Bolsonaro reciclou mentiras e distorceu fatos em fala a embaixadores; veja checagem

Confira ponto a ponto as falas deturpadas pelo presidente

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (PL) se encontrou na segunda-feira (18) com dezenas de embaixadores no Palácio da Alvorada para tentar desacreditar o sistema eleitoral brasileiro. Na ocasião, ele reciclou mentiras e teorias da conspiração, além de fazer ataques a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Logo após o evento feito por Bolsonaro, o TSE divulgou uma resposta às principais alegações mentirosas ou deturpadas do presidente. O levantamento contém links para checagens feitas ao longo dos últimos meses, já que a maioria das afirmações falsas de Bolsonaro foi repetida.

Jair Bolsonaro fala a embaixadores - Clauber Caetano-18.jul.22/PR/AFP

Veja ponto a ponto as mentiras e distorções ditas pelo presidente no encontro com os embaixadores.

Além do Brasil, apenas dois países do mundo usam sistema semelhante ao brasileiro

Apesar de o presidente Jair Bolsonaro dizer que apenas Brasil, Butão e Bangladesh utilizam urnas eletrônicas sem impressão de voto, o TSE afirma que as máquinas de votar sem registro físico não são exclusividade dos três países.

"Os equipamentos utilizados pelo eleitorado de parte da França e dos Estados Unidos para realizar a escolha de representantes também não imprimem comprovante físico da votação", diz o tribunal.

Reportagem da Folha em 2021 apontou que Brasil, Bangladesh e Butão eram os únicos países que adotavam a votação por urna eletrônica sem registro em papel em larga escala em eleições nacionais.

Hacker teve acesso a tudo dentro do TSE em 2018; poderia excluir nomes de candidatos e alterar votos

No encontro com chefes de missão diplomática, Bolsonaro afirmou que um hacker teve acesso ao código-fonte e senhas de acesso ao sistema do TSE, podendo fraudar as eleições de 2018. Disse ainda que o ataque teria possibilitado que nomes de candidatos fossem alterados e que se tirasse "voto de um [candidato] e mandar para o outro".

A declaração do presidente, no entanto, é desmentida pelo próprio delegado Victor Campos, responsável pela investigação na PF. Em depoimento, ele disse que não encontrou indícios de que a ação pudesse ter resultado em manipulação de votos, fraude ou problemas na integridade das urnas.

Além disso, o código-fonte é aberto para auditoria de vários órgãos, como a PF (Polícia Federal), MPF (Ministério Público Federal) e partidos políticos. "Portanto, dizer-se que um hacker teve acesso ao código-fonte é como arrombar uma porta aberta", disse Edson Fachin, presidente do TSE.

TSE não auxiliou PF em investigação

O presidente afirmou que, durante a investigação da PF sobre o ataque hacker de 2018, o TSE não colaborou com as investigações e demorou sete meses para afirmar aos investigadores que os logs foram apagados.

Em nota, a corte eleitoral disse que "o próprio TSE encaminhou à Polícia Federal as informações necessárias à apuração dos fatos e prestou as informações disponíveis".

"A investigação corre de forma sigilosa e nunca se comunicou ao TSE qualquer elemento indicativo de fraude", completou o tribunal.

PSDB concluiu que sistema eletrônica é inauditável

O TSE rebateu a declaração de Bolsonaro. Segundo o tribunal, o PSDB contratou uma auditoria externa para investigar supostas fraudes na eleição presidencial de 2014. O relatório dos tucanos não encontrou indícios de irregularidades, mas destacou que o sistema não permitia uma auditoria externa independente e efetiva.

PF recomendou voto impresso, mas o TSE rejeitou

A fala de Bolsonaro foi classificada pelo TSE de mentirosa. A PF realmente recomendou, em outubro de 2018, que fossem "envidados todos os esforços para que possa existir o voto impresso para fins de auditoria".

A sugestão chegou a ser aprovada em duas leis, em 2009 e 2015, mas em ambas o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou a medida inconstitucional, por "comprometer o sigilo e inviolabilidade do voto."

Observadores internacionais não conseguem conferir integridade do sistema eleitoral

Diferentemente do que Bolsonaro disse aos embaixadores, o TSE argumenta que os observadores internacionais já iniciaram uma análise técnica sobre a urna eletrônica e o sistema eleitoral brasileiro para o pleito de 2022.

"[Os organismos internacionais] contarão com peritos em informática, com acesso ao código-fonte e todos os elementos necessários para avaliarem a transparência e integridade do sistema eletrônico de votação", destacou o tribunal.

