Lira manda recado ao governo sobre emendas e diz que Orçamento não é só do Executivo

Presidente da Câmara participa de ato que marca a abertura do ano legislativo no Congresso

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Brasília

Presidente da Câmara dos Deputados, o deputado Arthur Lira (PP-AL) afirmou nesta segunda-feira (5) que é preciso que o governo federal cumpra com acordos firmados e disse que o Orçamento não pode ser de autoria exclusiva do Poder Executivo.

O discurso do parlamentar se deu durante a cerimônia de abertura do ano legislativo e foi repleto de recados ao governo Lula (PT). Nas últimas semanas, ele tem intensificado a fritura do ministro responsável pela articulação política, Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais).

"Seguiremos firmes na prática da boa política, pressuposto mais do que necessário para o exercício da própria democracia. E a boa política, como sabemos, apoia-se num pilar essencial: o respeito aos acordos firmados e o cumprimento à palavra empenhada", disse, sob aplausos de parlamentares presentes no plenário.

"E é por nos mantermos fiéis à boa política e ao cumprimento de todos os ajustes que firmamos, que exigimos como natural contrapartida, o respeito às decisões e o fiel cumprimento aos acordos firmados com o Parlamento", seguiu Lira.

O presidente da Câmara culpa Padilha pelo que considera descumprimento de acordos, sendo o principal deles a liberação das verbas de emendas parlamentares negociadas com os deputados.

Pacheco, Rui Costa e Lira em sessão de abertura do Ano Legislativo, no Plenário da Câmara dos Deputados
Pacheco, Rui Costa e Lira em sessão de abertura do Ano Legislativo, no Plenário da Câmara dos Deputados - Pedro Ladeira/Folhapress

As emendas, um dos principais pontos de atrito, são uma forma com que deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. Como mostrou a Folha, a prioridade do Congresso é atender seus redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.

Lira discursou em cerimônia da abertura do ano legislativo no Congresso Nacional —essa é a primeira fala pública do parlamentar no ano. Ele não participou do ato Democracia Inabalada, que marcou um ano dos ataques golpistas contra as sedes dos três Poderes no começo de janeiro, apesar de ele ter sido escalado para discursar no evento.

"O Orçamento da União pertence a todos e todas e não apenas ao Executivo, porque, se assim fosse, a Constituição não determinaria a necessária participação do Legislativo em sua confecção e final aprovação", disse Lira.

"Não é e nem pode ser de autoria exclusiva do Executivo e muito menos de uma burocracia técnica que não foi eleita para escolher as prioridades da nação e não gasta a sola de sapato percorrendo os pequenos municípios brasileiros como nós, parlamentares".

Ele disse ainda também que os parlamentares não foram eleitos para serem "carimbadores" apenas.

Um dos pontos de atrito entre o Executivo e o Legislativo nesse começo de ano é o veto de Lula de R$ 5,6 bilhões às emendas de comissão dos parlamentares. Esse veto tende a ser derrubado pelo Congresso.

Lira também teceu críticas a medidas do governo que foram rejeitadas pelo Congresso no ano passado. Ele citou a reoneração de setores da economia e o Perse (Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos).

No fim de dezembro, o governo editou uma medida provisória que reonera a folha de pagamentos de setores da economia (dias após o Congresso ter derrubado veto presidencial que tratava do tema). Isso gerou fortes queixas entre deputados e senadores, que acusaram o governo de insistir numa política que já tinha sido rejeitada em votação pelo Parlamento. A mesma medida extinguiu o Perse.

"Conquistas como a desoneração e o Perse não podem retroceder sem uma ampla discussão com esse Parlamento", disse Lira.

Em ano apertado pelas eleições municipais, quando tradicionalmente o Congresso fica mais esvaziado durante o processo eleitoral, os parlamentares deverão priorizar, novamente, pautas econômicas, a exemplo do que ocorreu em 2023.

