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Senado ainda mantém verba para envio de telegramas a eleitores

Oito senadores usaram em 2022 o meio de comunicação que chegou ao Brasil há mais de 170 anos

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Brasília

O Senado ainda mantém o fornecimento aos parlamentares de verba para que eles enviem aos seus eleitores telegramas, forma de comunicação criada no século 19 e que chegou ao Brasil há mais de 170 anos.

Embora a tecnologia tenha sido suplantada pela telefonia e entrado de vez em desuso com a popularização do fax, do email e, mais recentemente, das mensagens instantâneas por meio do telefone celular, em 2022 oito senadores ainda usaram a verba, sendo dois em janeiro deste ano.

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O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chega ao plenário da Casa para o início de mais uma sessão - Roque de Sá-14.fev.23/Agência Senado

"A gente disparava quase que automaticamente os telegramas para os nossos amigos. As pessoas me ligavam agradecendo, muitos colocavam em porta-retratos, em quadros. De fato, é uma coisa quase que antiga, mas que fazia a diferença, porque já não tinha mais. Por esse aspecto, foi uma coisa importante", diz Acir Gurgacz (PDT-RO).

Ele encerrou o mandato em janeiro e foi o campeão do envio de telegramas no último ano, com gasto de R$ 4,9 mil para, em geral, enviar felicitações a eleitores em datas comemorativas ou informações sobre liberação de verbas para as suas regiões.

Entre os atuais senadores, Jayme Campos (União Brasil-MT) é o que mais recorreu à verba desde janeiro de 2022, sempre em pequenos valores mensais, totalizando R$ 279 nesse período. A Folha procurou o seu gabinete, mas não obteve resposta.

Os valores pagos aos senadores para gastos com telegramas foram identificados a partir de consulta no portal de transparência do Senado.

Questionado sobre o montante total disponibilizado aos congressistas para essa despesa específica, o Senado não respondeu.

Como a Folha mostrou, Câmara e Senado mantêm a distribuição de verbas para parlamentares com justificativas que não são compatíveis com o que acontece no mundo real.

Quase todos os parlamentares ganharam neste início de ano um salário extra (R$ 39,3 mil) a título de ajuda de custo para mudança para Brasília ou para a volta aos seus estados, sendo que os reeleitos ganharam dois (R$ 78,6 mil) —um pelo início da atual legislatura, outro pelo final da última.

Ocorre que, assim como os reeleitos, praticamente nenhum parlamentar precisa de fato se mudar para a capital federal, já que eles recebem outra cota de valor mais que suficiente para voos semanais de ida e volta aos seus estados.

Embora seja em valores muito menores do que a ajuda para as mudanças fantasmas, a verba para telegrama do Senado também chama a atenção por não haver razão aparente para a sua manutenção.

O telegrama surgiu com o telégrafo, que usava a corrente elétrica para enviar mensagens codificadas de uma localidade a outra, por meio de cabos ligados a dois ou mais aparelhos.

Coube ao norte-americano Samuel Morse (1791-1872) inventar o mais famoso deles e, em maio de 1844, enviar a primeira mensagem a distância, de Washington a Baltimore (separadas por cerca de 60 km).

O telégrafo chegou ao Brasil em 1852, sendo implantado por Dom Pedro 2º.

Desde então, ele viu nascer ao seu redor tecnologias que permitiam uma comunicação cada vez mais rápida e fácil. Em primeiro lugar, a telefonia e, mais recentemente, o fax, o email e as mensagens instantâneas por meio do telefone celular.

Aparelho de telégrafo que integra o acervo do museu da estação ferroviária de Mairinque (SP), construída em 1906 - Eduardo Knapp-9.jul.20/Folhapress

Até o começo da popularização dos computadores e da internet, porém, o telegrama ainda se mantinha como um meio comum de envio de comunicações breves e urgentes, principalmente as oficiais, por ser mais rápido que as cartas.

Ele era cobrado pelo número de letras e, depois, por palavras, o que fazia os textos serem curtos e as palavras, muitas vezes abreviadas. Daí a expressão "texto telegráfico" ou "mensagem telegráfica" para descrever formas de comunicação enxutas.

O serviço de telegrama é oferecido hoje pelos Correios mediante a seguinte descrição: "Mensagem urgente e confidencial, transmitida eletronicamente [de um ponto do país a outro], impressa e autoenvelopada sem intermediação humana. Após o devido acondicionamento, o telegrama será entregue no endereço de destino".

O interessado pode procurar uma agência ou passar a mensagem por telefone ou pela internet, a partir de R$ 9,76. Na maioria dos casos, a estatal diz que o destinatário receberá o telegrama impresso em até quatro horas.

Além de verba para telegrama, cartas e propaganda impressa, Câmara e Senado destinam aos parlamentares cotas para diversos gastos que, somados aos salários, representam custo de mais de R$ 200 mil ao mês por congressista.

No final do ano passado, Câmara e Senado promoveram uma ampliação em cascata de salários e verbas dos parlamentares.

Foi aprovada a elevação escalonada do salário, de R$ 33,7 mil para R$ 39,3 mil agora, passando a R$ 41,7 mil em abril e chegando ao teto do funcionalismo (R$ 46,4 mil) em 2025. O último aumento no contracheque dos congressistas havia sido feito em 2014. Desde então, a inflação somou 59%

Além dos salários, houve reajuste em todas as outras verbas relacionadas ao mandato dos congressistas, o que elevou, por exemplo, o teto do auxílio-moradia dos deputados para R$ 8,4 mil.

Procurada, a assessoria de imprensa do Senado não se manifestou sobre a verba para envio de telegramas.

Tanto o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), como da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também não se manifestaram sobre a ajuda de custo para as mudanças fantasmas, que somam mais de R$ 40 milhões.

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