popularidade do presidente no último mês.

O segmento masculino volta a ser, com larga vantagem, o fiador majoritário do governo. Entre os que consideram Bolsonaro ótimo ou bom, 57% são homens. Entre os que o classificam como ruim ou péssimo, a proporção se inverte —59% são do sexo feminino.

A mesma tendência se verifica no Nordeste, região onde o auxílio fez a reprovação a Bolsonaro cair de 52% para 34% no segundo semestre do ano passado. Agora, ela volta a subir para 43%.

Com recursos reduzidos na economia, a força da segunda onda da pandemia não encontra resistência na outra ponta da corda desse cabo de guerra. Apesar de a maior parte dos brasileiros não considerar o presidente como principal responsável pelas mortes provocadas pela doença, há também alta correlação da crescente impopularidade do seu governo com o combate à Covid-19.

Nesse quesito, seu desempenho piorou para patamares próximos aos de momentos críticos da pandemia entre junho e agosto do ano passado, quando o número de mortes diárias batia recordes.

A repercussão do colapso do sistema de saúde em Manaus se reflete no aumento das taxas de ruim ou péssimo que Bolsonaro apresenta na gestão da crise entre os que vivem nas regiões Norte e Centro-Oeste.

Quanto à atuação do Ministério da Saúde, esse crescimento também é significativo na população local, diferente da estabilidade verificada no total da amostra.

A percepção de descontrole junto à população, reforçada pelo imbróglio na aquisição de vacinas, deixou o presidente isolado, em posição delicada frente ao governador de São Paulo, João Doria (PSDB), que soube capitalizar politicamente o episódio.

Mas, com tantos resultados negativos, o apoio ao impeachment ou renúncia de Bolsonaro só não alcança a maioria por conta dos que o julgam um presidente regular.

Forçados a tomar partido em escalas dicotômicas (a favor ou contra), a maior parte do estrato se posiciona contrária ao impedimento ou renúncia. É um segmento com perfil sociodemográfico próximo à média da população, não tão fiel ao presidente, mas onde metade ainda acredita em sua capacidade de governar o país.

O sucesso ou fracasso da campanha de imunização pode ser determinante tanto para reforçar essa tendência como para invertê-la —esse estrato, mais do que os polarizados, apostam na vacina como vetor para a retomada econômica, estratégia que o governo minou ao promover o cabo de guerra entre as duas esferas.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.