Conselho de Ética vota censura a deputado que quebrou peça sobre consciência negra

Charge trazia PM armado se afastando após atirar em jovem algemado; Coronel Tadeu diz que peça era ofensiva à categoria

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Brasília

O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados vota nesta terça-feira (22) o parecer que pune com censura verbal o deputado Coronel Tadeu (PSL-SP), responsável, em 2019, por quebrar placa com charge criticada por policiais durante exposição em homenagem ao Dia da Consciência Negra.

A charge, do cartunista Latuff, trazia um policial com uma arma se afastando depois de atirar em um jovem algemado.

A peça tinha os dizeres “o genocídio da população negra” e uma explicação com dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) sobre mortes de jovens negros. "Por sua vez, os negros são as principais vítimas da ação letal das polícias e o perfil predominante da população prisional do Brasil", dizia a placa.

Placa quebrada pelo deputado Coronel Tadeu (PSL-SP), com charge que compunha exposição sobre Dia da Consciência Negra na Câmara
Placa quebrada pelo deputado Coronel Tadeu (PSL-SP), com charge que compunha exposição sobre Dia da Consciência Negra na Câmara, em 2019 - Pedro Ladeira - 19.nov.2019/Folhapress

Na ocasião, Coronel Tadeu defendeu o ato. "Eles fizeram o protesto deles, eu fiz o meu. O cartaz era nitidamente ofensivo aos policiais do país", disse à Folha. Segundo ele, a placa "direcionava o entendimento de que policiais só matam negros".

Segundo o Atlas da Violência 2020, a taxa de homicídios de negros no país cresceu 11,5% de 2008 a 2018 (de 34 para 37,8 por 100 mil habitantes), enquanto a morte de não negros caiu 12,9% no mesmo período (de 15,9 para 13,9 por 100 mil).

O estudo foi elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo Ipea com dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade, do Ministério da Saúde.

Por causa da quebra da placa, o PT entrou com representação contra o deputado no Conselho de Ética por quebra de decoro parlamentar e por praticar ato de racismo.

Em seu parecer, lido na última terça-feira (15), o relator, João Marcelo Souza (MDB-MA), afirmou não haver nos autos “quaisquer elementos de prova aptos a comprovar tal alegação".

“Apesar de ter danificado parte de uma exposição que celebrava o Dia Nacional da Consciência Negra, não restou demonstrado que o representado pretendeu, com sua conduta, menosprezar ou discriminar a população negra como um todo”, diz o relatório.

Apesar disso, continuou o relator, “a ausência de provas que sustentem a imputação do crime de racismo não afasta a reprovabilidade da conduta do representado".

Imagem sobre violência policial contra população negra rasgada pelo deputado Coronel Tadeu
Charge do cartunista Latuff que estava em placa quebrada pelo deputado Coronel Tadeu (PSL-SP) em 2019 em exposição na Câmara - Latuff
Título da charge: A morte e a morte da liberdade de expressão. Abaixo, está a charge de Latuff, feita em 2019, no chão, quebrada ao meio. Na ocasião, ela foi quebrada pelo deputado Coronel Tadeu. Duas pessoas olham o trabalho destruído no chão e falam "ué? quebraram a charge de novo? Foi o Coronel Tadeu?". E o outro responde "dessa vez foi o Conselho de Ética"
Em nova charge, Latuff aborda o julgamento do deputado Coronel Tadeu no Conselho de Ética da Câmara; relator defende censura verbal ao parlamentar - Latuff

Souza defendeu que a imunidade material não autoriza o congressista a “proferir palavras a respeito de qualquer coisa e de qualquer um” ou a “praticar atos em dissonância com a dignidade deste Parlamento".

“Não é permitido ao parlamentar invocar a imunidade material para se portar como bem entender, em desrespeito às normas básicas de conduta social”, criticou Souza. O relator afirmou que as prerrogativas concedidas pela Constituição não podem ser usadas “em benefício próprio, tampouco para beneficiar ou causar dano a outrem, mas, sim, em proveito da população".

“Posto isso, não merece acolhida a alegação de imunidade material parlamentar aventada em sede de defesa escrita pelo deputado Coronel Tadeu", argumentou o relator.

“A conduta do representado de danificar parte de uma exposição aprovada pela Mesa Diretora e realizada nas instalações da Câmara dos Deputados, simplesmente por não concordar com o teor de uma das peças exibidas, é uma atitude que deve ser repreendida”, afirmou Souza em seu parecer.

O deputado decidiu que a sanção de censura verbal era “justa, adequada, proporcional e suficiente".

A censura verbal é aplicada ao deputado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em sessão, ou pelo presidente da comissão, durante suas reuniões. Caso seja confirmada a penalidade, Coronel Tadeu poderá recorrer contra a decisão em plenário em até dois dias úteis.

Para a deputada Perpétua Almeida (PC do B-AC), a sanção aplicada a Coronel Tadeu é insuficiente.

“É um desrespeito à vida de milhares de jovens negros, denunciada pela frente parlamentar de combate ao racismo. Tem uma punição que se pode dizer: faz que pune, mas não pune. A ‘pena’ leva a impunidade e incentiva outros a fazerem o mesmo”, afirmou ela.

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