Líder do PL propõe mesa entre STF e Congresso para resolver conflito e rebeliões

Altineu Côrtes diz, no entanto, que obstrução às votações seguirá, apesar de acordo com Lira

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Brasília

Após articular um movimento para obstruir a pauta da Câmara dos Deputados em represália ao STF (Supremo Tribunal Federal), o líder do PL, deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), defende um canal de diálogo com a corte —mas, por enquanto, sem abrir mão da paralisação.

À Folha ele afirma que, atualmente, não há canal entre parlamentares e ministros do Supremo.

Ele sugere, por exemplo, a criação de um grupo para debater as decisões recentes do STF frente a temas sobre os quais o Congresso vê uma interferência indevida em suas atribuições de legislar —com mais destaque, nos temas de aborto, drogas, imposto sindical e marco temporal das terras indígenas.

"A gente precisa sentar à mesa e discutir. Não é possível a gente não ter diálogo e deixar que esses conflitos permaneçam", diz.

O deputado Altineu Côrtes (esq.) conversa com o presidente da Câmara, Arthur Lira
O deputado Altineu Côrtes (esq.) conversa com o presidente da Câmara, Arthur Lira - Pedro Ladeira - 25.abr.23/Folhapress

"[Precisamos] tirar essa discussão da discussão política, do passado de Lula e Bolsonaro", completa, referindo-se ao clima beligerante e intransigente que identifica na política nos últimos anos.

A Câmara dos Deputados passou por um esvaziamento geral nesta semana, em um movimento de pressão contra ações do STF e de Lula (PT).

Puxada pelo centrão e por parlamentares da bancada ruralista, a obstrução das atividades na Casa resultou na quarta-feira (27) na suspensão de comissões, sessões e votações —levando ao adiamento inclusive da PEC da Anistia, apesar do interesse dos próprios parlamentares na proposta de amplo perdão de punições a partidos e políticos.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que estava em viagem até a tarde de terça (26), chegou a comunicar aos líderes que a pauta estava de fato travada e convocou uma reunião na sua residência oficial para tratar do tema.

A obstrução dos trabalhos ocorreu em meio à revolta da bancada ruralista, a mais poderosa do Congresso atualmente, com a decisão do STF de derrubar a tese do marco temporal nas terras indígenas.

O movimento se somou à avaliação, que começou no Senado, de que o Supremo estava tratando de temas legislativos.

A reação dos ruralistas foi amplificada pela irritação de parlamentares do centrão com a demora do governo petista em definir a entrega de alguns cargos, em especial na Caixa Econômica Federal.

Esse cenário de instabilidade na base se dá apenas três semanas após Lula ter demitido Ana Moser e deslocado outro aliado de primeira hora, Márcio França (PSB), para uma nova pasta, com vistas a nomear ao primeiro escalão dois indicados do centrão: André Fufuca (PP-MA), no Esporte, Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), em Portos e Aeroportos.

Após a reunião na noite de quarta na residência de Lira, aliados do governo construíram um acordo para tentar derrubar a obstrução.

Em primeiro lugar, foi colocado na pauta do plenário a votação da MP (medida provisória) que valida os R$ 200 milhões em créditos para o Ministério da Agricultura.

Na prática, o tema teve o efeito de enfraquecer a resistência na Casa, já que é de interesse à grande parte daqueles que travavam as sessões —apesar de protestos e tentativas de barrar a deliberação, o texto acabou aprovado.

Depois, foi marcada uma reunião entre Lira e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, na manhã desta quinta-feira (28), para alinhar projetos econômicos: marco das garantias e tributações de offshores e fundos exclusivos.

Sob reserva, parlamentares afirmam ainda que o avanço ao longo do dia em negociações para indicações de nomes indicados por Lira para a Caixa também ajudou a destravar a obstrução dos trabalhos.

Assim, Lira e governo conseguiram enfraquecer, pelo menos em tese, a resistência e esperam votar, na próxima terça-feira (3), os três temas econômicos —mas ainda sem os votos da oposição.

"O PL e as frentes parlamentares estão em obstrução na próxima semana, independentemente da pauta", reiterou Altineu Côrtes.

Na noite de quarta, o líder da bancada ruralista, Pedro Lupion (PP-PR), já havia indicado que manteria seu posicionamento de obstrução. "Nós sequer fomos consultados", reclamou, sobre o acordo com Lira.

De acordo com o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), a tendência é que, diante do acordo, parte do grupo siga tentando obstruir a pauta para pressionar o STF. Mas, segundo ele, "as coisas se reorganizaram novamente".

Sob reserva, deputados da oposição afirmam que seguirão com a paralisação, mas admitem que perderam força. O entendimento é de que o grupo, ao menos, precisa marcar posição.

Além disso, articulam possíveis PECs (propostas de emenda à Constituição) para rebater as posições do STF, inclusive a que, se aprovada, dá ao Congresso o poder de reverter decisões da corte.

O novo presidente do STF, Luís Roberto Barroso, abordou nesta sexta (29) os atritos entre Judiciário e Legislativo e afirmou que não há crise entre os Poderes.

"Não vejo crise", disse Barroso, em entrevista a jornalistas no Supremo. "O que existe, como em qualquer democracia, é a necessidade de relações institucionais."

Também tratou de algumas das pautas que têm gerado tensão com o Congresso. Sobre o projeto do marco temporal, reconheceu que ele pode vir a ser questionado no STF. "Isso é um bom motivo para eu não antecipar a minha decisão", afirmou.

Disse ainda achar que o aborto é uma questão que precisa de "um debate público relevante" para ser levado adiante.

"Interrupção da gestação é uma questão controvertida em todo o mundo", afirmou. "Em alguns países esse tema foi resolvido pelos tribunais constitucionais, em outros países foi tratado por legislação. Acho perfeitamente normal que uma questão importante e divisiva da sociedade como essa seja debatida no Congresso também."

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