Descrição de chapéu Governo Lula

Governo Lula cede a pressão das invasões e coloca aliados do MST em postos-chave

No discurso, governo sobe tom, repudia ação dos sem-terra e pede desocupação de área da Embrapa

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Brasília

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) endureceu as declarações contra a ação do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) após um grupo de 600 famílias invadir uma área de preservação ambiental controlada pela Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) em Petrolina (PE).

Os discursos em repúdio à ação dos sem-terra marcam uma mudança na postura que o governo vinha adotando com o movimento —um dos principais entraves na relação do governo Lula com o setor do agronegócio.

Na prática, porém, cedeu à pressão.

Diante das mobilizações dos sem-terra, o governo trocou a chefia do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em sete estados nos últimos dias. Nesta terça, três chefes regionais do instituto foram substituídos em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.

Parte das trocas colocou aliados do MST nos postos-chave. Na última segunda-feira, o movimento havia cobrado o governo Lula que nomeasse "pessoas comprometidas com a reforma agrária nas superintendências regionais do Incra", substituindo pessoas que haviam ocupado os cargos de chefia no governo Jair Bolsonaro (PL).

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem sido criticado por setores do agronegócio pela postura adotada diante das invasões do MST - Pedro Ladeira/Folhapress

"Inaceitável! Sempre defendi que o trabalhador vocacionado tenha direito à terra. Mas à terra que lhe é de direito!", escreveu o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, em suas redes, na segunda-feira (17).

O ministro ainda disse que a empresa é um dos "maiores patrimônios do nosso país", e que o "agro produz com sustentabilidade" com apoio do "trabalho de desenvolvimento promovido pela Embrapa".

"Atentar contra isso está muito longe de ser ocupação, luta ou manifestação. Atentar contra a ciência, contra a produção sustentável é crime e crime próprio de negacionistas", completou.

Fávaro foi escolhido por Lula para chefiar a pasta após ele realizar um trabalho de aproximação do petista com empresários do agronegócio durante a campanha presidencial. Apesar de ser filiado ao PSD, sua nomeação foi marcada na cota pessoal do presidente.

Em sintonia com Fávaro, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou nesta terça (18) que condena atos que danifiquem processos produtivos.

"Não é a melhor forma de lutar por qualquer coisa. Eu condeno toda atitude que possa atrapalhar a produção. Temos outros instrumentos melhores e mais efetivos para as bandeiras que podem ser levantadas para a conquista desses interesses", disse.

O Ministério da Agricultura e Pecuária divulgou nota na segunda em crítica às invasões do MST. A pasta diz que as áreas ocupadas pelos sem-terra são "patrimônio do governo brasileiro, produtivas e destinadas ao uso exclusivo da Embrapa Semiárido".

Segundo o governo, a estatal usa o espaço para o desenvolvimento de pesquisas e geração de tecnologias para a melhoria da qualidade de vida de populações rurais.

"A invasão traz prejuízos consideráveis a produtores e agricultores familiares da área de abrangência da atuação da nossa instituição, bem como para toda a sociedade", completa a nota.

Padilha, porém, afirmou que as ações do MST não interferem na relação do Planalto com a bancada ruralista no Congresso Nacional —apesar das manifestações críticas da Frente Parlamentar da Agropecuária contra o governo Lula.

"Não sinto qualquer interferência disso no ambiente do Congresso Nacional. Aquilo que é prioritário para o governo —arcabouço fiscal, reforma tributária e MPs—, não temos qualquer tipo de interferência e tenho visto um ambiente muito positivo", completou.

O líder da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Pedro Lupion (PP-PR), afirmou à Folha que a mudança no discurso sobre as invasões do MST é a primeira sinalização positiva que o governo Lula faz para uma abertura na interlocução com a bancada ruralista.

"É óbvio que o posicionamento do governo, mesmo que tímido, é positivo para condenar essas barbaridades das invasões. Não só contra a Embrapa, mas todas elas. Só falta um posicionamento político mais claro do chefão, para travar os aliados e acabar com esses movimentos", disse Lupion, em referência a Lula.

Ele afirmou ainda que, com quatro meses de governo, o Planalto só apoiou "pautas negativas" ao agronegócio. "A interlocução do governo [com a frente parlamentar] é proporcional ao que o governo dá à bancada [...] É um primeiro passo, mas precisa dar mais sinais de que a postura mudará", concluiu.

O MST em Pernambuco divulgou nota nesta terça afirmando que a ação em área da Embrapa é "uma ferramenta de denúncia e pressão para a realização da reforma agrária".

Também afirmou que nada foi danificado pelas famílias e "que nenhum animal foi ameaçado".

"A ocupação é uma forma de sinalizar que a Embrapa deveria estar desenvolvendo projetos de pesquisas para a agricultura familiar e camponesa."

O MST iniciou a chamada Jornada Nacional de Luta pela Terra e pela Reforma Agrária com a invasão de ao menos nove fazendas pelo país e das sedes do Incra em ao menos sete unidades da federação.

As iniciativas ganharam corpo no sábado (15), quando foram invadidas oito fazendas no estado de Pernambuco, incluindo áreas na região metropolitana do Recife, zona da mata, agreste e sertão. Em nota, o MST afirmou que as terras são latifúndios improdutivos.

Ao todo, 2.280 famílias sem-terra invadiram áreas no estado de Pernambuco desde o início de abril. A primeira terra invadida foi a do Engenho Cumbre, em Timbaúba (102 km do Recife), há cerca de duas semanas. Segundo o MST, a área pertence ao Governo de Pernambuco.

As outras sete invasões em Pernambuco ocorreram no fim de semana, sendo a maior delas na área que pertence à Embrapa. Também foram ocupadas outras áreas em Timbaúba, Jaboatão dos Guararapes, Tacaimbó, Caruaru, Glória do Goitá e Goiana.

A maior parte das terras são de antigos canaviais e engenhos de açúcar. O MST argumenta que as terras são improdutivas, pertencem ao poder público ou são de empresas que faliram ou possuem irregularidades tributárias perante o Estado.

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