Bolsonaro foi indevidamente acusado de vazar inquérito sigiloso

O presidente é investigado pelo STF por vazar o inquérito da PF, ainda aberto, sobre o ataque hacker ao TSE.

Bolsonaro divulgou trechos da investigação em 4 de agosto de 2021, em entrevista à rádio Jovem Pan. Em janeiro, a PF concluiu que o presidente cometeu crime ao vazar dados sigilosos do inquérito, mas não o indiciou por respeitar posicionamentos recentes do Supremo que decidiram que pessoas com foro privilegiado só podem ser indiciadas mediante prévia autorização da corte.

A PGR pediu o arquivamento da investigação.

Empresa terceirizada conta os votos das urnas

Apesar de Bolsonaro ter dito aos embaixadores que uma empresa terceirizada faz a contagem dos votos das eleições brasileiras, o TSE informou que o sistema de totalização é feito na corte e é apresentado com um ano de antecedência às entidades fiscalizadoras.

Na verdade, o supercomputador utilizado pelo tribunal é fabricado pela empresa Oracle, mas a totalização é realizada pela corte eleitoral.

Fachin teria dito que auditoria não pode contestar resultado das eleições

O TSE diz que Bolsonaro tirou de contexto uma fala do ministro Edson Fachin. Na declaração, Fachin explicou como a auditoria servia para analisar procedimentos da eleição.

"Trata-se de auditar os meios, instrumentos e procedimentos, e não veículo de uma preposição aberta direcionada aprioristicamente a rejeitar o resultado das urnas que porventura retrate que a vontade do povo brasileiro é oposta aos interesses pessoais de um ou de outro candidato", disse o ministro em julho.

Reportagem da Folha mostrou que seria preciso ingressar com ação judicial para tanto. Especialistas explicam que o pedido de auditoria é administrativo e não tem como função o questionamento da eleição, tampouco tem o poder de alterar seu resultado.

Fachin foi advogado do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)

Em nota, o TSE disse que o ministro Edson Fachin jamais atuou na defesa do MST.

Na verdade, a declaração de Bolsonaro tem como base o apoio dado pelo magistrado ao movimento, em 2008, quando assinou um manifesto feito pelos trabalhadores rurais.

TSE não acolheu sugestões das Forças Armadas

O presidente Bolsonaro afirmou ainda aos embaixadores que o TSE rejeitou as sugestões das Forças Armadas apresentadas na CTE (Comissão de Transparência das Eleições). Segundo o TSE, a maioria das recomendações dos militares foi acatada. Ao todo, as Forças Armadas fizeram 15 sugestões para o aperfeiçoamento do sistema eleitoral, das quais dez foram acolhidas integralmente ou parcialmente, quatro serão analisadas para os próximos pleitos e uma foi rejeitada.

As Forças Armadas têm repetido o discurso de Bolsonaro e já fizeram ao menos uma centena de questionamentos à corte eleitoral. Em ofício recente, solicitaram ao TSE todos os arquivos das eleições de 2014 e 2018, justamente os anos que fazem parte da retórica de fraude do presidente. Além disso, insistem em alterar as regras e procedimentos envolvendo o processo eleitoral a menos de três meses das eleições.

Urna autocompleta voto

Aos embaixadores, Bolsonaro voltou a dizer que as urnas eletrônicas, em 2018, completavam automaticamente os votos. "Quando ele apertava o número 1, e depois ia apertar o número 7, aparecia o 3 e o voto ia para outro candidato", disse.

O TSE já desmentiu a informação após peritos encontrarem cortes no vídeo citado pelo presidente, que confirmam que houve montagem.

Comparação do TSE com queijo suíço

O presidente disse que a PF constatou, com base em documentos do próprio TSE, que a corte é "mais que um queijo suíço, é uma peneira", em referência a supostas falhas no trabalho do tribunal.

"A Justiça Eleitoral não tem conhecimento de tal afirmação feita pela Polícia Federal", disse o TSE.

Palestra de Barroso nos EUA

Bolsonaro afirmou que o ministro Luís Roberto Barroso teria dado uma palestra nos Estados Unidos com o tema "Como se Livrar de um Presidente". Em nota, a assessoria do ministro disse que Barroso não deu a referida palestra.

"Em evento realizado na Universidade do Texas, a palestra do ministro foi sobre 'Populismo Autoritário, Resistência Democrática e Papel das Supremas Cortes'. Tanto o vídeo da apresentação como o texto em que se baseou a palestra são públicos."

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