Lula critica PT e diz que fundo eleitoral é cooptado por deputados com mandato

Em discurso inflamado na filiação de Marta, petista disse que partido deve ir para as periferias em vez de criticar o governo

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São Paulo

O presidente Lula (PT) aproveitou seu discurso no ato de filiação da ex-prefeita Marta Suplicy, nesta sexta-feira (2), para fazer uma série de críticas ao partido e cobrar mais empenho dos militantes.

Ele afirmou que, na eleição de 2022, houve candidatos petistas sem dinheiro até para produzir panfletos porque "o fundo eleitoral foi cooptado por deputados que têm mandato". E disse que os que ficassem com raiva da declaração poderiam procurá-lo.

Num discurso inflamado, que quebrou o clima de festa na Casa de Portugal, na região central da capital, ele cobrou reflexão sobre a queda no número de prefeituras conquistadas no estado de São Paulo e disse que não é para os petistas ficarem apenas "olhando os defeitos do governo" ou conversando entre eles mesmos.

O presidente Lula (PT) durante a filiação de Marta Suplicy ao PT, em ato com a presença de Guilherme Boulos (PSOL) e outros políticos - Bruno Santos/ Folhapress

Lula disse à plateia que militantes de esquerda "perdem muito tempo" criticando o governo e falando entre si sem "ir para as periferias desse país conversar com as pessoas que foram enganadas pelo bolsonarismo". Ele emendou ataques às fake news e à "mentira deslavada de alguns pastores".

"Precisa procurar aliança. Trazer gente que não gosta de mim, que eu não conheço, mas que eu preciso do voto das pessoas que votam naquele cara", emendou.

O puxão de orelha desta sexta se assemelha ao que Lula já havia dado em dezembro, na abertura da conferência eleitoral do PT, em Brasília, quando criticou "briguinhas internas" e pediu que os petistas buscassem os evangélicos.

No ato de filiação de Marta, ele disse que, ao contrário de outros, poderia "falar coisas" que deixariam a plateia nervosa. "Ficar nervoso comigo não tem problema, meu coração é grande demais."

"Por que um partido que teve 20% de preferência eleitoral teve 5% de voto na legenda para vereador? Alguma coisa está muito errada", afirmou ao comentar resultados eleitorais nas principais cidades do país em 2020.

O presidente defendeu a prerrogativa do partido de escolher qual candidato irá lançar e fez uma crítica indireta a filiados que se apoiam apenas em causas identitárias para forçar candidaturas, ao afirmar que não basta apenas ter características como ser negro, mulher ou indígena. "Está errado", disse.

Nos bastidores da legenda, defensores de candidaturas conectadas a pautas de grupos específicos fazem diagnóstico semelhante, alertando para o risco do que chamam de representatividade vazia.

"O partido não é massa de manobra de candidato, tem que avaliar quem tem condições de ganhar as eleições. As pessoas têm que se lançar pelas suas qualidades de serem candidatas", afirmou ele.

Lula foi incisivo ao dizer que o partido deve lançar candidaturas de "lideranças sociais de verdade, não só aquelas que querem ser candidatas".

"Quem tem voto nesse país é o PT, não é a cara pessoal de cada um de nós. Mas o cara acha que tem que colocar a cara dele na televisão dois segundos. Não dá", desabafou.

A fala de Lula foi interpretada no local como uma cobrança por visão estratégica para as eleições. Para petistas, o presidente quis passar recados para quadros do partido que têm demonstrado apetite excessivo por cargos e menosprezado o trabalho de base.

Falando sob reserva, um petista presente ao evento disse ter entendido o discurso como uma reprimenda a mandatários que têm se concentrado apenas na própria permanência no poder, sem contribuir para a renovação de quadros e o fortalecimento do partido.

Lula, que atribuiu sua trajetória vitoriosa na política a "um milagre da natureza", disse que sua prioridade agora é o PT.

"Eu tenho 78 anos, sou presidente pela terceira vez, já fiz mais do que eu imaginei do eu poderia fazer. E agora eu quero salvar esse partido, porque é a coisa mais importante que tem nesse país. Por isso a minha ideia de trazer Marta de volta."

A ex-prefeita foi convidada por Lula para ser vice de Guilherme Boulos (PSOL) na disputa pela Prefeitura de São Paulo. Em seu discurso no evento lotado de militantes, Marta evitou abordar seu rompimento com o PT em 2015 e tratou a filiação como uma espécie de volta para casa.

O presidente, no entanto, falou sobre a saída de Marta e as críticas dela ao partido na época —a ex-prefeita argumentava que a corrupção estava desvirtuando os ideais da sigla. "O PT cometeu erros. Nem todo mundo é obrigado a suportar a quantidade de erros que a gente cometeu."

Lula trouxe o nome de Dilma Rousseff (PT) ao evento, ao lembrar que Marta queria lançá-lo à Presidência em 2014, mas ele achava que a então presidente tinha o direito de concorrer à reeleição. "Depois aconteceu o que nós sabemos", disse o presidente, em referência ao impeachment, que Marta apoiou como senadora no MDB.

"Em algum momento, você [Marta] ficou zangada, você saiu. A Marta ficou puta comigo porque ela queria que eu fosse candidato em 2014", afirmou Lula.

O presidente contou ainda que, quando ele levou a ideia de refiliar Marta para ser vice de Boulos, parte dos dirigentes petistas foi contra, justamente por ela ter feito oposição ao partido. Mas ele insistiu pois teve a "intuição" de que o psolista precisaria dela para vencer.

"Não é fácil, mas é plenamente possível, a gente ganhar São Paulo", disse ele.

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