Se existe quem seja mais realista que o rei, também há de haver quem seja mais bolsonarista que o próprio Bolsonaro. Nesta quinta (18), um youtuber que se apresenta aos seguidores como "adepto do militarismo" se juntou a um grupo de apoiadores do "mito" e o interpelou com críticas à aprovação do juiz de garantias (um projeto de Marcelo Freixo) e à limitação do instituto da delação premiada.
O "influenciador", visivelmente exaltado e muito preocupado com uma possível volta do PT ao poder, xinga Bolsonaro de "safado" e de "vagabundo", mas só recebe atenção mesmo quando o chama de "tchutchuca do centrão". Nem é preciso dizer que a expressão caiu nas redes sociais e virou motivo de pilhéria.
O termo "tchutchuca" já ganhou registro em dicionário: o "Aulete", em versão eletrônica, informa que significa "moça ou mulher bonita, de corpo bem-feito, meiga e carinhosa". Para abonar a definição, a obra lança mão da estrofe inicial da canção "Tchu tchuca", do grupo de funk Bonde do Tigrão ("Vem, tchutchuca linda/ Senta aqui com seu pretinho/ Vou te pegar no colo/ E fazer muito carinho").
Visto dessa maneira, o termo é quase pueril. O restante da letra, no entanto, é um pouco mais picante: "Eu quero um rala quente/ Para te satisfazer/ Escute o refrão/ É do jeitinho que eu vou fazer/ Vem, vem, tchutchuca/ Vem aqui pro seu tigrão/ Vou te jogar na cama/ E te dar muita pressão/ [...]/ Tchutchuca, com seu tigrão/ Tchutchuca, sente a pressão". Não é preciso explicar que a letra descreve o ato sexual, sendo o homem o "tigrão", e a mulher, a "tchutchuca".
"Tchutchuca", além de ser o termo carinhoso usado pelo homem, evoca um certo "barulhinho", que a letra, por si só, deixa claro qual é (o próprio dicionário sugere ter o termo origem onomatopaica, ou seja, provir da imitação de um ruído). Na relação descrita na música, o homem é um animal selvagem e forte (tigrão), e a mulher é frágil e se submete ao desejo dele.
Há três anos, esse clássico do funk brasileiro foi usado numa crítica ao ministro da Economia, Paulo Guedes, que, segundo o deputado Zeca Dirceu (PT), era "tigrão" com os aposentados, os idosos, os portadores de necessidades especiais, os agricultores e os professores, mas "tchutchuca" com os privilegiados do país. O ministro, irritado, respondeu: "Tchutchuca é a mãe, é a vó, respeita as pessoas; isso é ofensa", deixando claro que "tigrão" até que cai bem, mas "tchutchuca"... Alguns parlamentares falaram em falta de decoro, o que se explica pela alusão ao ato sexual embutida no termo.
Quanto a Bolsonaro, tudo indica que tenha a casca mais grossa mesmo, afinal vem sendo xingado de muitos nomes piores por uma população ansiosa pelo fim da sua gestão. Ele até ensaiou dizer ao youtuber que tomou as medidas em questão para evitar que se voltassem contra ele num futuro próximo, mas o rapaz estava muito exaltado.
Ao que parece, o episódio não passou de briga de caserna, mas, do ponto de vista da língua portuguesa, parece consolidar a força metafórica de uma palavra de origem popular.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.