Lira também afirmou que "errará grosseiramente" quem apostar numa inércia da Câmara em 2024, em razão das eleições municipais e das "especulações" de quem irá sucedê-lo na presidência da Câmara, "que ocorre apenas em 2025". "Errará ainda mais quem apostar na omissão desta Casa em razão de uma suposta disputa política entre a Câmara dos Deputados e o Poder Executivo", completou.

As declarações ocorrem num momento em que há uma escalada de tensões com Padilha, que, na sessão desta segunda, estava a apenas uma cadeira de Lira na mesa principal do plenário da Câmara. Os dois estavam separados apenas pelo ministro Rui Costa (Casa Civil). Lula, assim como no ano passado, não compareceu ao evento (não é obrigatória a sua presença).

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também discursou nesta segunda.

Em sua fala, Pacheco disse que o Congresso irá trabalhar para "aprimorar a maneira como atuam os Poderes (...) sempre prezando pelo diálogo e respeito mútuo" e disse que é dever do Congresso manter uma postura de "equilíbrio e imparcialidade". "Nosso compromisso transcende as fronteiras partidárias e ideológicas."

Pacheco disse também que os parlamentares estão atentos à reformulação do sistema eleitoral e que combaterão "privilégios", citando o Judiciário.

"Combateremos privilégios e discutiremos temas muito relevantes, como decisões judiciais monocráticas, mandatos de ministros do Supremo Tribunal Federal e reestruturação de carreiras jurídicas, considerando as especificidades e a dedicação exclusiva inerentes ao Poder Judiciário", afirmou.

No ano passado, Pacheco abraçou a pauta anti-STF da oposição e colocou em debate temas que incomodam a corte. Foi aprovado pelo Senado em novembro, por exemplo, uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que limita decisões individuais de ministros da corte.

Ele disse ainda que é preciso fortalecer a autonomia parlamentar e que "proteger os mandatos parlamentares é proteger as liberdades".

As declarações ocorrem num momento em que parlamentares da oposição e do centrão cobram respostas de Pacheco e Lira às operações da PF (Polícia Federal) que resultaram em buscas e apreensões em gabinetes de parlamentares. "Proteger a tão necessária liberdade de expressão, que não se confunde com liberdade de agressão", disse Pacheco.

O presidente do Senado destacou projetos que deverão ser prioritários neste ano, entre eles a regulamentação da reforma tributária e pautas relacionadas à transição energética e à segurança pública, além da regulação da inteligência artificial e das plataformas de redes digitais, que ele classificou como sendo "imperativo".

Apesar da pressão de Lira e de cúpulas da Câmara contra a permanência de Padilha na Esplanada, Lula indicou a aliados que não trocará o ministro da SRI (Secretaria de Relações Institucionais). Aliados dos dois políticos afirmam que eles deverão se encontrar com o retorno das atividades parlamentares (apesar de não haver uma data marcada).

Por outro lado, nos últimos dias Lula fez uma série de gestos a Pacheco e ao vice-presidente da Câmara, o deputado Marcos Pereira (Republicanos-SP), que é um dos nomes cotados para suceder Lira na presidência da Casa em 2025 e que busca apoio do Executivo.

O petista já sinalizou que sua intenção é apoiar a candidatura de Pacheco ao governo de Minas em 2026 e, segundo aliados do petista, ele espera contar com apoio do parlamentar para postergar até meados de março a convocação de sessão do Congresso em que deverão ser votados os vetos presidenciais ao Orçamento de 2024.

Membros da SRI e o próprio Padilha vêm destacando que, apesar das críticas de Lira, houve um aumento no empenho de emendas parlamentares no ano passado, em comparação a 2022.

Segundo cálculos da pasta, foram empenhados R$34,5 bilhões —o que representa mais que o dobro dos R$ 16,8 bilhões registrados no último ano do governo Bolsonaro.

Integrantes do governo atribuem as críticas de Lira a uma disputa maior, pelo controle do orçamento, depois de os parlamentares terem perdido as chamadas emendas de relator. No final de 2022, o STF declarou-as inconstitucionais, irritando ao Congresso, sobretudo Lira, que era um dos que controlavam essa fatia de recursos públicos.

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