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Bolsonaro admite 'coisa errada' e afogamento na ditadura, mas não cita mortes

Presidente participou neste sábado (13) de uma transmissão ao vivo em canal do YouTube

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Brasília e São Paulo

O presidente Jair Bolsonaro (PL) admitiu que houve "coisa errada" na ditadura militar (1964-85), citando "cascudo, tapa ou afogamento", durante entrevista ao canal de YouTube Cara a Tapa neste sábado (13).

Apesar da fala reconhecendo práticas relacionadas à tortura, o presidente não falou sobre as pessoas que foram mortas pelo regime.

Bolsonaro com frequência enaltece a ditadura militar, que teve uma estrutura dedicada a tortura, mortes e desaparecimento.

"Teve coisa errada? Ninguém vai negar que não teve. Levou cascudo, tapa ou afogamento", disse Bolsonaro. "Ninguém vai negar que teve isso, agora ninguém pode negar que pro lado de cá, nós sofremos também."

Neste momento, Bolsonaro fez então falas referentes a Carlos Lamarca (1937-1971), guerrilheiro que liderava a luta armada contra a ditadura militar.

A Comissão Nacional da Verdade, cujos trabalhos foram concluídos em 2014 para apurar violações de direitos humanos no Brasil no período, apurou o cenário de mortes e tortura do Estado durante o período autoritário.

Em seu relatório final, a comissão apresentou detalhes sobre prisões, tortura e assassinatos. Foram identificadas 434 mortes e desaparecimentos de vítimas do regime militar.

O presidente da República Jair Bolsonaro participa de transmissão ao vivo no canal de Rica Perrone - Reprodução/Cara a Tapa no YouYube

Auditorias da Justiça Militar receberam 6.016 denúncias de tortura. Estimativas feitas depois apontam para 20 mil casos. Os relatos de pessoas que sobreviveram às torturas incluem presos que foram pendurados em paus de arara, choques elétricos, estrangulamento, afogamento, socos e pontapés.

Bolsonaro participou neste sábado de uma transmissão ao vivo no canal do YouTube comandado por Rica Perrone, que estava vestindo uma camiseta do Brasil e adotou tom simpático ao presidente.

No programa, Bolsonaro também disse que discutia com anistiados quando estava nas comissões da Câmara dos Deputados e questionou, sem qualquer evidência, que eles tenham sido torturados pelo regime. O presidente afirmou que eles tinham a pele "mais lisa que a branca de neve".

"Cheguei numa época que tinha acabado o período militar e em 91 tinha um montão de anistiado lá dentro", afirmou. "Apareceu os torturados com a pele mais lisa que a branca de neve. Uns 'ah me quebraram os ossos todos', tira raio-x do cara e vê se tem algum calo ósseo", disse Bolsonaro sem foco e sem apresentar nenhuma prova.

O presidente também questionou que esteja se movimentando para dar um golpe. "Eu sou acusado agora de programar o golpe. Alguém já viu eu se movimentando com generais por aí, conspirando?"

Bolsonaro também repetiu sua retórica de lançar dúvidas sobre a condução do processo eleitoral. "Confiar na máquina a gente confia [na urna eletrônica], mas não confia no programa, quem tá atrás da máquina", disse.

Por meio de uma profusão de mentiras, Bolsonaro vem fomentando a descrença nas urnas. No entanto, ao invés de ser barrado por aqueles ao seu redor, o mandatário tem contado com o respaldo de militares, membros do alto escalão do governo e seu partido em sua cruzada contra a Justiça Eleitoral.

Integrantes das Forças Armadas têm repetido o discurso de Bolsonaro. Em ofício, solicitaram ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) todos os arquivos das eleições de 2014 e 2018, justamente os anos que fazem parte da retórica de fraude do presidente. O TSE negou o acesso aos dados na última segunda-feira (8).

Não é de hoje que o presidente flerta com o golpismo ou faz declarações contrárias à democracia. Como governante, ele mantém este tipo de discurso.

"Alguns acham que eu posso fazer tudo. Se tudo tivesse que depender de mim, não seria este o regime que nós estaríamos vivendo. E apesar de tudo eu represento a democracia no Brasil", afirmou em uma formatura de cadetes no ano passado.

Em 2020, Bolsonaro participou de manifestações que defendiam a intervenção militar —o presidente é um entusiasta da ditadura militar e de seus torturadores.

No passado, em uma entrevista em 1999 quando ainda era deputado, Bolsonaro disse expressamente que, se fosse presidente, fecharia o Congresso.

A dois meses da eleição, o presidente está intensificando a participação em podcasts por orientação da sua campanha de reeleição. A ideia é aproximá-lo do eleitorado jovem, um dos que mais rejeita o mandatário, segundo pesquisas de intenção de voto.

Nesta semana, mais notadamente, ele teve uma conversa de 5h20 no Flow, batendo recordes de audiência. O saldo do programa foi muito comemorado pela campanha.

No programa, Bolsonaro disse não ter interesse em nenhuma forma de anistia ou imunidade após o final de seu mandato.

Ele também admitiu "imoralidade" quando era deputado federal, ao receber auxílio-moradia da Câmara apesar de ter apartamento funcional.

A avaliação de aliados é a de que o formato de podcast garante mais liberdade para o presidente falar, além de humanizar o mandatário, sem a contrapartida de perguntas jornalísticas.

Conclusões da Comissão Nacional da Verdade (CNV)

  • Foram identificadas 434 mortes e desaparecimentos de vítimas do regime militar
  • Violações de direitos humanos foram resultado de ação generalizada e sistemática do Estado brasileiro
  • Na ditadura militar, a repressão e a eliminação de opositores políticos se converteram em política de Estado
  • As decisões que resultaram em violações de direitos humanos foram emanadas da Presidência da República e dos ministérios militares
  • Participação de militares em violações dos direitos humanos
  • Utilização de instalações do Exército, da Marinha e da Aeronáutica nas práticas repressivas
  • Foram empregados recursos públicos com a finalidade de promoção de ações criminosas

Crimes apontados pela comissão

  • Detenções ilegais
  • Tortura
  • Execuções
  • Desaparecimentos
  • Ocultação de cadáver
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