Em cerimônia no Planalto do Dia Internacional de Combate à Corrupção, o presidente Jair Bolsonaro (PL) apresentou um minipacote de medidas para transparência e criticou o ex-juiz da Lava Jato e adversário na disputa de 2022, Sergio Moro.
"Mesmo com toda a liberdade, nunca mostrou serviço [à frente do Ministério da Justiça] a não ser desde o começo do mandato fazer intrigas", disse o chefe do Executivo, sem mencioná-lo diretamente.
Nas últimas semanas, desde que Moro passou a se destacar como uma possibilidade mais viável de terceira via nas pesquisas de intenção de voto, Bolsonaro tem criticado o ex-ministro sempre que possível.
Bolsonaro voltou a criticar o ex-ministro durante transmissão nas redes sociais na noite de quinta-feira (9). "Candidato neófito, enchendo a boca, 'ele não tem responsabilidade fiscal'. Em reunião de ministros, não abria a boca para nada. Entrava mudo e saía calado", disse o presidente, sem citar o nome de Moro.
Em entrevista na noite de quarta-feira (8), afirmou que o ex-aliado não tinha coração, gratidão, "zero", "só interesse pessoal".
Bolsonaro contou ainda, para a plateia de ministros, parlamentares e aliados, que chamou o então ministro da Justiça para prestar esclarecimentos sobre inquérito da Polícia Federal (PF) contra um parlamentar, em referência a Marcelo Álvaro Antônio (PSL-MG), que era seu ministro do Turismo.
O parlamentar era pivô do caso que ficou conhecido como "laranjal do PSL", publicado pela Folha.
O mandatário contou ter questionado seu então ministro da Justiça sobre o porquê outros deputados, em situações similares, não eram também investigados.
Moro deixou o governo em abril de 2020, sob acusação de interferência na PF pelo presidente. Bolsonaro, por determinação do STF (Supremo Tribunal Federal), é investigado a respeito dessas declarações.
O evento em que o presidente disparou contra Moro foi a respeito do Dia Internacional da Corrupção, tema sobre o qual o Ministério da Justiça tem participação.
O governo também apresentou um minipacote com três medidas para combater o crime: projeto de lei para regulamentar o lobby, decreto para aumentar transparência de agenda pública; e outro para aprimorar a proteção ao servidor que denunciar irregularidades.
O projeto de lei chega ao Congresso um ano depois de o governo ter prometido enviá-lo, no final de 2020, quando apresentou também um Plano Anticorrupção.
De acordo com o Palácio do Planalto, as medidas "visam tornar mais clara a representação privada de interesses, possibilitando, com isso, maior efetividade na repressão às condutas reprováveis". O texto ainda não foi divulgado na íntegra.
Dentre as mudanças, segundo o governo, o texto que regulamenta o lobby prevê "normas sobre audiência com lobistas, citando a obrigação de haver mais de um agente público; divulgação de agenda, inclusive em reuniões na internet; a vedação de recebimento de presentes e a regulação das hipóteses, nas quais podem ser recebidos brindes pelo agente público; e hospitalidade, este último, nos casos em que agente público viaja representando o ente público em evento de particulares.".
A discussão já é antiga no Congresso. Parlamentares alegam que, ao tornar o processo mais transparente, reduz a possibilidade de corrupção.
Já o decreto sobre e-Agendas diz respeito à "divulgação da agenda de compromissos públicos e a participação de agentes públicos, no âmbito do Poder Executivo federal, em audiências e sobre a concessão de hospitalidades por agente privado".
Entretanto, este não é um hábito comum no próprio Planalto. A agenda do presidente não é divulgada na íntegra ou com detalhes, sobre, por exemplo, quem esteve presente. Muitos encontros, descobre-se que ocorreram, por publicações em redes sociais.
No segundo decreto, o governo destaca a forma de ampliar a proteção ao sigilo do denunciante e garante maior gestão da CGU (Controladoria-Geral da União) para garantir alteração do local de trabalho do denunciante, para evitar retaliações.
Neste ano, o servidor Luis Ricardo Miranda, do Ministério da Saúde, denunciou suspeitas de irregularidade e pressão para a compra e importação da vacina Covaxin.
Irmão do deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), ele levou o caso acompanhado do parlamentar ao presidente Jair Bolsonaro.
Segundo o deputado, Bolsonaro perguntou se o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), estava envolvido na compra do imunizante. O presidente teria se comprometido a pedir investigação da Polícia Federal.
Bolsonaro reconheceu o encontro, mas disse que pediu ao general Eduardo Pazuello, então ministro da Saúde, apurar as suspeitas. O militar afirma que nada de irregular foi encontrado.
O caso foi alvo de investigação pela CPI da Covid no Senado e da CGU. O servidor está hoje nos Estados Unidos.
Na abertura da apresentação do livro "Sergio Moro, Contra o Sistema da Corrupção", na noite desta quinta em um teatro no Rio de Janeiro, o ex-juiz foi irônico. Ao explicar a razão de sua saída do governo, brincou: "Hoje o presidente ajudou um pouco, porque ele fez uma síntese do motivo porque saí".
Moro afirmou ter contado com apoio de colaboradores no Ministério, mas acrescentou: "Teve muita pedrada, muita trovoada, crítica e incompreensão"
O ex-juiz afirmou que a Lava Jato tinha conseguido quebrar uma tradição de impunidade. "A gente sabia que ia haver revide. Isso infelizmente foi o que acabou acontecendo", disse. O ex-ministro disse que foi por isso que aceitou o convite para integrar o governo Bolsonaro, mas não contou com o suporte de Bolsonaro.
"Se tivesse tido o apoio do presidente, mas impossível realizar essa missão sendo sabotado pelo presidente da República", afirmou.
Ao justificar por que divulgou o teor do diálogo do ex-presidente Lula com a então presidente Dilma Rousseff, Moro voltou a falar de Bolsonaro. "Não vou ficar escondendo segredo de quem fez coisa errada, como também não fiz no governo"
Um pequeno grupo de atores esperava por Moro à porta do teatro onde o candidato realizou sua palestra. Contidos por seguranças, os atores chamaram o ex-juiz de lesa pátria. A atriz e diretora Glaucia Rodrigues disse que era um escárnio que a palestra ocorresse em um palco. "Moro participou de um governo que acabou com o teatro e odeia a cultura. Essa é a nossa indignação", afirmou.
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