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Eleições 2022

Caso Vera Magalhães divide direita e prenuncia acerto de contas pós-eleição

Campanha de Bolsonaro busca usar episódio para dar lustro moderado à sua imagem

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São Paulo

O longo tuíte de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) condenando a agressão sofrida pela jornalista Vera Magalhães não faz dele apenas um cara de pau nem indica que ele está prestes a se filiar ao PSOL.

Como tudo que envolve o bolsonarismo, há uma razão de fundo envolvida, e Eduardo foi astuto ao aproveitar a oportunidade que o deputado estadual Douglas Garcia (Republicanos) lhe entregou de bandeja ao interpelar de forma hostil a jornalista ao fim do debate para o Governo de São Paulo, na terça-feira (13) à noite.

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O deputado estadual Douglas Garcia, no momento em que assediava a jornalista Vera Magalhães - Ronny Santos/Folhapress

Desde o início da semana, a campanha de Jair Bolsonaro (PL) busca mostrar uma certa face moderada do presidente, por mais estranho que isso soe.

Fazem parte desse pacote o reconhecimento de alguns excessos na reação dele à pandemia, a promessa de ir para casa pacificamente se perder a eleição e a tentativa de transferir para Lula (PT) a pecha de misógino.

Faltava algum aceno à imprensa, e o custo que se apresentou era extremamente baixo: rifar Garcia, membro de um pequeno grupo conservador paulista que há muito já vivia às turras com o próprio Eduardo.

A estratégia foi coordenada em múltiplas frentes: participaram o núcleo decisório do presidente, representado pelo próprio Eduardo, a campanha de Tarcísio de Freitas, que rapidamente buscou estancar o prejuízo, e uma parte dos influenciadores bolsonaristas.

Há, no entanto, dúvidas reais sobre a eficácia da manobra. A primeira, mais óbvia, é o fator tempo. É possível modificar, ainda que parcialmente, uma imagem cristalizada como a de Jair Bolsonaro a menos de três semanas do primeiro turno?

A operação plástica de emergência na personalidade presidencial tem como alvo o eleitor antilulista que rejeita o estilo e o linguajar do capitão. É difícil não ver oportunismo descarado na estratégia, o que leva a um ceticismo óbvio sobre seu sucesso.

A segunda questão em aberto é, curiosamente, uma em que a direita bolsonarista sempre foi forte, a disciplina na transmissão das mensagens.

Nas primeiras horas após o entrevero de Garcia com Vera, o bolsonarismo entrou em pane. Enquanto Eduardo tuitava contra o parlamentar, o ministro Ciro Nogueira (Casa Civil) dizia que mil vezes mais grave havia sido o ato do jornalista Leão Serva de ter arremessado longe o celular de Garcia.

Nas redes sociais, a influençosfera conservadora rachou como há muito não se via. Nomes relevantes nesse universo, como Kim Paim e Fernando Lisboa, atenderam ao chamado do filho do presidente e entoaram críticas à falta de habilidade do deputado-agressor.

"Na ânsia de arrumar votos para si, o cara lacra requentando assunto antigo. Não era uma denúncia, não era importante, não era nada que iria ajudar. Foi tudo pelo holofote", bradou Paim, tuiteiro brasileiro baseado na Austrália, lembrando que Garcia é candidato a deputado federal.

Do outro lado, houve reação no mesmo tom de vozes que apontaram nada menos do que uma traição por parte de Tarcísio ao condenar a agressão (e curiosamente silenciaram sobre o tuíte de Bolsonaro).

Silvio Grimaldo, editor do site Brasil Sem Medo, fundado por Olavo de Carvalho, disse que "Vera não sofreu agressão alguma, ela foi questionada, da mesma forma como ela gosta de fazer, por um deputado".

Leandro Ruschel, influenciador brasileiro baseado na Flórida, afirmou que "Tarcísio acabou de destruir a sua candidatura".

Rodrigo Constantino, da Jovem Pan, afirmou que o ex-ministro da Infraestrutura é "um bom gestor, um tecnocrata competente, mas errou feio ao acender vela para a patota militante".

No curto prazo, o barata voa na direita não deve resultar em perda de votos para Tarcísio ou Bolsonaro, até porque os que resmungam não têm para onde correr na urna eletrônica. A confusão pode até dar uma força no almejado reposicionamento de imagem do presidente, por mais improvável que isso pareça.

Passado esse momento, e olhando para o horizonte pós-eleitoral, o episódio poderá ser visto como lance importante de um processo interno que será inevitável na direita, especialmente se o presidente perder a eleição.

O que está em jogo é quem assumirá as rédeas do conservadorismo no país, um movimento que despertou na década passada e não dá mostras de voltar para o ostracismo, qualquer que seja o resultado do pleito.

Serão os inflexíveis com celular na mão, à moda do deputado que abordou a jornalista em seu ambiente de trabalho? Ou os que buscam se adaptar às circunstâncias, uma parcela que nos últimos dias incluiu até a família Bolsonaro?

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